O mercado não sofrerá as dores da partida do mais fiel e subordinado presidente que o BC já teve
Olá, na ausência de Lula, não foi Alckmin, mas a Faria Lima e o centrão que assumiram o governo.
.Não aprendi dizer adeus. Campos Neto presidiu sua última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Quando assumiu a presidência do Banco Central (BC), a Selic estava em saudosos 6,5% ao ano. Agora, despede-se deixando para o brasileiro que pretendia fazer uma comprinha parcelada no natal uma exorbitante taxa de 12,25%, a segunda mais alta do mundo. Para o governo, isso representa um acréscimo de R$ 55 bilhões na dívida pública. Ou seja, Campos Neto deu para o mercado em um dia o que o governo perdeu para o Congresso em emendas em um ano. Mais do que isso, o aumento da Selic desde setembro soma R$ 96 bilhões que deixam o orçamento público - apenas R$ 13 bilhões a menos do que o governo pretende economizar, em cinco anos, reduzindo o aumento real do salário mínimo. E o mercado não sofrerá as dores da partida do mais fiel e subordinado presidente que o BC já teve na história, afinal Campos Neto também deixou a garantia de seu legado na reunião do Copom, indicando mais duas altas nos próximos meses e a perspectiva de que chegaremos em março com a Selic batendo em 14,25%. A justificativa política é que a decisão blindaria Gabriel Galípolo de pressões no início de seu mandato. Mas a verdade é outra e muito pior. Segundo o BC, “implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego”. A insuspeita GloboNews traduziu em bom "Não se quer nem PIB subindo demais, nem desemprego caindo demais. Ou seja, é recessão e algum desemprego". Campos Neto deixa o BC e volta para o lado de lá do balcão da especulação. Agora, todas as atenções se voltam para Galípolo. A partir de março - mas só em março - saberemos se o Brasil vai ter o Presidente do Banco Central de Lula ou se teremos um Campos Bisneto atacando o emprego e o crescimento para satisfazer os desejos da Faria Lima.
.Exército de um homem só. Já virou rotina. Sempre que Lula afasta-se do governo por algum motivo, a especulação política e econômica toma conta. Desta vez a situação agravou-se por tratar-se de motivo de saúde, mas também devido ao inusitado cenário de final de ano, com uma pauta congestionada no Congresso. Lá, quem fez a especulação não foram os bancos, e sim o centrão. Foi mais uma semana em que a pressa do governo em aprovar o pacote fiscal foi negociada a preço de emendas, com a liberação de R$ 6,4 bilhões para deputados e senadores, e passando por cima das exigências do Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto, mesmo com uma tropa de ministros na negociação, a internação de Lula fez crescer a ambição da base aliada de ocasião, e nada melhor do que uma boa fofoca sobre reforma ministerial para fazer brilhar os olhos do centrão. A dança das cadeiras, no entanto, não deve sair antes do carnaval. A única área que talvez não possa esperar é a comunicação, que vive uma prolongada crise onde os atritos internos poderão levar à queda do ministro Paulo Pimenta, atualmente à frente da Secretaria de Comunicação Social (Secom). Mas o cargo continuará nas mãos do PT e de um quadro de confiança de Lula. Por sua vez, o andamento do pacote fiscal de Haddad no Congresso também deve ficar para o ano que vem. Aliás, a única notícia boa para o governo essa semana foi o avanço na tramitação da reforma tributária, apesar da retirada dos armamentos do “imposto do pecado”. De resto, quem deu mesmo as cartas foi a direita, que no plenário da Câmara concedeu anistia aos portadores de armas sem registro e, no mundo paralelo da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), aprovou o voto impresso nas eleições e novas medidas de criminalização da luta pela terra.
.2026 é logo ali. A saúde de Lula virou um mote para que a direita e o mercado questionassem a capacidade do presidente governar e explorassem as supostas desconfianças do petista em relação a Geraldo Alckmin, talvez sonhando que este venha a se tornar um novo Temer. Mas, longe do jogo sujo nas redes sociais, todos já calculam qual será o cenário mais provável para 2026, inclusive a esquerda. Por hora, os planos A, B e C do PT continuam sendo Lula, o que faz as avaliações sobre o governo serem ainda mais importantes. Mesmo que os dados apontem melhorias na situação social do país, a última pesquisa Quaest mostrou que grande parte da população desconhece o que foi feito e está insatisfeita com a economia. Ainda que o quadro seja estável, há uma leve retomada dos índices de reprovação, o que reforça a tese de que a comunicação do governo vai mal. Ironicamente, o único motivo de tranquilidade para a esquerda é que aquela direita empoderada no Congresso se encontra dividida quando o assunto é eleição. É por isso que o cientista político Carlos Melo prefere falar em “direitas” e não em direita, identificando quatro tendências, mais ao estilo Pablo Marçal; direita patrimonialista, leia-se centrão; e pessedismo ressuscitado, com a cara pragmática de Gilberto Kassab. A esquerda também tem a seu favor as cartas fora do baralho, como o próprio Bolsonaro, e agora também o senhor governador do agronegócio, Ronaldo Caiado (União), que se tornou inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por abuso de poder político. O que leva a um cenário em que Lula ou Haddad não teriam dificuldades para bater seus oponentes numa hipotética eleição. Enquanto isso, o STF julga o alcance do Marco Civil da Internet e a possível responsabilização das empresas de comunicação sobre os conteúdos veiculados, o que antecipa também as preocupações da Corte com a influência das redes sociais no processo eleitoral.
.Ponto Final: nossas recomendações.
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Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Edição: Martina Medina