A deputada federal Célia Xakriabá (Psol-MG) foi barrada, nesta segunda-feira (17), de participar das últimas sessões que discutem alterações na Lei do Marco Temporal (Lei 14.701/2023), em uma mesa de conciliação instituída no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo ministro Gilmar Mendes. A parlamentar é coordenadora da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas no Congresso Nacional.
Ela foi substituída pela deputada bolsonarista Silvia Waiãpi (PL-AP), que não havia participado de nenhuma outra sessão da comissão especial do Supremo. Já Xakriabá esteve presente em 12 das 16 reuniões realizadas, tendo sido a parlamentar com maior registro de presença nas discussões do marco temporal no STF. Segundo nota da deputada psolista, a decisão da indicação de Waiãpi partiu do presidente da Câmara dos Deputados, o deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB).
“É uma forma de desrespeito que parlamentares que sequer participaram de nenhuma sessão, tentam agora dividir e enfraquecer nossa luta de maneira colonial, patriarcal e divisionista. O mesmo método usado na ditadura militar, quando se colocava indígenas para torturar outros indígenas, promovendo criminalização e dupla violência, se repete hoje, apenas com novas formas”, declarou Xakriabá ao se retirar da sessão.
O próprio site do STF informa que as propostas que serão submetidas à votação nas sessões desta segunda e, possivelmente, da terça (18), “foram apresentadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), pela deputada federal Célia Xakriabá (Psol), que representa a Câmara dos Deputados, e pelos seguintes partidos: Partido Democrático Trabalhista (PDT), Partido dos Trabalhadores (PT), Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido Verde (PV), Partido Socialismo e Liberdade (Psol), Partido Liberal (PL) e Partido Republicano (PR)”.
Em nota, a deputada Silvia Waiãpi afirmou que a colega “não foi impedida de sentar à mesa de conciliação”, e que Xakriabá segue designada como suplente na Comissão de Conciliação sobre o marco temporal na Suprema Corte. “A parlamentar desconhece que o acompanhamento remoto também é uma forma de estar presente. Essa modalidade da minha participação on-line não retira minha percepção sobre o assunto e a discussão”, afirmou a parlamentar, que disse ser uma deputada atuante na pauta indígena no Congresso Nacional.
A reportagem entrou em contato com as assessorias do ministro Gilmar Mendes e do deputado Hugo Motta para colher suas posições diante do ocorrido, mas não obteve retorno até o momento desta publicação. Tão logo receba, os posicionamentos serão inseridos no texto.
Conciliação ‘forçada e compulsória’
Gilmar Mendes é relator de cinco ações que questionam a constitucionalidade da Lei 14.701, aprovada pelo Congresso meses após o próprio STF declarar inconstitucional a tese do marco temporal, defendida pelos ruralistas, segundo a qual só podem ser demarcadas as terras indígenas que estivessem ocupadas por seus povos originários em outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.
Diante do impasse, o magistrado determinou a constituição da comissão especial, fortemente criticada pelos indígenas. Em agosto de 2024, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se retirou da comissão, por considerá-la uma tentativa de “conciliação forçada e compulsória”.
“Como dar seguimento a uma audiência de conciliação se os povos indígenas não aceitam a conciliação?”, questionou, à época, a representante da Apib, Eloisa Machado. “Para os povos indígenas, a decisão do STF não é uma folha de papel, mas é a conquista de muita luta”, destacou a indígena, em referência ao julgamento da tese do marco temporal em setembro de 2023, que a declarou inconstitucional.
Os indígenas criticam ainda o fato de o ministro Gilmar Mendes não haver suspendido os efeitos da lei, ainda que haja uma decisão do próprio STF em direção contrária. Caso haja um entendimento sobre as propostas apresentadas na reunião desta segunda, o acordo ainda precisará ser homologado pelo plenário do Supremo.