DIREITO AO ESPORTE

No Recife, homens trans promovem espaço seguro e lutam por inclusão por meio do esporte

Força Trans FC existe há 6 anos e se prepara para disputa de torneio promovido pela Prefeitura do Recife

Brasil de Fato | Recife (PE) |

Ouça o áudio:

O Coletivo Força Trans foi fundado em 2019 para proporcionar espaços seguros para a prática esportiva de pessoas trans e não-binárias - Arquivo Pessoal

Todos os domingos, no turno da tarde, a partir das 14h, um grupo de 15 a 20 rapazes se reúne para jogar futsal na quadra do Centro Comunitário da Paz (Compaz) Ariano Suassuna, no bairro do Cordeiro, zona oeste do Recife. Pode parecer mais uma "pelada" de amigos, como tantas outras pela cidade. Mas nesta, os participantes são todos transmasculinos (ou homens trans), que têm naquele encontro, naquele grupo, um espaço seguro para se divertirem, praticando o esporte que gostam, sem medo de ser quem são.

O Coletivo Força Trans foi fundado em 2019, no bairro do Jordão, por pessoas transmasculinas e não-binárias, com o simples objetivo de se divertir. Os encontros saíram do Jordão e passaram por quadras do Ibura, também na zona sul, e pela Várzea, na zona oeste, até chegar ao atual local, um equipamento público municipal. Segundo uma das lideranças do coletivo, Luiz Gabriel, o grupo nunca sofreu hostilidades ao longo dos quase dois anos que estão no Compaz. "Ao contrário, sempre tivemos uma recepção muito massa", diz o jovem de 28 anos.

Leia também: Grupo gay usa esporte como forma de resistência no Recife

Com Tróia, Duda Beat, Nação Zumbi e Academia da Berlinda, atividades da Bienal da UNE são gratuitas e abertas a estudantes

Luiz Gabriel joga no ataque, de pivô, mas entende que o papel do coletivo é também atuar na defesa de direitos das pessoas transmasculinas. "No início era só uma 'pelada'. Mas com o tempo entendemos a necessidade de lutar por inclusão", explica ele. "As pessoas transmasculines são silenciosas, falamos pouco sobre nossas dores. Em grupo, ficamos mais seguros para ter essas conversas, perceber que há outras pessoas como nós", diz ele.

O jovem defende a prática de esportes como algo que vai além das quadras. "É uma forma de cuidar da nossa saúde mental e física – que é bem precária quando pensamos em transmasculines", diz Gabriel. "Então a gente se fortalece para também nos posicionarmos pelos nossos direitos", completa. Luiz Gabriel é estudante de pedagogia na Unopar e bolsista do Instituto Federal do Ceará (IFCE) para desenvolver projetos relacionando educação e esporte.

Recife Bom de Bola

Gabriel se mostra ansioso para o anúncio oficial, dentro de alguns meses, da inclusão de uma categoria transmasculina no Recife Bom de Bola, propagandeado como "a maior competição de várzea do mundo". Em novembro, após uma reunião na Prefeitura do Recife, Gabriel gravou um vídeo ao lado de dois dos organizadores da competição, Jean Monteiro e Amaury Pessoa, gestores na Secretaria de Esportes do Recife.


A Secretaria de Esportes do Recife garantiu que o campeonato Recife Bom de Bola 2025 terá uma categoria inclusiva para pessoas trans / Arquivo pessoal de Luiz Gabriel

Jean garantiu que em 2025 o campeonato teria uma categoria para pessoas trans e fazer adequações para tornar o ambiente mais inclusivo. "A gente buscou adicionar mais uma categoria na modalidade futsal e nos preparar para recebermos melhor as pessoas no ginásio e nos vestiários. Também devemos abranger uma faixa etária maior nesta categoria e incluir essas pessoas na equipe de trabalho", disse o gestor, em vídeo divulgado nas redes sociais. "O Recife Bom de Bola 2025 vai atender a todos, fomentando o esporte na cidade e incluindo o público de fora do Recife na nossa competição", afirmou.

Em 2024, o evento teve competições em 11 categorias, sendo três de futsal (sub-15 masculino, aberto masculino e aberto feminino) e oito em gramados naturais e sintéticos (masculino sub-11, -13, -15, -17 e -20, além de veterano masculino, aberto masculino e aberto feminino). No total, são duas competições de mulheres e nove de homens. "A gente precisa estar dentro. Só queremos que as pessoas respeitem a nossa identidade de gênero e os nossos pronomes", diz Luiz Gabriel.

O Coletivo Força Trans reúne 22 transmasculinos e pessoas não-binárias, com faixa etária que vai dos 16 aos 38 anos, que reivindicam que atividades e competições esportivas possam incluí-los. Espera-se que a possibilidade de equipes de outros municípios se inscreverem na competição estimule o surgimento de times e coletivos transmasculinos para participar. "A 'pelada' virou treino. Toda semana temos 3 horas de treino", diz o jovem, sem esconder o entusiasmo para competir.

Novo manto

Para comemorar o momento, o Coletivo Força Trans lançou, nesta quarta-feira (29), Dia Nacional da Visibilidade Trans, o novo padrão do time. "Fizemos o design com um profissional de São Paulo, num estilo que reforçasse a nossa identidade com a periferia, que é onde nasceu o nosso time", diz Luiz Gabriel, orgulhoso. A primeira padronização do time foi lançada em 2021, "com um orçamento bem baixo", explica o jovem. Desta vez o padrão é completo: camisa e short.

O novo padrão é preto e traz o brasão do Coletivo Força Trans do lado esquerdo do peito e o lema "Nós por nós e pelos nossos direitos" do lado esquerdo. A gola traz as cores do arco-íris, símbolo da luta LGBT, e na barriga a frase "Força LGBTQIAP+". Espalhadas por todo o padrão, em marca d'água, palavras como respeito, diversidade, luta, liberdade e futebol. Gabriel escolheu vestir a camisa 65, em homenagem ao nascimento de Mahin Domingues, historiador, ativista social e coordenador do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (Ibrat).

O coletivo planeja se estruturar financeiramente através de patrocínios e venda de camisas. Ele também espera que o grupo siga como um espaço de diversão e acolhimento para outros transmasculinos. Portanto, reforça que o coletivo está aberto para contatos via redes sociais ou pessoalmente, nas tardes de domingo (14h às 17h), na quadra do Compaz do Cordeiro.

Leia também: Esporte e Reforma Agrária se aliam na escolinha de futebol do MST no sertão pernambucano

16 anos depois, Processo Transexualizador no SUS segue restrito e sob ataque

Dia da Visibilidade Trans: vereadoras ampliam atuação e defendem pautas além da agenda LGBTQIA+


Nova camisa do Coletivo Força Trans lançada em 2025 / Arquivo Pessoal

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Vinícius Sobreira