O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, elogiou nesta segunda-feira (11) a declaração do chefe do Executivo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que afirmou respeitar as instituições venezuelanas. Segundo Maduro, a fala foi uma reflexão “sábia” do petista e completou: “Ponto a favor de Lula”.
“Estou de acordo com Lula. Cada país tem que buscar sua maneira de resolver seus assuntos, seus conflitos, seus problemas. O Brasil com suas instituições e sua dinâmica nacional soberana, e a Venezuela com nossa dinâmica também soberana. Me parece uma reflexão sábia de Lula. Podia dizer: Ponto a favor de Lula “, disse o venezuelano em seu programa semanal Con Maduro +.
Em entrevista, Lula havia dito no domingo (10) que não questionaria a decisão da Suprema Corte de outros países para que essas críticas não respinguem no Brasil no futuro. O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela validou o resultado das eleições de 28 de julho que tiveram a vitória de Nicolás Maduro com 51,97% dos votos contra 43,18% do opositor Edmundo González Urrutia.
“Eu não tenho o direito de ficar questionando a Suprema Corte de outro país porque eu não quero que nenhum país fique questionando a minha Suprema Corte, mesmo quando ela erra. Mesmo quando ela faz como fez comigo de não deixar eu ser candidato em 2018”, disse Lula.
Ainda segundo o presidente brasileiro, Maduro é um “problema da Venezuela” e cada presidente deve cuidar do seu país, sem interferir nas questões dos vizinhos. Ele reforçou também que não pode “brigar” com outros países da região como a Nicarágua e a própria Venezuela.
"Eu aprendi que a gente tem que ter muito cuidado quando a gente vai tratar de outros países e de outros presidentes. Eu acho que o Maduro é um problema da Venezuela, não é um problema do Brasil. Eu quero que a Venezuela viva bem, que eles cuidem do povo com dignidade. Eu vou cuidar do Brasil, o Maduro cuida dele, o povo venezuelano cuida do Maduro, e eu cuido do Brasil. E vamos seguir em frente. Porque também não posso ficar me preocupando. Ora brigar com a Nicarágua, ora brigar com a Venezuela, ora brigar com não sei com quem. Tenho é que tentar brigar para fazer esse país dar certo”, disse Lula
A fala de Lula também foi elogiada pelo ministro do Interior venezuelano, Diosdado Cabello. Segundo ele, “nunca é tarde” para reconhecer que essa é uma posição importante para a região.
“Gostaria que o mundo inteiro entendesse isso antes de dizer qualquer coisa sobre a Venezuela. Os assuntos internos da Venezuela são resolvidos pelos venezuelanos. Há pessoas que deixam escapar e depois dizem: 'ah, eu estava errado.' devemos respeitar nosso país e é bom que o presidente Lula assuma essa posição agora. Nunca é tarde demais", disse.
Ele também afirmou que a Venezuela vai respeitar a decisão interna de todos os países, inclusive dos Estados Unidos, que impõem sanções contra os venezuelanos há 7 anos. De acordo com Cabello, os EUA têm o seu próprio sistema e decide como são as suas eleições. “Se me perguntarem se lá existe democracia, para mim não existe”, ressaltou.
Crise entre Venezuela e Brasil
A tensão envolvendo os dois países vizinhos começou na corrida eleitoral venezuelana. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) brasileiro enviaria dois observadores para acompanhar o pleito, mas desistiu depois de Maduro afirmar que as urnas brasileiras "não são auditadas". Em vez de observadores, o governo brasileiro enviou o assessor especial, Celso Amorim, para Caracas durante as eleições.
Maduro foi eleito para um terceiro mandato com 51,97% dos votos contra 43,18% do opositor Edmundo González Urrutia. A oposição venezuelana contestou o resultado e afirmou ter recolhido mais de 80% das cópias das atas eleitorais e, segundo a coalizão de direita Plataforma Unitária, isso garantiria a vitória de Urrutia.
Isso, somado a denúncia de um ataque hacker contra o sistema eleitoral da Venezuela, levaram Maduro a pedir uma investigação pela Justiça. O órgão eleitoral atrasou a divulgação dos resultados detalhados alegando a atuação hacker, o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) venezuelano investigou os supostos ataques, recolheu todo o material eleitoral do órgão e ouviu 9 dos 10 candidatos que disputaram o pleito. Só Edmundo González Urrutia não compareceu.
O governo brasileiro começou a articular com Colômbia e México a mediação da questão eleitoral venezuelana. Os três governos emitiram duas notas conjuntas pedindo a publicação das atas eleitorais pelo CNE e não pela Justiça do país. O TSJ da Venezuela validou a eleição de Maduro e pediu a publicação dos resultados desagregados em até 30 dias. No entanto, mais de 3 meses depois do pleito, os resultados ainda não foram publicados e o site do órgão eleitoral continua fora do ar.
Lula então passou a oscilar entre pedir que a situação seja resolvida internamente, sugerir a realização de novas eleições e dizer que não reconhecia a vitória de Maduro se os resultados das atas não fossem publicados e, consequentemente, sua vitória nas urnas fosse comprovada de forma independente.
A relação entre Venezuela e Brasil se estabilizou momentaneamente até a cúpula do Brics, realizada em Kazan, na Rússia, de 22 a 24 de outubro. Nela, o governo venezuelano esperava ser incorporado ao grupo na categoria de “Estado parceiro”, mas ficou de fora da lista de 13 novos integrantes por um veto do Brasil. A decisão do Itamaraty revoltou os venezuelanos.
O motivo do veto não foi justificado publicamente pelo governo de Lula. O presidente não compareceu ao evento e enviou o chanceler, Mauro Vieira, para chefiar a delegação. Caracas afirma que a decisão foi uma “punhalada nas costas” e que a medida de “ingerência” do governo brasileiro é uma forma de interferir na política local.
Em audiência na Câmara dos Deputados, Amorim reforçou que a questão do pleito deve ser resolvida por venezuelanos e que o Brasil não reconhece a eleição do presidente Nicolás Maduro, até que sejam apresentados os resultados desagregados. Amorim não explicou claramente o veto no Brics. Primeiro, disse que é preciso ser um país com influência e que represente a região, algo que, para ele, a Venezuela não cumpre. Em um segundo momento, citou o mal estar entre os governos brasileiro e venezuelano.
Em resposta à fala do assessor especial, o governo da Venezuela convocou o embaixador venezuelano no Brasil, Manuel Vadell, para consultas. Em nota, Caracas afirmou que a medida foi tomada depois das declarações “intervencionistas e grosseiras” de Amorim. A chancelaria venezuelana também convocou o encarregado de negócios do Brasil em Caracas para demonstrar “rechaço” às declarações de representantes do governo brasileiro em relação ao processo eleitoral do país.
Edição: Rodrigo Durão Coelho