Na abertura do julgamento de Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, réus confessos do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, nesta quinta-feira (31), no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), os promotores do Ministério Público Estadual (MPE) e a Defensoria Pública apresentaram teses distintas, durante a sustentação oral da acusação.
Primeiro, falou o promotor Fábio Vieira, que explicou ao tribunal que o júri era formado por sete homens "de meia idade e pele clara", reforçando o perfil possivelmente conservador dos jurados.
Receoso de que esse coletivo tenha oposição às ideias políticas de Marielle, vereadora negra filiada ao Psol, o promotor passou a despolitizar o crime, tentando esvaziar o discurso e a atuação da vítima em sua trajetória como militante e legisladora.
"Nesse processo, a gente vê o que é a potência dessa mulher. Ela não é essa beleza, essa potência, porque escolheu a esquerda. Porque, se ela tivesse escolhido a direita, ela também seria uma beleza. É uma mulher que acredita, independente da ideologia, [na ideia de] 'eu tenho que fazer o certo'. É isso é que Marielle, o Anderson e a Fernanda fizeram. Foram pessoas que escolheram fazer o certo", argumentou Vieira.
Em seguida, o promotor Eduardo Morais Martins corroborou o discurso de seu antecessor. "Ah, é do Psol? Não gosto. Eles podiam ser de esquerda, matando alguém de direita, e eu estaria aqui defendendo a mesma posição."
Depois, falou a defensora pública Daniele Silva, que mudou radicalmente a estratégia traçada pelo Ministério Público e tratou de colocar a atuação de Marielle Franco no centro da sustentação oral e como motivação principal de seu assassinato.
"Precisamos racializar sempre o debate", começou Silva. "Precisamos sempre mostrar como nossos corpos são indesejados… Hoje, a violência é a norma… O último evento da Marielle na Casa das Pretas, se chamava 'Mulheres negras movendo estruturas'. Olha o que eu estou fazendo aqui."
Por fim, Silva recordou o discurso de Marielle na noite em que foi executada. "Nesse evento, já se aproximando do fim, ela dizia assim: 'Por dez anos, foi Benedita [da Silva], por dez anos, foi Jurema [Batista], não dá para achar que eu ficaria aqui, sozinha, por dez anos. Ou não dá para achar que vamos esperar por mais dez anos'. A Marielle não teve 40 minutos. 40 minutos depois ela estava sendo violentamente executada com quatro tiros na cabeça. Essa era a urgência que Marielle vivia e por isso ela incomodou tanto. Mexeu com as estruturas."
Edição: Martina Medina