O plano anunciado pelo presidente eleito Donald Trump dos EUA de aumentar tarifas para importações pode interromper a cadeia de abastecimentos nos Estados Unidos, afirmam especialistas chineses consultados pelo Brasil de Fato.
Em 25 de novembro, poucas semanas após vencer as eleições presidenciais, Trump afirmou que vai impor – a partir do primeiro dia de seu mandato (20 de janeiro de 2025) –, novas tarifas de 25% a todos os produtos importados do Canadá e do México, e uma tarifa extra de 10% além das taxas já existentes sobre produtos da China.
Desde 2002, esses são os três países que se mantêm como os principais parceiros comerciais dos Estados Unidos, quando a China substitui o Japão nessa tríade, logo em seu primeiro ano como membro da Organização Mundial do Comércio.
No ano passado, o México substituiu a China como maior parceiro no comércio com os Estados Unidos, uma posição que o país asiático manteve por 17 anos. Isso ocorreu, em parte, como resultado das políticas de tarifas implementadas no primeiro governo Trump sobre produtos chineses, e que foram mantidas pelo governo de Joe Biden.
Durante a campanha, Trump chegou a dizer que seu governo poderia impor tarifas de 60% aos produtos chineses e propor impostos de 20% à importação de produtos de todos os países.
A imposição de tarifas a todos os países, aumentará os preços em geral, e vai trazer problemas de inflação, explica, o pesquisador sênior do Instituto Taihe, Ding Yifang.
Com a inflação, o Federal Reserve [banco central dos EUA] será forçado a aumentar a taxa de juros, continua. Para o pesquisador chinês, isso é "completamente contraditório com o que Donald Trump pretende fazer".
Um dia antes do segundo turno das eleições que lhe deram a vitória sobre a democrata Kamala Harris, Trump prometeu em um comício na Carolina do Norte, um plano para cortar "drasticamente os impostos para trabalhadores e pequenas empresas". "Não teremos impostos sobre gorjetas, horas extras e benefícios da Previdência Social", disse o republicano.
"Ele quer diminuir a taxa de juros para revigorar o setor industrial, mas se a inflação subir, ele não vai poder manter essas promessas sobre a baixa na taxa de juros. Então é completamente contraditório", diz Ding.
"Se você começa uma guerra comercial, vai ter que arcar com os custos"
Tanto o Ding Yifang, como o reitor do Instituto da China da Universidade de Fudan, Li Bo (ambos economistas), concordam em que Estados Unidos têm muito a perder com políticas de taxações às importações como as prometidas pelo próximo presidente estadunidense.
"Essas restrições, na verdade, também são direcionadas ao setor de alta tecnologia dos EUA", diz Li Bo, que é diretor geral do site de notícias chinês, Guancha.
"Nessa guerra não é só a China que está perdendo, há empresas americanas, consumidores americanos, todos os fornecedores de terceiros. Se você iniciar uma guerra comercial, você tem que arcar com o custo", complementa.
Contêineres chineses no Porto de Los Angeles, em Long Beach, Califórnia - 14 de maio de 2019. / Mark RALSTON / AFP
A embaixada chinesa nos Estados Unidos afirmou que a "cooperação econômica e comercial China-EUA é mutuamente benéfica por natureza" e que "ninguém vencerá uma guerra comercial ou uma guerra tarifária".
Ding Yifang explica que quase a metade das exportações chinesas para os Estados Unidos não são produtos de consumo final, e sim bens intermediários.
"Portanto, as empresas da última fase da cadeia produtiva nos EUA, precisam desses bens intermediários para montar e fazer seus produtos finais, se as tarifas adicionarem mais custo à produção, isso prejudicará a competitividade dessas empresas estadunidenses, tanto no mercado doméstico quanto no mercado internacional", complementa Ding.
Como a China atuará caso Trump cumpra as promessas
No começo de dezembro, o Ministério do Comércio da China anunciou medidas para reforçar o controle sobre a exportação de itens que podem ter uso duplo, ou seja, tanto civil como militar, para os Estados Unidos. As novas medidas fazem parte de esforços para defender a segurança e os interesses da China e cumprir a não proliferação de armas de destruição em massa, segundo comunicado do ministério.
Concretamente, isso significou a proibição da exportação de gálio, germânio, antimônio e dos chamados materiais superduros para os Estados Unidos. Os minerais são utilizados na indústria de semicondutores e em outras de alta tecnologia. Desde 2014, mais de 90 por cento do gálio bruto foi produzido na China que também é o maior produtor mundial de germânio bruto.
Como outra restrição às exportações já havia ocorrido em 2021, o estudo calculou que uma proibição completa simultânea das exportações de gálio e germânio da China poderia reduzir o PIB estadunidense em US$ 3,4 bilhões (R$ 20 bilhões).
No ano passado, a China foi responsável por 48% do antimônio extraído no mundo. O metal é usado em munições, mísseis infravermelhos, armas nucleares, entre outros usos militares. Os especialistas chineses consideram que as medidas foram retaliatórias e que podem haver mais no futuro.
A retaliação não é apenas contra as tarifas dos EUA, "mas também contra a proibição da administração Biden sobre exportações para a China, de semicondutores, de equipamentos de produção de semicondutores, e também em relação às vendas de chips feitos nos EUA para a China", opina Ding Yifang
"No meu entender, o motivo pelo qual o governo chinês anunciou essas medidas de controle de exportação é apenas para mostrar nossa posição firme de que não temos medo de nenhum tipo de guerra comercial ou tecnológica", conclui Li Bo.
Edição: Rodrigo Durão Coelho