Nesta quarta-feira (5), o Supremo Tribunal Federal (STF) vai retomar o julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 635, popularmente conhecida como a “ADPF das Favelas”. A ação constitucional foi protocolada pelo PSB em 2019 e tem como marco o protagonismo de organizações de favelas e movimentos de mães e familiares de vítimas do terrorismo do Estado que atuam no processo como amicus curiae.
Por meio da ADPF 635, essas organizações e movimentos sociais fizeram chegar ao Supremo a sua luta histórica contra a violência de Estado dirigida de forma seletiva e racista contra os territórios de favela e o modelo de segurança pública sustentado na lógica bélica, que só tem produzido insegurança, dor e sofrimento para a maior parte da população do estado do Rio de Janeiro. Dentre as solicitações, o Fórum Popular de Segurança Pública do Estado do RJ quer destacar a pauta por uma Perícia Independente.
A Perícia Independente, como um dos temas da ADPF 635, possui hoje decisões internacionais como a condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) no Caso Favela Nova Brasília.
Na sentença condenatória da Corte, foi determinado, entre outras medidas de reparação e não repetição, que o Estado reduza a letalidade policial e adote mecanismos de perícia independente. A vinculação da perícia-técnico científica com as forças policiais gera uma série de restrições à sua atuação em virtude do seu posicionamento como órgão de acusação. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em relatório publicado em 2021, recomenda “a desvinculação do órgão de perícia-técnica da estrutura da Polícia Civil, constituindo um órgão independente, não subordinado às Secretarias de Polícia civil e nem militar".
Hoje, a população negra e favelada permanece submetida à mesma dinâmica estabelecida quando da criação do auto de resistência, durante a ditadura empresarial civil militar: culpabilização e criminalização da vítima; falta de transparência no procedimento investigativo principalmente pela ausência de uma perícia independente e autônoma
A ausência de uma perícia autônoma e independente produz resultados que se explicitam ainda mais no devastador cenário de desaparecimentos forçados no estado do Rio de Janeiro. Dados produzidos pela Iniciativa Direito a Memória e Justiça Racial (IDMJR) em 2023 demonstram que aproximadamente 25% dos desaparecimentos no estado estão situados na Baixada Fluminense e que há indícios da existência de pelo menos 92 cemitérios clandestinos em funcionamento na região.
Diante deste quadro, o Fórum Popular de Segurança Pública vem clamar ao Supremo Tribunal Federal que, dentre suas decisões, aponte a construção e consolidação de uma perícia independente e autônoma foram dos marcos policiais.
*Fórum Popular de Segurança Pública RJ é uma articulação de movimentos sociais de favelas, movimentos de familiares de vítimas de violência de Estado, organizações da sociedade civil, universidades, ativistas, entre outros sujeitos coletivos, que guardam um objetivo comum: construir uma nova concepção de segurança pública.
**Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato RJ.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Jaqueline Deister