De eleição de vereador à reforma tributária, o Centrão se tornou passagem obrigatória
Olá!
Da eleição de vereador à economia, todos os caminhos levam ao Centrão.
.Posto Ipiranga. O Centrão deixou de ser um rótulo de um suposto lugar no espectro ideológico para significar o verdadeiro centro da política. De eleição de vereador à reforma tributária, o Centrão se tornou passagem obrigatória, ou pedágio, para qualquer debate político. Com tanto poder, há quem adote a máxima, “se não pode com eles, junte-se a eles”. O deputado federal petista Jilmar Tatto disse em público, o que Zé Dirceu e Lula falam nos bastidores: o governo e o PT querem a volta do casamento com o MDB, aquele que começou no Dilma I e terminou com o Dilma II. Na prática, isso significa que o MDB ocuparia mais do que os três ministérios atuais na Esplanada. Por outro lado, os prefeitos emedebistas reeleitos em Porto Alegre e São Paulo ganharam com o discurso antipetista e preferem apostar numa candidatura de direita em 2026. Mas se o Centrão tem uma especialidade é construir acordos pragmáticos. Vide a virtual aclamação de Hugo Motta como novo presidente da Câmara. O PL só aceitaria apoiá-lo se a anistia aos golpistas de 8 de janeiro fosse pautada, exigência exatamente oposta daquela feita pelo PT. Para agregar gregos e troianos, Arthur Lira criou uma Comissão Especial para o projeto, o que zera a tramitação e praticamente enterra a ideia, como já havia feito com o PL das fake news. Ciente de que a anistia não tinha mesmo futuro, Bolsonaro topou porque ainda tem esperanças de transformar a comissão numa peça de propaganda e palanque. De olho em 2026 e seduzido por um governador que vende escolas para empresas de cemitério, o Centrão resolveu agora o que seria um problema em 2026: deu um jeito no próprio Bolsonaro, figura incômoda para manter a coesão do bloco com o MDB e PSD. Sem anistia à vista e com a PF concluindo o inquérito de 8 de janeiro, o capitão não só vê seu futuro se estreitar, como deve ter a companhia de um general no indiciamento, Augusto Heleno, na mais pura ironia, aquele que cantava “se gritar pega centrão…”.
.O voo da galinha torta. Passadas as eleições municipais, é hora do governo voltar às pautas nacionais. No entanto, as perspectivas para a próxima metade do mandato de Lula são muito diferentes daquelas de dois anos atrás. De lá para cá, o governo se consolidou, o bolsonarismo perdeu força e a economia teve uma ligeira melhora. E agora, com os últimos passos da reforma tributária em andamento, o novo arcabouço fiscal entra em pleno vigor substituindo o velho teto de gastos. O problema é que, além da taxação das grandes fortunas, vão por água abaixo também as esperanças de que o novo arranjo permitirá um aumento nos investimentos públicos. Por outro lado, mesmo podendo comemorar uma nova queda no desemprego, Lula parece ter entregado os pontos na sua luta contra os juros altos e a lógica da austeridade nas contas públicas. E isso pode comprometer todo o resto. Pior, os jogos de cena para ganhar tempo e desconversar o assunto já não funcionam porque o mercado perdeu a vergonha de chantagear abertamente o governo, especulando com o preço do dólar e ressuscitando o fantasma da inflação descontrolada. Por isso, ninguém mais duvida que haverá cortes e as apostas agora são para ver onde é que a tesoura vai comer mais. Nesse cenário, o ultimato do ministro do Trabalho, Luiz Marinho, de que poderá pedir demissão caso haja cortes em benefícios trabalhistas mostra outra faceta do trágico desfecho que está por vir: o governo não tem plano, não tem unidade de ação, age de improviso para responder às pressões do mercado e, no fim das contas, é cada um por si. Aliás, diga-se de passagem, o cenário interno é muito parecido com o latino-americano, onde a esquerda deixou de ter qualquer unidade. Nesse caso, além da depreciação das relações entre Brasil e Venezuela, pode-se contabilizar a escalada do conflito entre Evo Morales e Luis Arce na Bolívia, as dificuldades de Gustavo Petro para governar na Colômbia e um segundo turno difícil para a esquerda na eleição uruguaia.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.Colômbia: acossado, Petro cogita contra-ataque. Gustavo Petro alcança dois anos de mandatos sob fogo cerrado, mas sem trair as urnas e tendo conquistas para mostrar.
.Nem centrão, nem Bolsonaro: o verdadeiro vencedor das eleições é um bilionário. O empresário do agronegócio que financiou 72 candidatos a prefeito, 115 vereadores e 10 partidos políticos.
.Agronegócio financia lobby para patrulhar livros didáticos. Quem é a ONG do agronegócio, turbinada de dinheiro, para pregar mentiras históricas.
.Direita radical sequestrou a pauta do trabalho e do desejo, diz pesquisador. Mais do que respostas simples para perguntas complexas, a extrema-direita oferece a fantasia num mundo de opressão. Entrevista de Paolo Demuru para a BBC.
.Do pânico ao esquecimento: três anos da CPI da Pandemia. No Jornal da USP, a professora Deisy Ventura relembra a atualidade dos temas da CPI e o perigo de seu esquecimento.
.Vini Jr. causa à Espanha o incômodo de encarar seu próprio racismo. Na Espanha, o racismo é escondido por baixo do tapete. E Vini Jr incomoda por trazê-lo ao público e obrigar os espanhois a discutirem, escrevem Carlos Massari e Aurélio Araújo no Brasil de Fato.
.Os filmes estão piores porque seus investidores são avessos ao risco. Na Jacobina, como a relação entre banqueiros e o cinema foi tornando os filmes piores ao longo das décadas.
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Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Edição: Nathallia Fonseca