Eleitores nos Estados Unidos vão ás urnas nesta terça-feira (5) eleger se Kamala Harris (democrata) ou Donald Trump (republicano) governará o país pelos próximos quatro anos. Ambos os candidatos chegam ao final da corrida eleitoral virtualmente empatados, em uma eleição que deve ser decidida nos chamados estados-pêndulo.
Nos EUA a eleição é indireta e cada estado tem um número de delegados ou delegadas proporcional ao tamanho da população e são necessários 270 de um total de 538 para conquistar a Presidência. A disputa real se dá nos sete estados-pêndulo: Arizona, Carolina do Norte, Geórgia, Michigan, Nevada, Pensilvânia e Wisconsin, nos quais nenhum partido tem voto garantido. A Pensilvânia é possivelmente o mais importante deles, com 19 votos eleitorais e foi lá que ambos concentraram seus esforços finais de campanha.
Campanha
No dia 27de abril de 2024, a campanha teve uma reviravolta quando Donald Trump e Joe Biden se enfrentaram em um debate na emissora CNN. O presidente democrata, de 81 anos, teve um desempenho desastroso: se enrolava ao falar e às vezes parecia perdido.O pânico se apoderou dos democratas.
Poucos dias após o fim da convenção republicana, mais uma reviravolta: Joe Biden anunciou que desistia da disputa à reeleição.
Em uma breve carta publicada nas redes sociais em 21 de julho, o presidente em fim de mandato cedeu à pressão dos democratas pelas dúvidas sobre seu estado físico e mental. Ele anunciou apoio à sua vice-presidente, Kamala Harris, para sucedê-lo na disputa.
Kamala sobe nas pesquisas
Em questão de horas, Kamala Harris conquistou o apoio dos principais democratas e se tornou a nova candidata do partido em um prazo recorde. A entrada na corrida eleitoral desta mulher negra, de ascendência sul-asiática, ex-promotora e quase 20 anos mais jovem que Donald Trump mexeu as fichas no tabuleiro político americano.
Animada por uma onda de entusiasmo, ela foi coroada candidata em agosto em uma convenção em Chicago com clima de festa e escolheu como colega de chapa Tim Walz, ex-professor e treinador de futebol americano que se tornou governador de Minnesota.
Tentativas de assassinato
Em 13 de julho, Donald Trump sobreviveu a uma tentativa de assassinato durante um comício na cidade de Butler, no estado da Pensilvânia (nordeste). Ele ficou ferido na orelha direita, ao ser alvejado por tiros disparados por um homem que estava em um terraço.
Com um punho para cima, ele foi retirado do local por agentes do Serviço Secreto que o cercaram no palanque, enquanto murmurava a palavra "Luta". Após um breve momento de unidade nacional, republicanos e democratas retomaram a campanha e seus ataques.
A convenção republicana deixou evidente o domínio de Trump no Partido Republicano. Ele escolheu o jovem senador J.D. Vance como seu companheiro de chapa.Em setembro, o bilionário voltou a ser alvo de outra tentativa de assassinato em seu campo de golfe na Flórida.
Semanas depois, o magnata republicano voltou a Butler para um grande comício ao lado de Elon Musk, o homem mais rico do mundo e dono da rede social X, da Tesla e da SpaceX.- A desistência de Biden.
Mundo
Analistas ouvidos pelo Brasil de Fato apontam que a diferença em relação à política externa não é considerável entre os dois candidatos mas, no frigir dos ovos, a administração de Donald Trump é avaliada como pior no cenário global.
Brasil
Apesar da forte influência que os Estados Unidos ainda mantêm no cenário internacional, o efeito das eleições presidenciais entre a candidata democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump para o Brasil está mais relacionado à política interna. Analistas ouvidos pelo Brasil de Fato apontam que a volta da extrema direita ao governo dos EUA favoreceria projetos golpistas, como o do bolsonarismo, hoje na mira do Supremo Tribunal Federal.
Eles dizem que uma eventual vitória de Donald Trump pode facilitar a anistia aos golpistas de 8 de janeiro de 2023, que reproduziram em Brasília a tentativa de golpe do eleitorado de Trump com a invasão do Capitólio em Washington após a derrota do republicano para Joe Biden em 2020.
América Latina
A eleição dos Estados Unidos vai opor a democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump em projetos diferentes de governo para o país. Se internamente os estadunidenses vêem programas antagônicos, analistas ouvidos pelo Brasil de Fato afirmam que, para a América Latina, a política dos EUA não muda tanto de um governo para o outro.
Nenhum dos dois candidatos que disputam o pleito em 5 de novembro têm falado sobre política exterior voltada para a América do Sul e Central. O principal tema tratado por eles é a migração. Nos debates transmitidos e nos discursos de campanha, tanto Kamala como Trump focam no combate à entrada de latino-americanos como meta para reduzir a migração aos EUA. A diferença entre eles se dá na forma como isso será feito.
Segundo o censo estadunidense, mais de 65 milhões de latinos vivem em território dos EUA, cerca de 20% da população do país. A atual vice-presidente e candidata do Partido Democrata afirmou em entrevista à CNN que as pessoas que quiserem ter uma cidadania estadunidense “têm que merecer”. De acordo com ela, é preciso fortalecer a segurança na fronteira.
