Eleições

A eleição de Trump, as big techs e a ameaça do fascismo à soberania digital

A posse do republicano revela a decadência do sonho americano, mas não nos deixemos enganar: o império vai cair atirando

Rio de Janeiro (RJ) |
Trump e Elon Musk: as big techs são aliadas da extrema direita global, lucrando com seu ecossistema de desinformação e impulsionando suas ideias, valores e projeto político mundo afora - KENA BETANCUR/AFP

No último domingo (19), Donald Trump foi novamente empossado presidente dos Estados Unidos. Se sua eleição em 2016 era a promessa de crescimento da extrema direita mundo afora, seu retorno à Casa Branca é a certeza do fascismo à frente da maior potência econômica e militar do mundo.  

A posse do republicano deixa nítida a decadência do sonho americano, mas não podemos nos enganar: o império vai cair atirando. A transição para um mundo multipolar não acontecerá sem derrotas para os povos. Com a caneta na mão, Trump assinou 78 ordens executivas e revogações, todas pautadas por racismo, machismo, xenofobia e negacionismos de todos os tipos. A saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris, por exemplo, ameaça diretamente a sobrevivência de todo o planeta. 

Ainda assim, Trump não foi o protagonista de sua própria posse. A foto que marcou o dia não foi sua: foi aquela em que estão reunidos os CEOs das principais big techs do mundo. Além do novo ministro de Estado Elon Musk, estiveram presentes Mark Zuckerberg, CEO da META (que reúne redes como Facebook, Instagram e Whatsapp), Jeff Bezos, fundador da Amazon, Sundar Pichai, da Google, e Tim Cooke, da Apple. Essas empresas são avaliadas em trilhões de dólares e esses homens são algumas das pessoas mais ricas do mundo atualmente. 

Essa fortuna exorbitante se construiu em cima do controle do mercado de informação no mundo. Esse domínio confere não apenas recursos financeiros, mas consolidou um império que influencia decisões governamentais e políticas públicas, direta e indiretamente. Informação dá lucro e conquista poder. 

A presença desses sujeitos, com todos os holofotes, confirma o que já sabíamos: as big techs são aliadas da extrema direita global, lucrando com seu ecossistema de desinformação e impulsionando suas ideias, valores e projeto político mundo afora. Nas últimas semanas, a decisão da Meta em rever seu mecanismo de checagem de informações, abrindo ainda mais a porteira para o discurso de ódio e as fake news, foi uma das muitas demonstrações desse alinhamento. Se alguém tinha dúvidas, Elon Musk fez questão de exibir seu gesto nazista, debochando das nossas caras. 

Nessa conjuntura, a construção de soberania digital é um desafio na ordem do dia para o Sul Global. Não é possível entregarmos nossa comunicação nas mãos de meia dúzia de bilionários que alimentam o fascismo, muito menos para um funcionário do governo dos Estados Unidos. Musk já verbalizou seu apoio à AfD na Alemanha. Imaginem como será para os países dependentes? Nas últimas décadas, essas empresas já têm interferido nas eleições, suas campanhas e resultados, ferindo a autodeterminação nacional. Daqui pra frente, será cada vez pior. 

No caso brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2023, 88% das pessoas com mais de 10 anos utilizaram a internet; já o Relatório Global Digital aponta que passamos mais de nove horas por dia conectados principalmente nas redes sociais que pertencem a esse grupo. Sem políticas públicas de regulamentação, a população está sujeita a receber todo tipo de violência política e desinformação desde o café da manhã até a hora de dormir. 

Temos grandes desafios pela frente. O governo Lula precisa pautar alternativas de comunicação que fortaleçam nossa soberania. O Estado brasileiro não pode ficar refém dessas empresas, sob o risco de termos nossa democracia sequestrada pelo extrema direita. Precisamos disputar corações e mentes, fazendo a luta ideológica contra o fascismo todos os dias, nas ruas, instituições e nas redes. 

*Maíra do MST é vereadora do Rio de Janeiro, eleita pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Maíra é professora de história formada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), onde atualmente cursa doutorado.

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.

Edição: Martina Medina