Na contramão

Nova força de segurança municipal proposta por Paes é inconstitucional e não deve avançar, diz especialista

Para Orlando Zaccone, ao propor contratação de militares, decreto anunciado por prefeito do Rio pode ampliar problemas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
O vice-prefeito do Rio, Eduardo Cavaliere, e o prefeito reeleito Eduardo Paes durante cerimônia de posse no Palácio Pedro Ernesto, no centro da capital fluminense - Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Ao tomar posse nesta quarta-feira (1º), o prefeito reeleito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), anunciou que seu novo mandato contará com um grupo de estudos sobre a criação de uma Força Municipal de Segurança. Segundo ele, a entidade contará com egressos das Forças Armadas e deverá atuar complementando a ação das polícias Civil e Militar e da Guarda Municipal. A proposta foi formalizada através do decreto 55584, que prevê a coordenação do grupo pelo gabinete do prefeito.

Para o advogado Orlando Zaccone, delegado de Polícia Civil aposentado e coordenador nacional do movimento Policiais Antifascismo, a criação da força de segurança municipal não possui respaldo constitucional e tende a ser declarada ilegal.

"A Força Nacional de Segurança, criada pelo governo federal, foi criada com entes que já estão previstos no artigo 144 [da Constituição]. A força é composta pelas policiais civis, militares, corpo de bombeiros, então não há inconstitucionalidade. Criar uma nova força municipal para atuar de forma complementar na área de segurança pública não tem o mínimo cabimento", argumenta.

Segundo o especialista, Paes "está querendo fazer muita fumaça, mas esse fogo vai apagar rapidinho", já que a medida não deve avançar por fugir à legislação vigente. "Imagina se cada prefeito fosse criar uma polícia municipal nova?", questiona. "Tem todo uma legislação que regulamenta a participação do município na área de segurança."

Fator eleitoral

O doutor em ciência política pontua que as normas correntes já preveem à própria Guarda Municipal a atribuição de atuar de forma complementar às polícias militares, de forma ostensiva. "Parece que o prefeito está querendo não anunciar que está armando a Guarda Municipal", analisa.

"Não sei se ele está com medo de anunciar isso e perder votos no campo da esquerda. Ou porque ele teme que a Guarda Municipal armada no Rio de Janeiro possa trazer muito mais problemas do que solução. Aí, se ele cria uma força com militares da reserva, ele talvez tivesse menos problemas para entrar no tema da segurança."

O anúncio é interpretado como uma resposta de Paes à campanha eleitoral de 2024, quando opositores cobraram a gestão municipal pela falta de efetividade no combate à violência. Durante a posse, o prefeito disse ter se indignado durante as eleições pelo "excesso de cara-de-pau de dizer que ia mudar alguma coisa que estava muito mal quando, na verdade, são do mesmo partido".

"Todo mundo quer ter o campo da segurança pública para atuar, porque são cobrados por isso, mas ninguém quer ter a responsabilidade com os resultados – ou com a falta de resultados", opina Zaccone, lembrando que o governador do estado do Rio, Cláudio Castro (PL), declarou recentemente que não tem nenhuma responsabilidade no campo da segurança pública. Durante as eleições de 2024, Castro anunciou apoio ao deputado federal e ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem, também do PL. "Paes está tentando, de uma certa forma, buscar uma saída para esse dilema, de estar na segurança pública sem responder por ela."

Militares de reserva

Em relação à contratação de militares do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro (CPOR) para atuar na nova força municipal, o analista afirma que a proposta amplia problemas como a letalidade policial. "Nós já temos um problema com o policiamento ostensivo sendo realizado por forças militares. O nosso debate hoje seria, inclusive, a desmilitarização dessas forças. E ele está querendo ampliar isso."

O especialista acredita que a medida pode provocar, inclusive, um desentendimento da gestão Paes com os servidores da Guarda Municipal ao propor a contratação de militares para exercer funções que deveriam ser ocupadas por meio de concurso público.

Edição: Martina Medina