BALANÇO

Resultado eleitoral do PT gera discussões entre integrantes da sigla

Para alguns, sigla cresceu e mostrou recuperação; para outros, é preciso correção de rota, de olho em 2026

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Presidente do PT, deputada Gleisi Hoffomann (à equerda), criticou fala do ministro Alexandre Padilha (à direita) sobre resultados eleitorais. - Joédson Alves-Marcelo Camargo/Agência Brasil

Membros do Partido dos Trabalhadores (PT) vêm, nos últimos dias, externando posições diferentes – por vezes complementares, outras conflitantes – sobre o desempenho da sigla nas eleições municipais. O partido passou de 184 prefeitos eleitos em 2020 para 252 em 2024, além de 3.130 vereadores eleitos, contra 2.668 no pleito anterior. O resultado foi comemorado por uns e criticado por outros.

Em entrevista coletiva, na segunda-feira (28), o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que o PT "não saiu ainda do Z4 que entrou em 2016 nas eleições municipais", em referência à eleição que ocorreu imediatamente após o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff. Naquele ano, o PT passou de 625 prefeituras comandadas pelo partido para 252 – número igual ao de 2024. A expressão Z4 é da linguagem do futebol, e diz respeito aos quatro times com menos pontos do Campeonato Brasileiro.   

"Teve conquistas importantes, a eleição na capital, elegeu em cidades importantes nesse segundo turno. Mas ainda tem um esforço de recuperação. E eu acho que o PT vai fazer uma avaliação sobre isso", declarou Padilha.  

A presidenta do partido, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), demonstrou insatisfação com a metáfora usada pelo ministro. Em sua conta na rede social X/Twitter, ela citou as dificuldades enfrentadas pelo partido desde 2016. "Temos de refrescar a memória do ministro Padilha, o que aconteceu conosco desde 2016 e a base de centro e direita do Congresso que se reproduz nas eleições municipais, que ele bem conhece. Pagamos o preço, como partido, de estar num governo de ampla coalizão. E estamos numa ofensiva da extrema direita. Ofender o partido, fazendo graça, e diminuir nosso esforço nacional não contribui para alterar essa correlação de forças", publicou Hoffmann.  

"Padilha devia focar nas articulações políticas do governo, de sua responsabilidade, que ajudaram a chegar a esses resultados. Mais respeito com o partido que lutou por Lula Livre e Lula Presidente, quando poucos acreditavam", sugeriu. 

A posição da deputada foi seguida por outros membros da executiva nacional do PT, como a secretária Nacional de Finanças e Planejamento, Gleide Andrade, que usou a mesma rede social para responder às críticas de Padilha. "Desrespeitosa/injusta declaração do ministro. Toda crítica é bem-vinda, necessária, o PT tem espaços para debate e democracia interna. Bater no PT pela imprensa é o jeito fácil de agradar certa mídia e os adversários, mas nunca levou nenhum petista a bom lugar", publicou.  

Também o líder do governo na Câmara dos Deputados, o deputado federal José Guimarães (PT-CE), afirmou "o maior derrotado nessas eleições foi Bolsonaro" e celebrou os resultados eleitorais do partido. "A tentativa de destruição do PT se deparou com um partido enraizado na sociedade brasileira, porque veio para democratizá-la, transformá-la. Passado o massacre, o PT está em pleno processo de reconstrução. Cresceu nessas eleições. De 183 prefeituras saltou para 252. Elegeu 3.118 vereadores, 500 a mais. De 5.648.634 votos em 2020, conquistou 7.365.428 votos. Estamos reconstruindo o Brasil", publicou o deputado na rede X.  

O deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG) também usou a rede social X para defender uma correção de rumos do partido e da esquerda, na linha do ministro Alexandre Padilha. "A esquerda precisa reencontrar o caminho do diálogo com o povo. É fundamental ouvir as reais necessidades da comunidade e colocar em primeiro lugar o que realmente importa: garantir educação para todas as crianças, acesso à saúde especializada pelo SUS e ajudar as famílias a aumentarem sua renda. Somente assim seremos uma verdadeira opção de governo nas cidades, refletindo as necessidades e aspirações da população", publicou. Em entrevista à GloboNews na tarde desta terça-feira (29), o deputado voltou a fazer críticas ao partido e afirmou que a legenda teve um "péssimo desempenho" nas eleições municipais.

Executiva se reúne em Brasília 

Já no dia seguinte ao segundo turno, na segunda-feira (28), a executiva nacional do PT se reuniu em Brasília para fazer um balanço do desempenho do partido nas eleições municipais. Segundo integrantes do partido, a reunião foi marcada por críticas à declaração do ministro Alexandre Padilha e de outros membros da executiva que se posicionaram criticamente diante dos resultados. O ministro foi convidado, mas não compareceu. Ao final, a presidente do partido ofereceu uma coletiva de imprensa a jornalistas.  

