O presidente interino do Haiti, Leslie Voltaire, disse nesta quinta-feira (30) que o governante da França, Emmanuel Macron, sugeriu a possibilidade de Paris restituir a pesada indenização que Porto Príncipe pagou em 1825, como parte do acordo de independência do país centro-americano, que esteve sob domínio francês durante mais de 150 anos.
Segundo Voltaire, a declaração de Macron ocorreu durante uma reunião entre os dois governantes no Palácio do Eliseu, sede da Presidência francesa, na última quarta-feira (29).
“Eu não pedi isso. Foi ele [Macron] quem começou a falar comigo sobre restituição e reparação” afirmou o político haitiano à RFI e France 24.
Segundo Voltaire, o presidente francês deve fazer uma declaração sobre o assunto no próximo 17 de abril, data que marca o bicentenário do acordo firmado entre o então presidente haitiano Jean-Pierre Boyer e o rei Carlos X, da França.
“Não estamos falando de dinheiro. Estamos falando sobre o princípio, sobre uma declaração que estudaremos juntos”, complementou.
Apesar da afirmação de Voltaire, um comunicado da reunião emitido pela presidência francesa não mencionou a possível devolução da indenização de independência paga pelo Haiti. O documento do Palácio do Eliseu informa que Voltaire e Macron “discutiram a situação política e de segurança no Haiti”.
O preço da independência
Após uma revolta de escravizados bem-sucedida, o rei francês Carlos X emitiu uma ordem em 17 de abril de 1825 renunciando aos seus direitos de soberania sobre o território e reconhecendo a independência do Haiti.
Mas essa primeira descolonização na história da França estava sujeita a várias condições, incluindo o pagamento de 150 milhões de francos aos ex-colonizadores, uma soma enorme para a época. O Haiti teve que pedir empréstimos a juros altos a bancos franceses para pagar essa dívida, um processo que durou décadas.
Autoridades haitianas acreditam que o pagamento desse valor explica, em grande parte, as dificuldades enfrentadas pelo país para superar a extrema pobreza.
Em 2022, o jornal estadunidense The New York Times estimou que esses pagamentos “custaram ao desenvolvimento econômico do Haiti entre US$ 21 bilhões e US$ 115 bilhões em perdas ao longo de dois séculos, ou entre uma e oito vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do país em 2020”.
Violência e grupos criminosos armados
O país vive em meio à violência provocada por grupos criminosos armados e, há mais de nove meses, é governado por um Conselho de Transição, presidido por Voltaire.
Contudo, no período, não houve avanços em direção à estabilidade, de modo que o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, alertou que a situação coloca em risco o processo de recuperação da política no país.
"É possível que o país não consiga adotar as medidas previstas no acordo de governança alcançado em 11 de março de 2024. Em outras palavras, o objetivo de restaurar as instituições democráticas até fevereiro de 2026 está em risco", afirmou.
Guterres também declarou que as gangues poderiam assumir o controle total de Porto Príncipe, capital do Haiti, se a comunidade internacional não aumentar seu apoio às autoridades locais.
De acordo com a ONU, os grupos criminosos armados já controlam 85% da capital. Segundo o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, pelo menos 5.601 pessoas foram assassinadas no país caribenho no ano passado, mil a mais do que em 2023.
Além disso, mais de um milhão de pessoas foram deslocadas internamente no país devido à violência, três vezes mais do que no ano anterior, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
*Com AFP
Edição: Geisa Marques