INCONSTITUCIONAL

Contra a PEC do marco temporal: indígenas convocam atos em todo o país para esta quarta (30)

Em Brasília, cerca de 400 indígenas vão marchar pela Esplanada dos Ministérios e entregarão carta aos três Poderes

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Lei do marco temporal continua vigente mesmo após o STF ter declarado a tese inconstitucional. - José Cruz/Agência Brasil

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) convocou mobilizações para esta quarta-feira (30) em várias partes do Brasil contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 48, que visa inserir a tese do marco temporal na Constituição Federal de 1988. Em Brasília, cerca de 400 indígenas irão marchar pela Esplanada dos Ministérios até a Praça dos Três Poderes, com concentração marcada para as 10h. Eles pretendem entregar uma carta aos chefes do Legislativo, Executivo e Judiciário.

"O momento é muito delicado. Estamos passando por uma grave ameaça no Senado Federal, que insiste em regulamentar o marco temporal. Quero chamar todos que possam somar à nossa luta, seja em Brasília, nos territórios ou nas redes sociais. Estamos passando por um processo de desconstituinte, ou seja, de um desmonte do texto constitucional. Não podemos permitir que retirem direitos fundamentais dos povos indígenas. Não podemos permitir que retirem direitos fundamentais da população brasileira!", destaca Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.  

Na carta, a Articulação dos Povos Indígenas apresenta 25 reivindicações, entre elas, "a publicação de portaria declaratória de 12 Terras Indígenas (TIs), a retirada de tramitação e arquivamento definitivo das Propostas de Emenda à Constituição que desconstitucionalizam os direitos indígenas, a exemplo da PEC 132/2015, PEC 48/2023, PEC 59/2023, PEC 10/2024 e PEC 36/2024, e declaração imediata da inconstitucionalidade da Lei nº 14.701/2023 pelo STF, para conter as violências contra nossos povos, a criminalização e o assassinato" de liderança indígenas.  

Marco Temporal 

Em 21 setembro de 2023, o STF decidiu que não era possível utilizar um marco temporal – no caso o dia de promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988 – para definir a ocupação tradicional da terra pelas comunidades indígenas. No mesmo dia, o senador Hiran Gonçalves (PP-RR) apresentou o Projeto de Emenda à Constituição (PEC) 48, que atualmente tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal. Nomeada pelos povos indígenas como PEC da Morte, a proposta altera o Artigo 231 da Constituição Federal, fixando um marco temporal para a ocupação das terras indígenas em 5 de outubro de 1988. 

Em outra frente, já em dezembro de 2023, o Congresso Nacional aprovou a Lei 14.701/2023 e restabeleceu o marco temporal. Desde então, quatro ações questionam a validade da lei (ADI 7582, ADI 7583, ADI 7586 e ADO 86), e outra pede que o STF declare sua constitucionalidade (ADC 87). Mesmo com o entendimento firmado pelo STF sobre a inconstitucionalidade da tese do marco temporal, o relator das ações, ministro Gilmar Mendes, não suspendeu a norma, que segue vigente, e determinou a instauração de uma mesa de conciliação coordenada por seu gabinete. Em agosto deste ano, as organizações indígenas decidiram se retirar da mesa, por considerá-la uma tentativa de "conciliação forçada e compulsória".  

"Nesse momento, estamos nos retirando dessa mesa de conciliação, porque ficou muito claro que é uma farsa e um ataque à vida dos povos indígenas", declarou à época Edinho Macuxi, Tuxaua do Conselho Indígena de Roraima (CIR). "Nós estamos indo para o nosso território, vamos fazer essa frente de luta, entendendo que nós também vamos ainda sofrer perseguição, vamos sofrer grandes ameaças, mas a gente não vai abrir mão do nosso território. O marco temporal, para nós, não existe, os nossos diretos não podem ser negociados, a nossa vida não pode ser negociada", afirmou a liderança indígena.  

Segundo a Apib, "o marco temporal é uma tese ruralista e anti-indígena, pois viola o direito originário dos povos ao território ancestral, já reconhecido na Constituição de 1988 e que a PEC 48 tenta alterar". A organização indigenista afirma ainda que a "tese também ignora as violências e perseguições que os povos indígenas enfrentam há mais de 500 anos, em especial durante a ditadura militar, que impossibilitaram que muitos povos estivessem em seus territórios no ano de 1988". 

Edição: Thalita Pires