Preços subindo

Seca, enchente e dólar: entenda as causas da alta dos alimentos e da inflação em 2024

IPCA do IBGE fechou o ano em 4,83% e superou a meta estabelecida pelo governo

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Falta de chuva afetou a produção de alimentos no Brasil e levou à alta de preços em 2024 - Christian Braga/ Projeto Saúde Alegria

A inflação no Brasil fechou 2024 em 4,83%, superando assim os 4,62% registrados em 2023 e também a meta definida pelo governo para o índice. Essa alta foi puxada pelo aumento de 7,69% dos alimentos e de 9,71% da gasolina. A elevação dos preços teve grande influência da seca, das enchentes no Rio Grande do Sul e até da alta do dólar.

A cotação da moeda dos EUA subiu mais de 27% em 2024. Iniciou o ano cotada em cerca de R$ 4,85 e encerrou em R$ 6,18, crescendo principalmente nos últimos dias do ano em meio a uma pressão de agentes do mercado financeiro por corte de gastos do governo.

O dólar tem forte influência no preço da gasolina. O petróleo, matéria-prima do combustível, é negociado na moeda estadunidense. Como ele ficou mais caro no Brasil ante ao real, o preço da gasolina subiu por aqui.

A Petrobras não reajustou o preço da gasolina produzida pela empresa em 2024. Acontece que a estatal não consegue suprir toda a demanda brasileira pelo combustível. Importadores ou refinarias privadas garantem o restante. Eles tendem a seguir a cotação internacional, a qual subiu, pressionando os preços internos.

“O dólar foi o grande vilão do preço da gasolina principalmente no final do ano”, confirmou Weslley Cantelmo, economista e presidente do Instituto Economias e Planejamento.

A gasolina tem historicamente um grande peso sobre a inflação. Em 2024, dos 377 produtos e serviços pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para elaborar o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o combustível foi o que teve maior peso individual sobre o todo: 0,48% ponto dos 4,83%.

Comida pesa mais

O conjunto de itens relacionados a alimentos e bebidas pesou ainda mais sobre o IPCA. Dos 4,83%, 1,63 ponto veio só dessa categoria – afetada fortemente pelo clima.

“O IPCA foi puxado pela alta dos alimentos, que sofreram influência de condições climáticas adversas, em vários períodos e em diferentes localidades do país”, ratificou Fernando Gonçalves, gerente do IPCA.

O ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), concedeu uma entrevista nesta sexta-feira (10) para falar da alta da inflação no país. Sobre o preço dos alimentos, ele lembrou que as secas em diferentes áreas e a enchente no Rio Grande do Sul afetaram a produção agropecuária durante 2024. Isso teve consequências nos preços.

“No ano de 2024, nós tivemos eventos climáticos muito extremos”, afirmou. “O crescimento na agricultura deverá ser negativo — diferentemente do que foi em 2023, onde o grande puxador do crescimento do país foi a agricultura.”

Cantelmo reconheceu que todas as questões climáticas impactaram nos preços dos alimentos. Ele lembrou que secas e queimadas tendem a se tornar cada vez mais frequentes com as mudanças climáticas, tornando necessário que o governo reforce seus planos sobre o assunto para mitigar as consequências desses eventos. “O governo tem um bom plano, mas ele ainda é pequeno frente à necessidade que temos”, afirmou.

Faltam estoques

Pedro Faria, também economista, disse que o governo precisa reforçar suas políticas de estoques públicos. Esses estoques serviriam para abastecimento do país em período de escassez de determinados produtos ou mesmo diante da elevação de preços.

Estoques de alimentos foram praticamente esgotados durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu reativá-los, mas ainda não o fez. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) explicou que compras para estoques não foram feitas em momentos de baixo preço, que não ocorreram.

O estoque público de café, por exemplo, está praticamente zerado desde 2019. O café moído subiu 39,60% em 2024.

“Os Estados Unidos têm um estoque de petróleo. Outros países, como a China, têm estoques”, lembrou Faria. “O estoque serve até como um alerta para produtores que querem aumentar preço: ‘Se você aumentar, o governo vai liberar o estoque que ele tem e você vai perder mercado’. Já quando o preço cai, o governo garante um preço mínimo”.

Impactos da alta

Miguel de Oliveira, economista e diretor-executivo de estudos e pesquisas da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), disse que a inflação acima da meta em 2024 já era esperada há alguns meses. Ele ressaltou que o índice fora do estimado deve trazer impactos sobre a economia em 2025.

Por conta da inflação em alta, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central elevou a taxa básica de juros da economia, a Selic, para 12,25% ao ano no final de 2024, e prometeu aumentá-la para 14,25%.

Com os juros mais altos, compras e investimentos tendem a ser adiados. Por isso, a economia tende a crescer num ritmo mais lento.

Cantelmo espera que o novo presidente do BC, Gabriel Galípolo, atue de forma mais forte para conter a alta do dólar e minimizar os efeitos da moeda sobre a inflação no país.

Edição: Martina Medina