Mais de mil pessoas participaram, neste sábado (8), da festa pela conquista do assentamento Resistência Camponesa, em Cascavel, oeste do Paraná. O evento celebrou a vitória de 71 famílias que, após 26 anos de luta, conquistaram a regularização da terra. A cidade tem um significado histórico para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), pois foi ali que, há 41 anos, ocorreu seu encontro de fundação.
A comemoração contou com um almoço partilhado, feira de produtos da Reforma Agrária e um baile popular. "Essa luta é uma conquista, da ajuda dos companheiros que se somaram, do nosso Movimento sempre ativo nas orientações pra que a gente pudesse chegar nessa conquista", afirmou Serlei da Silva Lima, produtora de alimentos agroecológicos uma das coordenadoras da comunidade.
Além da celebração, o evento foi marcado por cobranças ao governo federal para acelerar a Reforma Agrária. Atualmente, mais de 60 mil famílias vivem acampadas no Brasil, sendo 7 mil apenas no Paraná. "Não temos mais tempo para esperar. Há áreas ocupadas há 20, 30, 40 anos que precisam ser regularizadas", disse José Damasceno, dirigente do MST. "Nossas conquistas têm nome e sobrenome: fruto de uma luta popular do povo, companheiros das organizações populares, sindicais, igrejas progressistas. Tudo isso é cravado pela resistência popular", acrescentou.
João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST, destacou a crise ambiental e os desafios do agronegócio. "A luta de classes mudou. Não disputamos mais hectares com a burguesia, mas o futuro da sociedade. Nossa meta é produzir alimentos, plantar árvores e defender a natureza", afirmou. A deputada federal e presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, reforçou a necessidade de priorizar a Agricultura Familiar no orçamento público: "Precisamos redirecionar o crédito para feijão, arroz e comida, e não só para a soja".
Comunidade reunida no barracão do assentamento. / Foto: Thiarles França
O prefeito de Cascavel, Renato Silva, também esteve presente e garantiu apoio ao assentamento. "Precisamos continuar lutando pelo bem comum e ajudando quem mais precisa", declarou.
História de resistência
A trajetória da comunidade é marcada por desafios. Em 2019, uma ordem de reintegração de posse ameaçou despejar 212 famílias de três acampamentos da região. Como resposta, o MST organizou a Vigília Resistência Camponesa, que durou 83 dias às margens da BR-277. O protesto só foi interrompido pela pandemia, período em que os acampados se uniram às ações de solidariedade do MST para distribuir alimentos a famílias urbanas em situação de vulnerabilidade.
Para relembrar esse capítulo, a festa começou no mesmo local da vigília. Após uma mística em memória da resistência, os participantes marcharam até o centro da comunidade, entoando palavras de ordem e canções. "Esse espaço simboliza nossa luta. Aqui aprendemos que, quando lutamos, dá certo", disse Adair Gonçalves, coordenador da comunidade.
Comunidade consolidada
Ao longo dos anos, a organização coletiva garantiu infraestrutura e melhoria na qualidade de vida das famílias. A comunidade construiu um barracão, igrejas, campo de futebol e estabeleceu uma produção agrícola baseada em alimentos sem veneno e agroflorestas. Além disso, conquistou uma agroindústria para comercializar mandioca, fornecida a escolas públicas pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).
A festa também arrecadou alimentos para os Avá-Guarani de Guaíra (PR), que enfrentam constantes ameaças de fazendeiros da região. "Esse território do Paraná traz a herança de uma história de povo guerreiro, que começou lá com os Guarani, passando por diversas outras lutas", lembrou Stedile, destacando a importância da solidariedade com os povos indígenas.
O evento reuniu lideranças do MST, representantes do Incra, do governo estadual, parlamentares e integrantes de movimentos sociais e religiosos.