PRESERVAÇÃO

Povos indígenas apontam inconstitucionalidade em decreto do governo Zema sobre licenciamento ambiental em Minas Gerais

Apib encaminhou ao STF uma ação que aponta dez violações em norma assinada pelo governador

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Decreto assinado por Zema viola direito da autodeterminação dos povos - Elizabete Guimaraes/ALMG

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) ingressou no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ação que denuncia a inconstitucionalidade do decreto 48.893, do estado de Minas Gerais, promulgado pelo governador Romeu Zema (Novo) em setembro de 2024. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) foi distribuída ao ministro Flávio Dino na última segunda-feira (30).  

O decreto estadual interfere na exigência da Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) aos povos indígenas e comunidades afetadas por empreendimentos que causam impactos ambientais em seus territórios. A CPLI é prevista pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). 

A norma publicada por Zema define como povos indígenas a serem considerados em CPLI apenas aqueles reconhecidos pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Desse modo, no caso de licenciamentos ambientais realizado pelos órgãos estaduais, a consulta ficaria restrita a esses grupos.  

Além disso, o decreto define como terras indígenas somente as que foram demarcadas pela Funai e homologada pela União, excluindo os demais territórios ocupados por povos originários. Procurado pelo Brasil de Fato, o governo de Minas Gerais não comentou o assunto até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto. 

A ADI apresenta uma lista de dez violações, entre elas a da “autodeterminação dos povos indígenas em se reconhecerem enquanto indígenas ao delimitar que povos indígenas são apenas os reconhecidos pela Funai”. A autodeterminação é garantida pela Constituição Federal.  

O decreto assinado por Zema estende as limitações da necessidade de consulta prévia também às comunidades quilombolas e tradicionais. Segundo a norma, só serão consideradas na CPLI as comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural Palmares; e povos e comunidades tradicionais certificados pela Comissão Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais. 

“No caso em foco, discute-se a usurpação de competência legislativa, pelo Estado de Minas Gerais, de temática privativa à União (legislar sobre populações indígenas) e, igualmente, de assunto no qual somente a União pode propor normas gerais (meio ambiente)”, indica a ação da Apib, que aponta ainda a “direta violação ao texto da Constituição Federal”. 

O texto da ADI destaca o papel dos povos indígenas na preservação ambiental e indica que, com o decreto, o estado estaria se sobrepondo às normas gerais de direito ambiental, com o objetivo de reduzir a proteção ambiental. “Reduzir ilegitimidade as hipóteses de consulta para licenciamentos ambientais colocam em xeque tal proteção, e, por consequência, o meio ambiente ecologicamente equilibrado como um todo”, informa o documento. 

A Apib pede liminar para suspender os efeitos do decreto até o julgamento do mérito da ação e alega que a norma pode gerar danos irreversíveis aos povos indígenas ao afastá-los das decisões que podem causar impactos em seus territórios.

Edição: Nathallia Fonseca