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'Parece que há cota única para brancos no Judiciário', diz Barroso, em abertura anual do STF

O presidente do Supremo abordou ainda gastos e a importância da democracia na sessão solene desta segunda-feira (3)

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, na sessão solene de abertura do ano do Judiciário - Antônio Cruz/Agência Brasil

O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou, na tarde desta segunda-feira (3), a tradicional cerimônia de abertura do ano do Judiciário, com a presença de autoridades da República. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, fez um balanço das ações jurídicas em 2024 e os resultados gerados, sobretudo na redução de processos em julgamento no Supremo. O magistrado abordou ainda a diversidade, mencionando políticas para aumentar a quantidade de mulheres nos espaços colegiados, e um programa de bolsas para qualificação e incorporação de juízes negros nos tribunais.   

“Nós esperamos fazer com que o Judiciário tenha uma demografia mais parecida com a sociedade brasileira. Eu viajo pelo Brasil inteiro e visito os tribunais, converso com os juízes, converso com a direção dos tribunais, e o judiciário no Brasil é quase que integralmente branco. Parece que há uma cota única para brancos. E, portanto, nós precisamos incorporar, com qualidade, a diversidade brasileira também no poder Judiciário”, afirmou o magistrado. 

Em seu discurso, Barroso fez ainda referência à tentativa de golpe de Estado e à depredação da sede dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023. “O Supremo Tribunal Federal é celebrado como a Corte que ajudou a preservar a institucionalidade num momento da história em que se verifica a erosão democrática em muitos países, impulsionada pelo autoritarismo, pela arrogância e pela supressão de direitos”, disse Barroso. “Aqui, deste plenário, que foi invadido, queimado, inundado e depredado com imensa fúria antidemocrática, nós celebramos a vitória das instituições e a volta do país à normalidade plena com idealismo e civilidade. Não há pensamento único no país porque isso é coisa de ditaduras”, disse o presidente do STF. 

O ministro destacou a legitimidade do voto popular conferida aos presidentes dos demais poderes da República, no entanto, ressaltou a necessidade de que o poder Judiciário esteja “imune às paixões políticas”.  

“Aqui estamos, os presidentes dos três poderes. O presidente Lula, que foi eleito com mais de 60 milhões de votos, o presidente Davi Alcolumbre, eleito com consagrados 73 votos, de 81 senadores, e o presidente Hugo Mota, segundo candidato mais votado na história da Câmara dos Deputados, com 444 votos entre 513 deputados. E lembro que todas as democracias reservam uma parcela de poder para ser exercida por agentes públicos que não são eleitos pelo voto popular, para que permaneçam imunes às paixões políticas de cada momento. Esses somos nós”, afirmou Barroso.  

Mapeamento e regularização fundiária 

O presidente do STF afirmou que o Judiciário negocia com os ministérios da Gestão e Inovação (MGI), Meio Ambiente (MMA) e Desenvolvimento Agrário (MDA) um acordo de cooperação técnica para mapear o território brasileiro e promover a regularização fundiária, como forma de reduzir os conflitos arbitrados pela Justiça.  

“Estamos negociando com o Executivo, por meio do Ministério da Gestão, o Ministério do Meio Ambiente e com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, um acordo de cooperação técnica, para nós unificarmos as bases cadastrais dos imóveis no país, inclusive em áreas rurais e na Amazônia, e digitalizarmos isso. O país não tem controle pleno ainda do que a terra pública e do que é terra privada, inclusive, para enfrentarmos o desmatamento e a grilagem”, disse Barroso. “Considero que esse é um dos passos mais importantes do pacto que celebramos de transformação ecológica, que é a regularização fundiária no Brasil”, concluiu. 

Reforma tributária 

Barroso destacou que a reforma tributária aprovada pelo Congresso Nacional pode contribuir para a redução dos processos relacionados ao pagamento de tributos, que representam quase um terço de todos os processos que tramitam na Corte Suprema.

“A reforma tributária, em boa hora aprovada pelo Congresso Nacional, começa a ser regulamentada e a expectativa é que esse efeito simplificador diminua a litigiosidade em matéria tributária no país, que corresponde a cerca de 30% dos processos em andamento.” 

Números do Judiciário 

De acordo com o presidente do Supremo, atualmente há 18 mil juízes em todo o Brasil, 280 mil servidores, e 80 milhões de processos em andamento. Segundo Barroso, houve uma redução de 4 milhões no número de processos em 2024.  

O magistrado afirmou ainda que cada juiz brasileiro recebe, em média, cerca de 4.400 processos, pelo considerou que o Judiciário brasileiro é “um dos mais produtivos do mundo”. Sobre o custo do sistema, Barroso disse que o Judiciário gasta em torno de R$ 132,8 bilhões, o que corresponde a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. No entanto, ponderou que esse custo inclui o Ministério Público e a Defensoria Pública, e destacou a redução do percentual nos últimos anos.

“Em 2009, o Poder Judiciário da União representava 4,83% do orçamento fiscal. Em 2025, ele será de 2,93%”, informou o presidente do STF, que ainda agregou que cerca de 52% do custo estimado para o sistema de justiça são cobertos por recursos arrecadados pelo próprio Judiciário.  

Autoridades presentes 

Além de Barroso, discursaram o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Beto Simonetti, e o Procurador Geral da República (PGR), Paulo Gonet. O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB) e do Senado Federal, Davi Alcolumbre (União-PA), não fizeram pronunciamento.  


O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, e do Senado Federal, Davi Alcolumbre, estiveram presentes mas não falaram / Antônio Cruz/Agência Brasil

Também estiveram presentes o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), os presidentes do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Aloysio da Veiga, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB), e os ministros Jorge Messias, da Advocacia-Geral da União (AGU), Nísia Trindade, da Saúde, Camilo Santana, da Educação, Marina Silva, do Meio Ambiente, Jader Filho, das Cidades, Márcio Macedo, da Secretaria-Geral da Presidência, Vinícius Carvalho, da Controladoria Geral da União, e o titular da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, ex-integrante da Suprema Corte. 

Edição: Martina Medina