O Supremo Tribunal Federal retomou, nesta quarta-feira (5), o julgamento do mérito da ação que trata sobre as regras em operações nas favelas e comunidades do Rio de Janeiro. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) sobre o tema, chamada de "ADPF das Favelas", foi apresentada em 2019 pelo PSB e entidades de direitos humanos. A Corte começou a analisar o caso em novembro do ano passado.
A retomada do julgamento, na quarta, se deu com o voto do ministro relator Edson Fachin, que reconheceu a violação de direitos humanos na segurança pública do Rio falando em um "estado de coisas inconstitucional". Fachin reafirmou uma série de regras para operações em comunidades do estado fluminense. Entre as regras recomendadas, estão o uso de helicópteros apenas em casos de estrita necessidade e que o cumprimento de mandados judiciais deve ocorrer apenas durante o dia.
Algumas outras medidas apresentadas pelo ministro Fachin foram: a presença obrigatória de ambulâncias nas operações, a preservação de vestígios de crimes pelas autoridades e a instalação de GPS e sistemas de áudio e vídeo nas fardas e viaturas policiais.
"Essa ADPF é de fundamental importância, porque depois que as regras votadas nessa ADPF foram implementadas, nós tivemos uma redução de 61% – não é pouco – nos homicídios durante as operações policiais dentro das favelas. Houve uma redução enorme na letalidade policial. A ADPF prevê o uso de câmeras, então ela forçou a corporação da Polícia Militar e batalhões como o Bope, batalhões de operações especiais, a usarem câmeras corporais", defende Fernanda Valim, coordenadora do núcleo de ativismo da ONG Rio de Paz, que conversou com o jornal Central do Brasil nesta quinta (6).
"Então é de fundamental importância para a população das favelas. Houve um impacto de 2020, quando foi implantada durante a pandemia, pra cá, que salvou muitas vidas até agora. E é importante não só no Rio, veja bem, porque essa história das regras da ADPF têm o potencial de se espalhar por outros estados do Brasil, visto que é uma decisão do STF", pontua a ativista.
Depois do voto de Fachin, o julgamento foi novamente suspenso e deve ser retomado em até um mês, segundo o presidente do STF, Luís Roberto Barroso. O magistrado também destacou a relevância da ADPF, dizendo que o STF não pretende criminalizar a Polícia Militar do Rio de Janeiro ao determinar medidas para a redução da letalidade nas operações.
É como também pensa Valim, que ressalta que a ADPF também trata de regras para proteção dos próprios policiais. Uma delas foi a recomendação para o governo criar um programa de assistência à saúde mental aos profissionais de segurança pública.
"O que a ADPF propõe é que as operações sigam o rigor da lei. É o que o ministro Fachin falou no voto dele: que a gente tem que combater o crime sem cometer crime. A ONG Rio de Paz, só para dar o exemplo da nossa organização – fora outras organizações que estão nessa mesma luta –, mantém na Lagoa Rodrigo de Freitas um mural que tem dois lados. De um lado você tem as fotos dos policiais mortos nessas operações, não só nessas operações. E de outro lado são as crianças, crianças mortas por bala perdida", explica.
"O Fachin fala aí de helicóptero, da excepcionalidade do uso de certos instrumentos como o helicóptero, mas na maioria dessas operações entra lá aquele camburão blindado, que é o caveirão, e os policiais descem, vão caminhando pelas vielas e vão disparando tiro de fuzil", denuncia Fernanda.
A coordenadora do núcleo de ativismo da ONG Rio de Paz também faz críticas ao prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), e ao governador do estado, Cláudio Castro (PL), que já se manifestaram contra a ADPF.
"Eu quero aproveitar para fazer um protesto aqui, porque o prefeito Eduardo Paes mandou que fosse feita a retirada das fotos só das crianças desse mural dizendo que não estavam lá legalmente, que não tínhamos um acordo com a prefeitura, só que as fotos dos policiais, os cartazes dos policiais ficaram, e os das crianças incomodaram. São 50 crianças mortas em 5 anos. É muita criança sendo morta de bala perdida durante operação", denuncia.
"A gente costuma dizer que não tem bala perdida, as balas elas são achadas, mas elas são achadas nos corpos das crianças pretas e pobres da comunidade e a sociedade trata isso como mero efeito colateral de uma operação que era necessária. E muitas vezes essa operação é mal fadada, não prende ninguém, não apreende nada. O governador Cláudio Castro postou há pouco tempo uma foto dele num depósito de armas, em que eles apreenderam tantos fuzis. Olha, a última grande apreensão de armas que foi feita no Rio de Janeiro, que apreendeu cento e tanto fuzis, não teve um tiro disparado, foi feito na base da inteligência, e esses fuzis não estavam na favela, eles estavam na Barra da Tijuca. Então, assim, qual é a necessidade de sair disparando o tiro a esmo dentro de uma comunidade arriscando a vida das pessoas?", problematiza.
A entrevista completa está disponível na edição desta quinta-feira (6) do Central do Brasil, no canal do Brasil de Fato no YouTube.
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