Apesar do número elevado de migrantes que vivem nos EUA, a maioria do eleitorado é contrário à entrada de pessoas vindas de outros países. A pesquisa Gallup realizada em junho de 2024 mostra que 55% dos estadunidenses querem que a imigração diminua, enquanto 25% acreditam que é preciso manter o número de entradas atual e 16% acham que é necessário aumentar a entrada de pessoas.
Esse é o maior percentual de pessoas que querem uma redução da entrada de migrantes desde 2001. Por isso, o foco dos candidatos neste tema. Trump foi presidente de 2017 a 2021. Durante sua gestão, a média de deportações aumentou para 500 mil por ano. Ele pressionou os países da América Central a frear a saída de pessoas e ameaçou Honduras, El Salvador e Guatemala com o corte de apoio nas áreas de segurança e controle aduaneiro.
China
Embora a China não venha tendo a mesma centralidade na campanha presidencial de Donald Trump deste ano em comparação com a de 2016, quando venceu, o herdeiro e magnata do setor imobiliário continua mantendo o discurso hostil, tratando-o como uma ameaça à economia dos Estados Unidos.
A candidata democrata, por sua vez, durante a campanha tem falado pouco sobre a China. Em seu discurso de aceitação da nomeação à candidata, Kamala Harris afirmou esperar que "os EUA – não a China – vença a competição do século 21". Foi a única menção ao país asiático. Em seu discurso de aceitação, Trump fez 14 menções à China, incluindo acusações de roubo de empregos e de construções de fábricas de carros no México para vendê-los nos EUA "sem impostos".
Gaza
Analistas ouvidos pelo Brasil de Fato enxergam pouca chance de melhoria para esse povo caso os Estados Unidos elejam Kamala Harris ou Donald Trump como presidente no próximo dia 5.
Arturo Hartmann, pesquisador de Relações Internacionais e membro do Centro Internacional de Estudos Árabes e Islâmicos da Universidade Federal de Sergipe (CEAI-UFS) e Mohammed Nadir, coordenador do Laboratório de Estudos Árabes da UFABC (LEA-UFABC) concordam que nenhum dos dois deve brecar a sanha israelense, mas reconhecem que Trump pode ser ainda pior para palestinos.
"Muito da atual conjuntura foi arquitetada por políticas externas de quando Trump estava no governo. Ele desenhou um enquadramento de normalização dos países árabes com Israel, por meio dos Acordos de Abrãao, que almejavam incluir a Arábia Saudita e, por ora, incluem Bahrein, Emirados Árabes, Marrocos e Sudão", diz Hartmann.
Um dos motivos alegados pelo Hamas para os ataques de 7 de outubro era justamente impedir que os sauditas normalizassem relações com israel, movimento visto como capaz de sepultar a causa palestina. "Os Acordos de Abraaão foram um sucesso diplomático sem precedentes da gestão Trump. Eles ocorrem às custas da causa palestina", diz Nadir.
Ucrania
A guerra da Ucrânia - e os seus possíveis desdobramentos - é um dos principais pontos de disputa entre os candidatos das eleições dos EUA, que acontece na próxima terça-feira (5). No centro do debate está a questão do prolongamento do apoio financeiro e militar à Ucrânia.
Por um lado, a candidata democrata, a vice-presidente Kamala Harris, representa a continuidade da política do presidente Joe Biden, de apoio irrestrito a Kiev e confrontamento com a Rússia. Durante reunião com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, em Washington, a vice-presidente afirmou que o apoio a Kiev representa "um interesse estratégico dos Estados Unidos".
"Há pessoas no meu país que querem forçar a Ucrânia a desistir de uma parte significativa do seu território soberano, que exigirão que a Ucrânia aceite a neutralidade e desista das relações de segurança com outros países. Estas propostas coincidem com as propostas de Putin. E sejamos honestos, isto não são ofertas de paz. São ofertas de rendição. Elas são perigosas e inaceitáveis", disse Harris.
Do outro lado, o candidato republicano e ex-presidente, Donald Trump, já protagonizou um cenário de desgaste com a Ucrânia. Ele adota uma retórica de busca de resolução do conflito, mesmo que não forneça qaisquer detalhes sobre os planos de como resolver a crise. Durante a vista de Zelensky aos EUA no final de setembro, Trump disse que a Ucrânia "está em ruínas" e defendeu que o presidente ucraniano faça concessões a Putin.
Cuba
Como nenhum outro país, Cuba tem ocupado um lugar de destaque na política externa dos EUA. Nas últimas décadas, durante as diferentes administrações republicanas ou democratas, o bloqueio contra Cuba foi constantemente mantido. O que demonstra que, além das pequenas variações aplicadas de acordo com os diferentes governos, trata-se de uma política de Estado.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Ernesto Limia Díaz, historiador e ensaísta cubano, assegura que, independentemente de Kamala Harris ou Donald Trump serem eleitos, “não é possível esperar uma abertura para um processo de normalização das relações”. Afirma que, ao longo da história, os Estados Unidos mantiveram uma “política de guerra, não apenas contra o socialismo, mas também contra a nação cubana”, em uma tentativa de “subjugar” a ilha.
Edição: Leandro Melito e Rodrigo Durão Coelho