Segundo Hoffmann, havia uma expectativa "mais externa que interna" de que o partido tivesse um melhor desempenho, considerando a liderança do presidente da República. No entanto, ponderou não haver causalidade entre os resultados em eleições de caráter nacional e municipal, a exemplo da eleição de 2022, quando Lula foi eleito sem o apoio da maioria dos prefeitos e governadores. Ela destacou ainda que o partido "paga um preço" por construir um governo de frente ampla. 

"Importante frisar que a gente faz parte de um governo de coalizão. Então o PT também paga um preço por isso, porque muitos aliados no plano nacional são os que disputam conosco no plano local", declarou.  

Hoffmann disse que o partido fez um esforço para construir alianças amplas, ainda que em muitos casos, tenham precisado renunciar a candidaturas próprias, e citou os casos de São Paulo, onde o PT apoiou Guilherme Boulos (Psol), Rio de Janeiro, onde Eduardo Paes (PSD) recebeu o apoio do partido, e em Recife, onde a sigla se aliou ao prefeito João Campos (PSB). 

Comunicação é um desafio  

A presidente do PT também falou sobre os desafios de produzir uma comunicação efetiva, vinculada à realidade do povo, "sem perder de vista os princípios" do partido. "Nós precisamos modernizar e ampliar o nosso discurso sem perder de vista os princípios e o programa que nos trouxe até aqui. Porque tem uma base que veio conosco até aqui e enfrentou os piores momentos, quando nós estávamos nos piores momentos. Não é esquecendo que a gente vai ampliar, mas eu acho que realmente a gente tem que fazer essa discussão sem abrir mão da discussão do papel do Estado que sempre nos guiou, do apoio aos trabalhadores e aos mais pobres", disse Hoffmann.

A deputada federal ainda defendeu que seja feita uma regulação sobre as redes sociais, que continua privilegiando discursos de ódio e preconceito. No contexto da possível candidatura de Lula à reeleição em 2026, Gleisi afirmou que será preciso um maior esforço do governo para comunicar suas pautas.  

"O governo tem grandes resultados, grandes programas, colocou de pé muita coisa, tem muita produtividade, mas não está conseguindo fazer essa disputa política na sociedade, dizer à sociedade o que está fazendo. E isso, obviamente, também tem impacto na avaliação política das pessoas. Então nós vamos precisar fazer com que o governo também faça essa disputa política sobre o seu projeto", destacou. 

Apoio a Boulos 

A crítica mais ácida aos resultados das eleições municipais veio de outro membro da executiva nacional do partido, o deputado federal e agora prefeito eleito de Maricá (RJ), Whastington Quaquá. "O PT precisa parar de errar!", publicou em sua rede social ainda no domingo (27), acompanhando de uma imagem em que comemora sua vitória na eleição. Na postagem, Quaquá faz duras críticas ao apoio do PT à candidatura de Guilherme Boulos (Psol) à prefeitura de São Paulo. 

"Boulos era a crônica de uma morte anunciada! A candidatura errada na cidade errada! Havia Márcio França, Tabata Amaral e até a Ana Stela Haddad, que nunca disputou eleição, mas poderia dialogar com uma ala mais conservadora nas periferias e classe média. Escolhemos uma candidatura com um teto de limite de eleitor de esquerda. Parece que voltamos a reaprender a gostar de perder!", escreveu Quaquá que, em abril deste ano, foi o único deputado federal do PT a votar contra a prisão de Chiquinho Brasão, acusado do assassinato da vereadora Marielle Franco e do seu motorista Anderson Gomes.

O prefeito eleito de Maricá ainda fez críticas ao papel do governo nas eleições municipais, e alertou para o risco de derrota em 2026, nas eleições presidenciais. "E o governo federal também não atuou coordenado e apoiando sua base. Age como se não tivesse responsabilidade com as eleições e a luta política real no território. Tá na hora de mudar ou seremos derrotados no momento que não podemos, em 26!", finalizou.  

Coube ao deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP) contrapor as críticas sem mencionar nomes. "Muito ruim a iniciativa de alguns membros da executiva nacional do PT de questionarem o apoio a Boulos em SP. Boulos foi leal com Lula e o PT nos momentos mais difíceis. Teve ótima performance há quatro anos quando foi ao segundo turno enquanto nós ficamos em sexto lugar. Foi o federal mais votado no estado e na cidade. O que queriam? Que apoiássemos o Nunes?", publicou o parlamentar.

Na coletiva de imprensa após a reunião de balanço da executiva do partido, Hoffman comentou as eleições em São Paulo, onde segundo ela, houve uma "super atuação das máquinas". "Você tem a máquina do governo do Estado de São Paulo e tem a máquina da Prefeitura de São Paulo que são muito fortes", afirmou.  

"Eles jogaram o tempo inteiro com situações de fake news, de baixaria. Basta ver o que o governador [Tarcísio de Freitas] fez no dia da eleição falando de facção criminosa apoiando a candidatura do Boulos. Quer dizer, não falou antes, não deu tempo para a gente poder se defender, para ir à Justiça Eleitoral, falou no dia da eleição para criar um fato que tem muita baixaria. Então a gente tem ali uma operação muito violenta e obviamente a gente não tinha essas mesmas condições", avaliou a presidente do PT. 

Edição: Thalita Pires