A votação da urgência dos Projetos de Lei Complementar (PLP) 210/2024 e o Projeto de Lei (PL) 4612/2024, que compõem o pacote de corte de gastos anunciado pela gestão Lula para adequar o orçamento ao arcabouço fiscal, acendeu um alerta na articulação política do governo. Isso porque, sem discutir o mérito das propostas, a base governista conseguiu parcos votos a mais do que os 257 necessários para acelerar a análise dos projetos pelo plenário.
No caso do PLP 210/24, que autoriza o governo a limitar a utilização de créditos tributários em caso de déficit nas contas públicas, foram 260 votos favoráveis à urgência, 98 contrários e duas abstenções. Já o PL 4614/24, que modifica a forma de cálculo para o reajuste do salário mínimo, limitando o aumento a 2,5%, recebeu 267 votos pela urgência e 156 contrários a ela. Agora, o governo precisa trabalhar para ampliar essa margem se quiser aprovar o mérito dos projetos, em votação que deve acontecer na próxima semana, antes do recesso de fim de ano.
“Na hora de discutirmos os méritos, nós vamos melhorar as matérias”, se comprometeu o líder do governo na Câmara dos Deputados, o deputado José Guimarães (PT-CE), durante a votação, na tentativa de dirimir resistências de setores do parlamento. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de liberar o pagamento de emendas paramentares sob condicionantes mais rígidas de transparência e rastreabilidade acabou por atiçar a insatisfação de parlamentares, que veem a determinação como resultado de uma articulação do Judiciário com o Executivo.
No entanto, a resistência não vem apenas dos setores reacionários do Congresso Nacional e nem se resume a uma reação às novas regras para o pagamento das emendas. O Partido Socialismo e Liberdade (Psol), integrante da base de esquerda do governo, orientou voto contrário à urgência dos projetos e faz oposição ao mérito das propostas. O deputado Chico Alencar (Psol-RJ) justificou o voto contrário à urgência.
“O que é urgente nesse país é conter a ganância financeira, a especulação com o dólar, os ataques a programas sociais. Ou seja, a justiça tributária precisa acontecer. E esse pacote não contempla isso”. E seguiu: “Veio a urgência para cortes de gastos no sentido mais tradicional e neoliberal, daqueles que mais precisam do benefício de prestação continuada, de reajuste efetivo e crescente do salário mínimo, aumento real do Bolsa Família, do Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação], tudo isso está afetado”.
Alencar afirmou ao Brasil de Fato que a bancada do Psol vai analisar as propostas enviadas pelo governo, mas adiantou que os parlamentares do partido irão rejeitar qualquer tipo de afago ao mercado financeiro, enquanto os trabalhadores pagam a conta.
“Nossa posição de conjunto é contra esse pacote. Acalmar o mercado não nos interessa, o que nos interessa é começar a reduzir as desigualdades sociais no Brasil e acalmar as tensões decorrentes dessas contradições na sociedade”, afirmou.
As propostas enviadas pelo Ministério da Fazenda ao Congresso incluem uma série de ajustes no orçamento público, com impacto sobre aposentadorias, além de alterações na política de valorização do salário mínimo, no abono salarial do Programa de Integração Social e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep), no pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e do Bolsa Família. Com isso, o governo pretende economizar cerca de R$ 375 bilhões até 2030 para garantir o cumprimento do arcabouço fiscal.
Edição: Martina Medina