Gastos tributários devem estar sujeitos a avaliação de resultados como qualquer política pública
O Ministério da Fazenda divulgou uma lista detalhada de beneficiários de “gastos tributários”. A lista tem mais de 54 mil CNPJs e 42 benefícios e revela quem são os grandes beneficiários da bondade do Estado brasileiro. A campeã de subsídios, com R$ 2.275.589.976,23 (dois bilhões de reais) é a Braskem, que literalmente afundou vários bairros de Maceió. A empresa questiona os valores declarados e afirma ter recebido apenas R$ 175 milhões, o que é equivalente a aproximadamente 24 mil auxílios do Bolsa Família pagos durante um ano.
A lista também tem coisas inusitadas, principalmente entre os beneficiários do Perse, programa emergencial da pandemia para o setor de eventos. O programa foi renovado pelo congresso até 2026 e está cheio de aparentes fraudes.
O maior recipiente do Perse, com R$ 336 milhões foi o iFood, empresa que estava longe de precisar de auxílio durante a pandemia. As empresas de grandes influenciadores como Virgínia (R$ 4,5 milhões), Felipe Neto (R$ 14 milhões) e artistas como Luiza Sonza (R$ 560 mil) também estão na lista de beneficiários do Perse.
Apesar de o governo estar sofrendo uma enorme pressão por parte do mercado financeiro e da imprensa empresarial para cortar gastos sociais, o assunto gerou muito interesse nesses cantos. Para esses setores, representados no governo pelo bolsonarista Campos Neto, só interessam cortes que façam idosos passarem fome, como a desvinculação do Benefício de Prestação Continuada (BPC) do salário mínimo.
Haddad até tentou cortar várias mamatas dos empresários brasileiros, como a desoneração da folha de pagamentos e o Perse. No entanto, foi derrubado pelo Congresso. Assim como a imprensa empresarial e o mercado financeiro, o Congresso, dominado pela direita, só aceita corte de gastos se for no lombo do povo trabalhador. Mamata para grandes empresários ninguém quer cortar.
E cabe lembrar que não estamos falando de subsídios que trazem benefícios: o próprio Perse foi fundamental na pandemia, quando o setor de eventos passou por dificuldades. Mas já estamos em 2024, e o setor não está mais nas cordas – principalmente influencers e o iFood. As medidas de desoneração de folha de pagamento também não estão fazendo nenhum efeito relevante em termos de emprego.
No entanto, ao contrário da posição liberal contrária a qualquer subsídio, nossa posição deve ser de defesa da ferramenta e denúncia de quem abusa dela. Todo país rico usou e abusou de subsídios e outras formas de intervenção na atividade econômica para desenvolver seus setores econômicos de alta complexidade, como as empresas de tecnologia ou a indústria de máquinas e equipamentos.
O problema no Brasil é que toda iniciativa de política industrial é rapidamente capturada por interesses da burguesia e transformada em mero instrumento de aumento de margens de lucro. Nossa elite econômica periférica não é afeita ao trabalho de desenvolver tecnologias e qualificar a força de trabalho para disputar no mercado internacional.
Diante da captura e ineficácia da maior parte dos gastos tributários brasileiros, é muito importante cortá-los. Gastos tributários devem estar sujeitos a avaliação de resultados como qualquer política pública: é necessário avaliar quais são as metas da política, em quanto tempo os resultados serão avaliados e como a política será alterada diante dos resultados
E, apesar do mérito da decisão de divulgar os beneficiários de gastos tributários e da necessidade de cortar estes gastos, cabe lembrar que o problema que ensejou a atual discussão de corte de gastos é a incompatibilidade do arcabouço fiscal com o crescimento de alguns tipos de gastos.
Mesmo que eliminemos os subsídios desnecessários para alcançar as metas de superávit primário, o limite de 2,5% acima da inflação para crescimento das despesas, imposto pelo arcabouço fiscal, continuará sendo incompatível com os pisos constitucionais da saúde e educação e com a política de crescimento do salário-mínimo, aposentadorias e do BPC.
** Este é um artigo de opinião e não representa, necessariamente, a linha editorial do Brasil do Fato.
Edição: Geisa Marques