VENTOS DE MUDANÇA

Pesqueira (PE) tem líder indígena prefeito, sindicalista como vice e Câmara 40% indígena

Liderança jovem do povo Xukuru, Guila Araújo foi eleito presidente da Câmara; vice-prefeita é agricultora filiada ao PT

Brasil de Fato | Recife (PE) |

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O cacique Marcos (Republicanos) e a agricultora Cilene do Sindicato (PT) tomaram posse em Pesqueira (PE) - Baruque Fotografias

No município de Pesqueira, no Agreste de Pernambuco, tomou posse como prefeito, nesta quarta-feira (1º), o cacique Marcos Xukuru (Republicanos). Sua cerimônia foi acompanhada por uma Câmara de Vereadores que tem seis indígenas (40%) entre os 15 representantes do povo pesqueirense. A vice-prefeita é Cilene Martins, a “Cilene do Sindicato”, agricultora familiar e dirigente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Pesqueira.

A Câmara Municipal elegeu, por unanimidade, também no dia 1º de janeiro, o jovem indígena Guilherme Araújo (PDT) - ou Guila Xukuru - como presidente da casa legislativa. Guila tem 31 anos, é advogado do povo Xukuru e integra a equipe jurídica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), além de colunista do Brasil de Fato Pernambuco. Também são indígenas no legislativo municipal Sil Xukuru (PT), Pastinha Xukuru (PP), Negam de Bil (PP), Demilson Xukuru (Avante) e o opositor Biá Cabral (PSDB), cacique do povo Xukuru de Cimbres.

Na posse do prefeito, o novo presidente da Câmara afirmou aquele como um “momento histórico”. “Lá atrás isso parecia um sonho. É difícil estar num município em que parte da população acha que o indígena deve ficar à parte. Em vários momentos, o nosso sentimento foi de exclusão, devido à visão de antigos gestores do município. Mas, independente disso, o povo Xukuru nunca deu as costas para Pesqueira, uma cidade que tem também quilombolas e vários povos resistentes. Temos orgulho dessa terra”, discursou Guila Araújo.

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Guilherme Araújo (PDT), ou Guila Xukuru, foi eleito presidente da Câmara de Vereadores de Pesqueira (PE). / Laudivan Luiz

Após a vitória na disputa pela prefeitura, em outubro, o cacique Marcos lembrou a campanha acirrada contra o delegado Rossine Cordeiro (Podemos) e os ataques preconceituosos contra o povo Xukuru. “Para aqueles que não queriam ver um índio ou uma agricultora na prefeitura, estão vendo agora e vão ver por quatro anos”, desabafou. “Agora não tem mais a questão de ‘se’. Eu sou prefeito desta cidade. Eu sou prefeito do meu povo!”, bradou. 

Foi a segunda vez que o povo pesqueirense elegeu o cacique Marcos para a prefeitura, mas a primeira em que ele tomou posse. Em 2020, o cacique recebeu 17,7 mil votos (51,7%) dos pesqueirenses, mas não conseguiu assumir o cargo. A Justiça Eleitoral o considerou inelegível devido a uma condenação na justiça comum, em 2015, por um suposto crime que ele teria cometido em 2003.

O caso: havia uma divergência dentro do próprio povo Xukuru sobre um projeto de turismo religioso dentro da terra indígena. O cacique Marcos, ainda jovem e recém ascendido ao posto, foi atacado a tiros. O povo de sua aldeia reagiu e foi à aldeia divergente e ateou fogo em imóveis e veículos. A Justiça entendeu que o crime fora cometido a mando de Marcos. A disputa acabou rachando o povo Xukuru, que hoje se divide entre os Xukuru do Ororubá (liderados por Marcos) e os Xukuru de Cimbres (liderados pelo cacique Biá).

Impedido de tomar posse, o presidente da Câmara de Vereadores, Bal de Mimoso (Republicanos), aliado do cacique, assumiu interinamente a prefeitura. Marcos, que seria nomeado secretário posteriormente, passou um tempo sem nem ao menos poder pisar no prédio do Executivo municipal, por ordens da Justiça. A eleição suplementar só aconteceria em 2022, com o grupo do cacique vencendo novamente: Bal de Mimoso foi eleito, com Guila Xukuru como vice. Mas, em outubro de 2023, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) anulou a condenação de Marcos, que voltou a estar apto à disputa eleitoral.

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Liderados pelo Cacique Marcos, os Xukurus chegam à Prefeitura de Pesqueira (PE) / Baruque Fotografias

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Vinícius Sobreira