O Equador não teve recuperação econômica relevante após a pandemia. O país, cujo PIB cresceria 2,1% este ano, segundo as estimações da CEPAL, deve ter um resultado pior que o esperado por enfrentar apagões diários que duram entre 12 e 14 horas.
Esses apagões já geraram perdas econômicas por US$ 1,5 bilhão (cerca de R$ 8,6 bi). Para se ter ideia do tamanho do desastre, em 2017 o Equador chegava a exportar energia elétrica a Colômbia e Peru.
O presidente do Equador, Daniel Noboa, tomou posse em 23 de novembro de 2023, após ganhar a eleição extraordinária, devida a demissão de Guillermo Lasso em abril do mesmo ano (para evitar seu impeachment)> Seu governo tem se mostrado incapaz de lidar com a crise energética.
Desde o fim dos mandatos de Rafael Correa (2007-2017), o Plano Diretor de Eletricidade do país não tem sido implementado. São três governos seguidos aplicando políticas neoliberais, destruindo o Estado e sua capacidade regulatória. A população e as demandas de energia cresceram, obviamente, mas a capacidade de geração de eletricidade não foi melhorada.
Também não foi feita a manutenção adequada das usinas hidrelétricas e termoelétricas do país. Se apenas a última tivesse sido feito os cortes de energia teriam uma duração bem menor.
Sabendo da seca, que afeta esse ano toda a América do Sul, e com cortes de energia que começaram em outubro de 2023 pela perda de capacidade de geração, nenhuma medida relevante foi tomada. A não ser voltar ao negócio dos anos 1980 e 1990, alugando uma barcaça termoelétrica que, além de ter um preço excessivo, está fornecendo apenas 12 MW dos 100 MW oferecidos no contrato, sem que o governo reclame por isso.
Devido a situação atual, no dia 27 de outubro foi aprovado na Assembleia Nacional, por ampla maioria, um PL que viabiliza o investimento privado no setor elétrico com procedimentos simplificados, por enquanto, apenas até 100 MW. A lei foi aprovada apesar de a Constituição afirmar que a gestão da produção de eletricidade é reservada ao Estado.
Tudo indica que o que está acontecendo faz parte de uma tentativa clássica de privatização, cuja receita básica, não esqueçamos, é parar de investir e deixar que os serviços públicos se deteriorem para assim justificar a privatização. Mas eles calcularam muito mal e o assunto saiu totalmente do controle. Estão conseguindo paralisar a economia, destruindo empregos e levando à falência a micro e pequena indústria e os chamados de microempreendedores (trabalhadores por conta própria, a grande maioria das vezes na informalidade).
O nível de incapacidade e inoperância do governo é chocante. Os ministros vão ao público para informar sobre cortes de energia no último minuto. Mais de uma vez entidades públicas divulgaram informações errôneas sobre os horários dos cortes nas redes sociais devido à improvisação constante.
O presidente praticamente não dá as caras, não explica quais são suas propostas para resolver a situação da eletricidade além de “esperar pela chuva”. O governo tem contratado um exército de trolls para dizer nas redes sociais que é um problema regional. O que é mentira claro, a seca é de fato, um problema regional, mas apagões diários não estão acontecendo em todos os países latino-americanos. No ano passado, o presidente Lasso conseguiu energia da Colômbia negociando com o presidente Petro, Noboa nem isso tem sido capaz de fazer.
A imprensa corporativa, sempre obediente as elites, em vez de investigar a fundo as causas do desastre atual, bem como denunciar os fortes efeitos sobre a população, publica conselhos ridículos sobre o que fazer durante os períodos sem eletricidade ou elucubrações acerca de como a falta de luz afeta o comportamento das pessoas.
Paralelamente, no dia 21 de outubro, o governo equatoriano iniciou a quarta rodada de negociações para um acordo de livre comércio com o Canadá. O conteúdo do acordo foi declarado confidencial, mas organizacoes populares denunciam que ele contém claúsuas a favor de projetos mineiros que envolvem empresas canadenses, um deles (Palo Quemado, no centro do país) foi fortemente militarizado semana passada pelos protestos da comunidade atingida.
Noboa, continuando com sua política de subserviência aos Estados Unidos quer mudar a Constituição para permitir de novo a instalação de bases militares estrangeiras no Equador, proibidas a partir de 2008. A Corte Constitucional decidiu que a reforma poderia ser feita na Assembleia Nacional, mas depois deveria ser votada em referendo pela população.
Ao mesmo tempo, o país continua batendo recordes de homicídios, com uma taxa de 45 por 100.000 habitantes. Cabe lembrar também das 450 pessoas mortas em massacres em prisões a partir de 2021, e dos hospitais públicos sem medicinas nem insumos médicos.
A única notícia “boa” é que a popularidade do atual presidente caiu significativamente, de modo que suas chances de vencer na eleição de fevereiro de 2025 diminuíram. Mas, entanto o anti-correismo e a rejeição contra qualquer candidato apoiado pelo ex-presidente Correa se mantém, um outro outsider, Jan Topic, de perfil similar a Bukele, o presidente de El Salvador e que já participou na eleição presidencial do ano passado, tem chance de angariar os votos de todos os descontentes com o atual governo, mas que não querem votar na Luisa González, a candidata da Revolução Cidadã, o partido do correismo.
Edição: Rodrigo Durão Coelho