Tiu França

Christian Dunker rejeita tese de 'lobo solitário': 'Sujeito era de um partido e esperava reconhecimento'

Psicanalista e professor da USP analisa o atentado contra o STF, que completa uma semana

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Sede do STF foi cercada pelas forças de segurança, após o atentado provocado pelo Tiu França - Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

Após uma semana do atentado cometido por Francisco Wanderley Luiz contra o Supremo Tribunal Federal (STF), que tinha como alvo o ministro Alexandre de Moraes, a tese do “lobo solitário” segue no vernáculo bolsonarista, a fim de desvincular o homem-bomba da extrema direita, para não prejudicar o projeto de anistia aos golpistas envolvidos com o atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.

Christian Dunker, psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), critica o uso da ideia. “A tese de que o homem que fez um atentado contra o Supremo seria um lobo solitário me parece bastante improvável, para começar pelo fato de que o sujeito se candidatou, fazia parte de um partido e tinha uma ampla circulação social e não apresentava aquele tipo de atitude padrão, que se usa para caracterizar um lobo solitário.”

Francisco Wanderley Luiz, que era conhecido como Tiu França, foi candidato a vereador em Rio do Sul (SC), em 2020, pelo PL, mesmo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, principal líder da extrema direita brasileira. O homem-bomba do atentado contra o STF não conseguiu ser eleito.

“O que é um lobo solitário?”, pergunta Dunker. “Alguém que se separou da alcateia. Lobos andam em conjunto. Um foi expulso, ele tinha hábitos distantes, não se dava bem, não conseguiu galgar posições como o lobo alfa e o lobo beta, por isso ele foi expulso. Não é o caso. [Tiu França] Não era alguém que tinha uma postura de introspecção e que vivia em isolamento. Pelo contrário, todos os depoimentos falam de uma pessoa com ampla circulação social”, explica o psicanalista.

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De acordo com as análises de parlamentares e militantes da extrema direita, Tiu França não teria relação com bolsonaristas em Brasília e não teria sócios em sua empreitada contra o STF e o ministro Alexandre de Moraes.

Dunker responde à tese. “Que ele tenha agido em rede ou em colaboração com outros, isso fica difícil de caracterizar quando pensamos em vinculações digitais, que podem não estar em um plano formal e forjado com setores e guarnições. O planejamento e a sensação de que você está agindo em conjunto pode acontecer pela vinculação do sujeito ao discurso. A pessoa pode se imaginar parte de um grande movimento ou de uma ação armada para tal dia, mas chega ali e ele está sozinho. A dimensão do coletivo ou do individual tem mais a ver com o funcionamento discursivo do que o planejamento coletivo.”

Para sustentar seus argumentos, o psicanalista cita um exemplo. “O que temos visto é uma série de atentados, assim como víamos nas escolas. Começam a surgir lobos solitários, mas com vários lobos solitários, você tem um conjunto, em que um responde ao outro e se forma uma tendência.”

Por fim, Dunker reflete sobre os últimos atos de Tiu França, que anunciou suas intenções durante todo o dia 13, na visita que fez ao Congresso Nacional e à sede do STF. No Facebook, anunciou:

“Vamos jogar??? Polícia Federal, vocês têm 72 horas para desarmar a bomba que está na casa dos comunistas de merda: William Bonner, José Sarney, Geraldo Alckmin, Fernando Henrique Cardoso… Vocês 4 são VELHOS CEBÔSOS nojentos”, sentenciou.

“Sua ação foi anunciada e dividida com os que estavam em volta, sugere que é um sujeito que esperava consideração e reconhecimento pelo que ia fazer, que seja como herói. Que seja um respaldo, que está procurando um ‘nós estamos juntos’. A política e a psicologia estão cada vez mais entranhados. Os sujeitos psicológicos estão cada vez mais atravessados por discursos políticos. Então essa discussão sobre o lobo solitário, que age dessa forma, tem problemas psicológicos, não me parece muito razoável”, finaliza Dunker.

Edição: Martina Medina