No último domingo (26), dezenas de pais de santo e filhos de santo se reuniram no Terreiro Portão de Gelo, da Nação Xambá, em Olinda. Eles denunciaram um suposto ataque sofrido no domingo anterior, dia 19, quando fieis da denominação protestante Assembleia de Deus realizaram uma “procissão” no bairro de São Benedito e dirigiram palavras ofensivas contra o terreiro.
Presente ao lado das lideranças dos terreiros, a deputada estadual Rosa Amorim (PT) enviou um ofício à Secretaria de Defesa Social (SDS) e ao Governo de Pernambuco cobrando a criação de uma delegacia especializada nas temáticas combate ao racismo e à intolerância religiosa. “O que aconteceu no Terreiro de Xambá é uma violência sem tamanho. Agrediram verbalmente filhos e filhas da casa, interromperam uma celebração que acontecia no terreiro”, reclama a deputada.
O Pai Ivo de Xambá, babalorixá do terreiro Portão de Gelo, lembra da ocorrência e informa que levou o caso para a delegacia mais próxima. “Era por volta das 14h30, quando escutei um barulho em frente ao terreiro. Era um grupo de evangélicos que parou em frente ao terreiro, professando proselitismo religioso, fazendo um culto em frente ao terreiro”, disse o líder. “Isso não é justo. Eles não iriam gostar que fizéssemos um xirê em frente à igreja deles”, discursou o Pai Ivo.
O caso no Xambá não foi o único. Outros terreiros na Região Metropolitana registraram que as caminhadas das Assembleias de Deus em seus bairros também escolheram rotas que passam em frente a terreiros de umbanda ou candomblé. O Brasil de Fato Pernambuco entrou em contato com o gabinete da presidência da Igreja Assembleia de Deus em Pernambuco (IEADPE), mas ainda não teve retorno sobre a posição da denominação quanto à ocorrência no Xambá.
Dois dias antes, no dia 17, o pastor Aílton José Alves, líder da IEADPE, divulgou nas redes sociais da denominação um vídeo em que convoca os fieis “para que saiam às ruas e vamos interceder pelas pessoas, pelas almas. Vamos promover a paz de Cristo. Estaremos juntos com o povo”. Ele se refere às caminhadas como “projeto de impacto na evangelização”. “Jesus vem e nós temos urgência nesse projeto e nesse impacto. Pernambuco para Cristo é o ideal da igreja neste momento”, diz o líder.
Pai Ivo de Xambá conta que chegou a abordar alguns dos líderes do movimento. “Falei com algumas lideranças deles na hora, no local, pedi que saíssem da frente do terreiro, mas algumas pessoas passaram a dirigir palavras ofensivas contra a Casa Xambá e por isso fomos à delegacia”, explica o babalorixá, que disse ainda que os protestantes “ameaçaram voltar em número ainda maior”.
A deputada Rosa Amorim cobrou rapidez na investigação. “O Terreiro de Xambá é Patrimônio Vivo de Pernambuco. Se esse absurdo passar impune, o que será das centenas de terreiros e dos milhares de adeptos das religiões de matriz africana e indígena no nosso estado?”, questiona a petista, que também quer a correta tipificação desses crimes nos Boletins de Ocorrência. “Só com esses dados coletados de forma correta podemos ter a quantidade de casos em Pernambuco e estabelecer políticas de combate e de prevenção”, completa Amorim.
O Código Penal (Lei 2.848/1940) tipifica o crime de intolerância como “impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso”, “vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”, “escarnecer alguém publicamente por motivo de crença ou função religiosa”. Os crimes de intolerância religiosa vêm crescendo desde 2021, triplicando os números de casos (de 683 para 2.124) e de denúncias (de 584 para 1.478).
A Lei Federal 14.532 equipara o crime de intolerância religiosa ao de racismo, prevendo uma pena de até cinco anos de reclusão, além de multa para quem comete esses crimes. Um dos canais de denúncia é o Disque 100.
Fonte: BdF Pernambuco
Edição: Vinícius Sobreira