Com a largada do ano legislativo, cresceu o coro em torno da pauta da anistia para os envolvidos nos ataques aos prédios dos três Poderes, em Brasília (DF), em 8 de janeiro de 2023. Enquanto, de um lado, a ala bolsonarista tenta emplacar a pauta no Congresso Nacional sob novo comando, de outro, um grupo de entidades civis busca alavancar um abaixo-assinado digital que pressiona o novo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), a arquivar a proposta.
A campanha pela assinatura do documento começou no final de novembro, ainda sob a gestão de Arthur Lira (PP-AL), e ganhou fôlego nesta semana. Somente entre quarta (5) e quinta (6) houve cerca de 7 mil novas adesões. A campanha funciona da seguinte forma: para cada novo signatário que adere ao texto a plataforma envia um e-mail diretamente a Motta, pressionando-o a arquivar a proposta.
"Qualquer democracia séria rejeitaria veementemente com todas as instituições esse tipo de atentado contra o regime o Estado Democrático de Direito, mas o que nós temos visto no parlamento brasileiro representa o contrário disso, não apenas por parte dos apoiadores do ex-presidente Bolsonaro, que buscam anistia para quem tentou o golpe, depredou, destruiu os prédios das instituições brasileiras, mas por parte também de uma classe fisiologista que não demonstra compromisso com a democracia, e sim com os seus próprios privilégios. Essa classe tem nomes. É o centrão. Decidimos puxar essa campanha para fazer pressão direta no presidente como resposta da sociedade civil brasileira e da população", afirma o gestor de advocacy do Nossas, Lucas Loubac.
A organização é a responsável pelo abaixo-assinado, que conta com o apoio de outras entidades civis, como o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e o Pacto pela Democracia. O movimento de oposição à pauta da anistia mira o projeto de lei (PL) 2858/2022, de autoria do ex-líder do governo Bolsonaro e ex-deputado Major Vitor Hugo (PL-GO). O texto prevê anistia a todas as pessoas que tenham participado de manifestações em qualquer lugar do território nacional do dia 30 de outubro de 2022 –, data do segundo turno daquele ano, quando o presidente Lula (PT) derrotou Jair Bolsonaro (PL) nas urnas –, até o dia em a proposta entrar em vigor, caso seja aprovada.
Ao longo de 2024, por diversas vezes o PL foi colocado na pauta da Comissão de Constituição & Justiça (CCJ), então comandada pela bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC). Após intervenção do governo, Lira retirou o PL do colegiado e acenou que enviaria a proposta para análise em uma comissão especial, que não chegou a operar. "O que a gente tem de notícia de bastidor é que o Partido Liberal quer colocar isso no plenário, mas não sabe se tem voto. Se depender da sociedade civil, não vai ter voto", afirma o coordenador de advocacy do Pacto pela Democracia, Arthur Mello. Ele diz que a organização vê o PL 2858 como um "contrassenso à ordem democrática".
"Como se pode você fazer um PL anistiando uma série de pessoas que tentaram dar um golpe de Estado no país e que inclusive destruíram o mesmo parlamento onde alguns deputados querem votar esse projeto? Isso é uma tática de normalização da extrema direita no cenário político. A gente é contra essa normalização e a favor da responsabilização diante de todos os crimes contra a democracia, sejam eles os da ditadura militar, sejam de qualquer governo, em qualquer momento, porque a gente vê uma crescente também desse movimento de ataque à democracia e de ataque às instituições."
No sábado (1º), ao fazer o discurso de posse, Motta acenou para diferentes lados do jogo político e, por diversas vezes, mencionou a defesa da democracia. Apesar disso, na última terça (6), ao conceder entrevista à CNN, disse que "não há decisão sobre pautar ou não" o PL 2858. "Não seria razoável, não faria sentido para o discurso que ele fez na sua posse corroborar com uma anistia a quem tentou dar um golpe de Estado e a quem depredou não só o prédio do Congresso, mas tentou depredar o Estado Democrático de Direito", afirma Mello.
O abaixo-assinado tinha 69.197 assinaturas até o fechamento desta matéria. O documento pode ser acesso no link https://semanistia.org/#block-42944 .
Edição: Thalita Pires