Vença quem vencer nas urnas, no Brasil o mercado sempre sai vitorioso
Olá!
Nos BRICS, o Brasil discute novas perspectivas para a ordem global, mas, dentro de casa, persistem os velhos problemas.
.E o PT, hein? É muito pouco provável que os resultados do segundo turno alterem o quadro político nacional que se estabeleceu no primeiro. Ainda que oito capitais tenham empates técnicos, em apenas duas as pesquisas registram uma virada de posições. Enquanto a direita calcula os efeitos de uma possível prisão do inelegível capitão, na esquerda, caso Guilherme Boulos não consiga superar Ricardo Nunes, está garantida a prorrogação do divã público sobre o desempenho político-eleitoral. Há alguns consensos, como a incapacidade da esquerda de prosperar ou entender o mundo digital ou a desconexão com a periferia dos grandes centros urbanos. Para os que acusam os pobres de ingratidão ou de “não saberem votar”, Orlando Calheiros, no Intercept, lembra que a promessa dos governos de esquerda de que “todos seremos classe média” implicou numa mudança de perspectiva sobre a pobreza, e agora a questão passa pela “manutenção de um certo poder de consumo” e não necessariamente por fugir do mapa do fome. Ou, como resume Valério Arcary, a nova “classe média” foi para a extrema direita. Ao mesmo tempo, passa batido qualquer questionamento ao “sonho empreendedor” e a impossibilidade real de ascensão na pirâmide social brasileira, como demonstra Rosana Pinheiro-Machado. Na prática, a crítica e autocrítica vão levando a esquerda, e em especial o PT, a um dilema entre apostar no pragmatismo e flertar com o conservadorismo - como faz o candidato petista em Cuiabá - ou retomar a disputa de ideias à esquerda e resgatar seu papel como partido de oposição ao neoliberalismo. De qualquer forma, é curioso que enquanto o PT e a esquerda mereçam uma análise pública, pouco se fala de como o tucano se tornou uma ave em extinção e porque o partido que governou o país duas vezes e dominou São Paulo por décadas simplesmente desapareceu.
.Os sem-eleição. Vença quem vencer nas urnas, no Brasil o mercado sempre sai vitorioso. Ao longo do governo Lula III, a prolongada campanha eleitoral da Faria Lima é insistir no risco de descontrole das contas públicas e na necessidade de corte de gastos. E o pleito vai sendo vencido no cansaço, com a ministra Simone Tebet fazendo questão de ser a porta-voz da austeridade dentro do Planalto. Outra parte da estratégia é ver sempre o copo meio vazio. Assim, se o governo comemora a projeção de crescimento do PIB em 3% estimada pelo FMI para este ano, os pessimistas só veem os 2,2% projetados para o ano que vem como um prenúncio da catástrofe, insistindo no risco de escalada inflacionária. Ao mesmo tempo, Campos Neto anuncia o perigo de uma politização no período de transição da presidência do Banco Central, desqualificando preventivamente qualquer tentativa de mudança na atual política de juros altos. O sucesso do momento permitiu acrescentar ao cardápio da austeridade a reforma administrativa, fazendo dela pré-condição para um futuro corte nos juros, ideia antiga que sempre volta quando a fome do mercado aumenta. Se a proposta do governo de substituir o Decreto-Lei nº 200 dos tempos da ditadura parece justa, poucos acreditam que colocar essa pauta na mesa possa trazer de fato melhorias nas carreiras, nos salários e nas condições de trabalho dos servidores. Além disso, Elio Gaspari lembra que sempre que o governo tenta cortar do andar de cima do serviço público - entenda-se altos salários - o mercado empurra a régua para o andar de baixo. Assim, se conforma um cenário perigoso. Sem uma pauta propositiva para avançar, o governo permanece preso na armadilha dos juros, do corte de gastos e na disputa do orçamento com o Congresso, comemorando as pequenas vitórias trazidas pelo avanço da reforma tributária e alimentando esperanças de que o crescimento econômico solucione todos os problemas.
.BRICS +. A ocorrência da 16ª Cúpula do BRICS em Kazan, na Rússia, tem múltiplos significados. Mais do que pronunciamentos ou decisões impactantes, o fator central é o crescimento orgânico do grupo, enterrando a ideia de que seria apenas um clube de amigos da Rússia e da China. Não só foi o primeiro encontro em que Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos participaram como países-membros, mas também definiu-se a entrada de mais 11 países como parceiros, incluindo Bolívia e Cuba. É claro que o evento em solo russo desafia os embargos e a criminalização de Putin pela OTAN. Mas a posição do Brasil por uma solução pacífica da guerra na Ucrânia mostra que há mais interesses e visões em jogo. O que mostra também que os BRICS é muito mais um agrupamento variado de países e interesses do que um bloco sólido. O que eles têm em comum é a aspiração a superar a ordem unipolar ocidental em crise, destaca Javier Vadell, por isso a Cúpula seria mais um passo rumo a uma ordem multipolar. Nesse quadro, destaca-se o esforço para desvincular-se do dólar nas transações comerciais, onde o Novo Banco de Desenvolvimento, que tem à frente a ex-presidenta Dilma Rousseff, joga um papel central. Ficou evidente também que o governo brasileiro tem seu próprio protagonismo, com o veto nos bastidores ao ingresso da Venezuela, e sua própria agenda, com Lula mencionando em seu pronunciamento os mesmos temas recorrentes: combate à fome e à desigualdade econômica, democratização das instituições de governança global, combate às mudanças climáticas, maior participação das mulheres e pacificação do cenário mundial.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.BRICS: Uma alternativa ao imperialismo? Acesse aqui a cartilha produzida pelos Institutos Tricontinental e Front sobre o papel histórico do bloco.
.‘Negacionismo soft pode ser mais perigoso que o histérico’. No Nexo, Alexandre Costa fala sobre a nova estratégia das grandes companhias de petróleo para a questão climática.
.Mergulhei na campanha de Trump e constatei que a mentira já venceu. Como Trump se tornou o maior influenciador da opinião pública estadunidense. Por Jamil Chade no Uol.
.Genocídio sem hesitação. No A Terra é Redonda, a escritora e ativista Arundhati Roy analisa o massacre israelense em Gaza.
.Exclusão social no neoliberalismo abre caminho ao crime organizado e ao extremismo religioso. Em entrevista ao Brasil de Fato, o economista Marcio Pochmann fala sobre os desafios da esquerda em tempos de catástrofe.
.O que está em jogo no julgamento do Caso Mariana em Londres. Julgamento pode abrir precedente para responsabilizar empresas envolvidas em crimes ambientais. No DW.
.Em “cidade do WhatsApp”, app favorece fake news como único meio de comunicação. Numa cidade sem rádio nem TV, as redes sociais são a única verdade. Na Pública.
.Apolônio de Carvalho. Jean Marc Von Der Weid recorda seu encontro com Apolônio de Carvalho na França dos anos 1970.
.Manuscrito inédito de Prestes aponta estratégia para driblar tropas há 100 anos. O filho do dirigente comunista mostra porque Prestes foi o precursor da moderna guerra de movimento. Na Folha.
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Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Edição: Nathallia Fonseca