O ex-presidente da Bolívia, Evo Morales anunciou na noite da última sexta-feira (1) que deu início a uma greve de fome para pedir um "diálogo de paz" com o governo de Luís Arce.
"Não queremos derramamento de sangue. Sempre buscamos um diálogo sincero. Peço ao Pacto de Unidade e ao Estado-Maior do Povo que considerem um quarto intervalo no bloqueio das estradas", disse Evo Morales em uma postagem, em referência aos protestos em sua defesa que completam 20 dias neste sábado (2) e são alvo de operações policiais por parte do governo boliviano.
Os manifestantes pedem o encerramento das investigações contra o ex-presidente acusado de manter relações com uma menina de 15 anos em 2015, quando ainda era presidente e exigem que ele possa ser candidato às eleições presidenciais de 2025. O ex-presidente da Bolívia não compareceu para depor sobre o caso na Delegacia Geral de Polícia de Tarija e o Ministério Público anunciou, há algumas semanas, que emitiria um mandado de prisão contra ele, mas não se pronunciou desde então.
"Entraremos em greve de fome. O governo deve retirar todas as forças militares e policiais. Além disso, exigimos a criação de duas mesas de diálogo para discutir questões econômicas e políticas. A perseguição e a repressão devem cessar. Também solicitamos a participação de organizações internacionais e países amigos como facilitadores do diálogo", disse Morales em comunicado na noite de sexta-feira.
Ainda na sexta-feira, manifestantes ocuparam um quartel e prenderam cerca de 20 militares na região do Chapare, local que é reduto eleitoral do ex-mandatario. As Forças Armadas do país emitiram uma nota afirmando que a tomada de unidades militares por "grupos armados irregulares" é uma "traição à pátria" e pediram que os militares presos sejam libertos. O texto também pede que os manifestantes deixem as dependências das unidades militares.
Acusações
Evo foi acusado pelo ministro da Justiça, César Siles, de criar uma rede de jovens de 14 a 15 anos para ter a sua disposição enquanto era presidente. O ministro disse que esse grupo seria chamado de "Geração Evo". Os pais da jovem também estariam sendo investigados porque, supostamente, receberam dinheiro ao entregá-la ao ex-presidente em troca de favores.
De acordo com a lei boliviana, caso ele não se apresentasse para depor, a Justiça poderia determinar uma ordem de captura para que Morales deponha. César Siles reforçou que Evo estaria sujeito à prisão caso não comparecesse.
Na sexta-feira, a secretária de Gênero de Cochabamba, Tatiana Herrera, denunciou Evo por outros cinco casos envolvendo tráfico de pessoas e estupro. Os crimes teriam sido cometidos desde 2019. Elas seriam menores de idade e teriam sido enviadas a La Paz por intermediários.
"Cinco famílias do Chapare, que esta semana tiveram que chegar à cidade de Cochabamba para apresentar suas denúncias por atos de estupro, tráfico de pessoas e abusos, não puderam chegar devido aos bloqueios", disse Herrera.
O ex-mandatario criticou a investigação, dizendo que as acusações são "inventadas" e têm como objetivo forçar um processo criminal.
Disputa com Arce
Evo chamou de traição a relação com o atual presidente Luis Arce. O ex-presidente se tornou o principal opositor do atual governo depois de voltar do exílio na Argentina. Morales critica algumas decisões de Arce e seus apoiadores e passou a disputar espaço pela candidatura do Movimento Al Socialismo (MAS) nas eleições presidenciais de 2025.
O estopim da desavença, na corrida pela liderança do MAS, se deu em outubro de 2023, quando Morales organizou um congresso em Lauca Eñe, no distrito de Cochabamba. A região é berço político e reduto eleitoral do ex-presidente. No evento, ele chamou os apoiadores de Arce de "traidores".
O Tribunal Constitucional Plurinacional da Bolívia decretou, em dezembro de 2023, que presidentes e vice-presidentes só poderiam exercer o cargo por dois mandatos, de forma seguida ou não. Com a sentença judicial, Evo Morales, que foi presidente por quatro mandatos, não poderia voltar ao poder.
No entanto, um novo Tribunal Constitucional será eleito em dezembro. Os apoiadores de Evo consideram que, com novos juízes, essa norma poderia cair e Evo poderia voltar a ser candidato em 2025.
No último domingo (27), Morales publicou, em seus perfis nas redes sociais, um vídeo do momento em que o carro em que ele estava era alvo de tiros. De acordo com a denúncia de Morales, trata-se de um atentado cujos autores seriam quatro homens encapuzados e vestidos de preto. O ex-presidente disse que a perseguição aconteceu quando ele viajava de sua casa, em Villa Tunari, à cidade de Chimoré. Nesta sexta, ele disse que Arce conhecia os autores dos disparos.
O ministro de governo da Bolívia, Eduardo del Castillo, negou que o carro do ex-presidente tenha sido atacado pela polícia do país. De acordo com ele, o veículo que transportava o ex-mandatario fugiu de uma operação policial que estava na estrada da cidade de Villa Tunari.
Edição: Leandro Melito