Os incêndios em terras públicas não destinadas aumentaram 64% em 2024, em comparação com o ano anterior, de acordo com dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). A alta levou a uma extensão de 2,46 milhões de hectares incendiados no ano passado. Desse total, as maiores áreas queimadas foram no Pará, com 934.378 hectares, e Amazonas, onde 669.594 hectares foram consumidos pelo fogo.
Parte dessas áreas coincide com regiões próximas às rodovias. "No Pará, destaca-se a região ao longo da BR 163. No Amazonas, destacam-se as regiões ao longo da BR 319 ao sul do Amazonas em fronteira com estado de Rondônia", diz Rebecca Lima, pesquisadora responsável pelos dados. As rodovias facilitam o acesso a essas terras e abrem caminho para os grileiros.
As terras públicas não destinadas são regiões sob responsabilidade dos governos estaduais ou federais que ainda não foram transformadas em assentamentos, Unidades de Conservação (UCs) ou outros territórios protegidos, como Terras Indígenas (TIs) e Territórios Quilombolas (TQ). Na Amazônia, essas terras somam 56,5 milhões de hectares, uma área equivalente ao tamanho da Espanha.
Por estarem em situação de insegurança jurídica, essas localidades são alvo de invasão. Nesse sistema de roubo de terras, o fogo complementa o desmatamento, como explica Paulo Moutinho, pesquisador sênior do Ipam. "A grilagem de florestas públicas não destinadas ainda é o motor da destruição da Amazônia brasileira. O desmatamento e o fogo fazem parte do mesmo processo de ocupação ilegal de terras públicas", diz.
Ele destaca que as áreas queimadas em 2024 já haviam sido desmatadas antes. "E assim ocorre sucessivamente", ressalta.
"O fogo é complemento do desmatamento. Você derruba a floresta e tem que tocar fogo. E o desmatamento é o principal instrumento de grilagem", explicou Maurício Torres, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), em entrevista ao Brasil de Fato para matéria publicada em setembro de 2024, sobre os incêndios nas terras públicas não destinadas.
Outras áreas de concentração de focos de incêndio estão em São Felix do Xingu (PA), município com o maior rebanho bovino do Brasil e líder de queimadas em 2024. Por lá, o fogo consumiu áreas dentro das terras públicas não destinadas e também fora delas.
No Norte de Roraima, outro ponto de concentração de incêndios, onde há campos abertos e vegetação rasteiras, o fogo está relacionado ao período de seca, entre os meses de dezembro e abril, agravado pelo fenômeno do El Niño. A esse fator, somam-se as atividades humanas, "como práticas agrícolas, extração de madeira, que degradam o solo e a floresta, tornando a região mais seca e a vegetação vulnerável a incêndios e falta de implementação de ações relacionadas a prevenção e manejo do fogo", como explica Lima.
Os números apresentados pelo Ipam reforçam a alta dos incêndios mesmo com a queda no desmatamento registrada em todo o bioma - e que repercute em florestas públicas não destinadas. "Nestas áreas, o desmate em 2024 somou 109.411 hectares, 20% a menos do que os 136.602 hectares desmatados em 2023", informa a nota do instituto.
De agosto de 2023 a julho de 2024, o ritmo do desmatamento na Amazônia diminuiu 22,3% em relação ao mesmo período entre 2022 e 2023, segundo do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes).
As informações apresentadas pelo Ipam são obtidas a partir do cruzamento de dados da plataforma Monitor do Fogo, do Mapbiomas, e do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que usam imagens de satélite para identificar os pontos de incêndio.
Edição: Nicolau Soares