Apoiada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 5/2023, conhecida como “PEC das Igrejas” pode ser mais um desgaste do Palácio do Planalto com sua base à esquerda.
O projeto, em seu texto atual, poderia ter sido votado em primeiro turno no dia 14 de novembro deste ano, mas o atentado ao Supremo Tribunal Federal (STF) fez com que a Câmara dos Deputados adiasse a votação. A matéria, que deve voltar a tramitar nesta semana, prevê a desoneração dos salários de líderes religiosos e também da compra de bens diversos, não havendo distinção.
Um deputado federal da base do governo não quis gravar entrevista, mas disse à reportagem do Brasil de Fato que o projeto “causará mais danos ainda do governo Lula com os setores progressistas, que terão que engolir o ajuste fiscal que deve ser empurrado neste ano.”
O texto original é do deputado federal Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), que é bispo da Igreja Universal e sobrinho de Edir Macedo, fundador da denominação evangélica. Ao abraçar a proposta, o governo Lula sinaliza que quer se aproximar dos evangélicos, mesmo que isso custe mais uma fissura na relação com a esquerda.
Porém, o Palácio do Planalto pediu que a tramitação do projeto seja atrasada para que o governo possa trabalhar em alterações que reduzam o desgaste com os parlamentares progressistas, que terão que votar na matéria e justificar aos seus eleitores.
A PEC
O texto original da PEC das Igrejas proíbe a cobrança de tributos sobre bens ou serviços necessários para aquisição de patrimônio, geração de renda e prestação de serviços de todas as religiões.
Ainda de acordo com o projeto, também não haverá cobrança de tributo das organizações assistenciais e beneficentes ligadas às religiões, como creches, asilos, comunidades terapêuticas, entre outras.
A proposta foi aprovada em uma comissão especial da Câmara dos Deputados, formada apenas para analisar a PEC das Igrejas, em 27 de fevereiro deste ano. O projeto precisa ser analisado em dois turnos na Câmara e para ser aprovada são necessários 308 votos.
“Ampliação sem precedentes”
Para Humberto Ramos, doutor em sociologia pela Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) e coordenador de Otros Cruces no Brasil, a proposta é ruim. “Essa PEC representa uma ampliação de benefícios tributários, que vem numa sequência de demandas feitas por grupos religiosos, frequentemente grupos evangélicos, mas também católicos. É uma ampliação sem precedentes. De grão em grão, eles têm conseguido chegar numa imunidade [fiscal] quase total.”
Porém, explica Ramos, o projeto não deve ser lido como uma matéria de interesse apenas das igrejas evangélicas. “Também é interessante para a igreja Católica. Não há qualquer manifestação da CNBB [Conferência Nacional dos Bispos do Brasil] ou qualquer outra entidade, se colocando contra essa proposta. Os evangélicos são mais ruidosos, polêmicos e mais performáticos, mas, na retaguarda, há uma força do catolicismo referendando.”
Daniela Poli Vlavianos, sócia-fundadora do escritório Poli Advogados & Associados, alerta para “o risco de uso indevido do benefício. Algumas entidades religiosas, especialmente as de grande porte, são acusadas de acumular riquezas desproporcionais ou de utilizar recursos para finalidades que não se alinham às atividades religiosas, como a compra de bens de luxo ou o financiamento de campanhas políticas.”
Edição: Martina Medina