Apesar de o Brasil não ser no momento um país prioritário para as relações exteriores dos Estados Unidos, os efeitos da eleição de Donald Trump, confirmada nesta quarta-feira (6) devem ser sentidos na política externa do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. A análise é de Barbara Motta, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal do Sergige (UFS) e coordenadora do Observatório de Política Externa para o Brasil.
"Num primeiro momento a principal implicação é como o Brasil vai conseguir se posicionar no meio da guerra comercial entre China e Estados Unidos. Para o Brasil é importante manter boas relações comerciais e diplomáticas tanto com os Estados Unidos quanto com a China já que os dois países são parceiros econômicos importantes", diz ela ao Brasil de Fato.
Ela considera que Trump deve retomar a política utilizada em seu primeiro mandato, com a adoção de tarifas comerciais para chineses, assim como pressionar os aliados a fazerem o mesmo. Em um novo mandato, aponta Motta, essa pode ser uma pressão política dos EUA sobre o governo brasileiro.
"Os Estados Unidos entendem que a América Latina é a sua área exclusiva de influência e o Brasil é um dos grandes países dessa área. Essa pode ser uma pressão que o governo Trump venha a fazer no Brasil pra afastar o país e o bloco regional de uma relação comercial e diplomática estreita com a China."
Em seu terceiro mandato, Lula tem buscado fortalecer o Brics, e atuou para a expansão do grupo durante a cúpula realizada em outubro na Rússia. A coordenadora do Opeb aponta que o protagonismo do Brasil nessa frente, que fortalece a aliança do Sul Global, pode ser visto como ameaça pela administração Trump.
"O Brics vem da busca desses países pensarem outra geometria nas relações internacionais e tentar melhor se posicionar frente aos principais centros de poder internacional que são Estados Unidos e Europa. Talvez o Brasil possa ser singularizado na região justamente por essa tentativa de se movimentar nas relações internacionais buscando arranjos alternativos que componham com outros países do Sul global como China e Rússia e que vão ser enfatizados pelo governo Trump como inimigos."
Lula cumprimentou Trump por sua vitória, em um indicativo de que o Brasil não deve iniciar a relação com os Estados Unidos em um tom de animosidade. O esforço da diplomacia brasileira, nesse momento, é para manter as relações entre os países no padrão de normalidade. Mas isso depende de como a administração Trump vai interferir nos assuntos políticos e econômicos da região, fomentando mudanças políticas e fortalecendo governos de extrema direita na região, como o de Javier Miliei na Argentina.
"Quando eu falo processo de mudança de regime eu estou pensando na questão da Venezuela e nas conversas entre Trump e Bolsonaro. A depender de como o Trump desenha a sua política externa pra região, é possível que esses atritos surjam em uma dinâmica de reação ao que o Brasil vê como inaceitável, e não necessariamente atritos iniciados pelo governo ou pela diplomacia brasileira."
Edição: Leandro Melito