A Alemanha define neste domingo (23) quem será o novo líder do governo no país, em eleições marcadas pelo fortalecimento da extrema direita e o crescimento da esquerda radical na reta final da campanha.
O bloco conservador CDU/CSU lidera as pesquisas cerca de 30% das intenções de votos, tendo Friedrich Merz como candidato. E é seguido pelo partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD), com Alice Weidel, que soma cerca de 20% das intenções de voto. O partido de centro-esquerda SPD, do atual chanceler alemão, Olaf Scholz, está com 15% das intenções de voto.
A principal surpresa na reta final das eleições é o crescimento da esquerda radical. O partido Die Linke, que aparecia abaixo do limite de cinco por cento para voltar ao parlamento nas últimas semanas, registrou entre sete e nove por cento das intenções de voto nas últimas pesquisas. O aumento nas pesquisas foi impulsionado pelo discurso antifascista da candidata Heidi Reichinneek, de 36 anos, que viralizou entre o eleitorado jovem.
“Não desistam, lutem, resistam ao fascismo”, disse Reichinnek em discurso no parlamento contra a AfD e aqueles que cooperam com ela.“Para as barricadas!”, declarou ela, que tem uma imagem do ícone da esquerda revolucionária Rosa Luxemburgo tatuada em seu antebraço esquerdo. O discurso inflamado acumulou mais de 6,5 milhões de visualizações no TikTok.
Com o AfD, partido anti-imigração, registrando um recorde de 20% nas pesquisas antes da eleição de domingo, o Die Linke também se tornou um porta-estandarte na resistência contra a extrema direita. Fundado a partir das cinzas do partido comunista que governava a Alemanha Oriental, as brigas internas e uma deserção prejudicial o deixaram em uma situação de esquecimento político.
“Se agora o Die Linke cresce é porque realmente tinha esse potencial e finalmente conseguiu ser visto como uma partido que não só briga, mas também tem propostas. Elegeram uma nova direção há cerca de três meses e fizeram uma campanha muito interessante nas redes sociais, uma área onde a esquerda costuma ter mais dificuldades, onde a direita se coloca mais e conseguiram pautar os temas de esquerda”, aponta Andreas Behn, diretor da Fundação Rosa Luxemburgo em São Paulo.
O Die Linke é especialmente popular entre os eleitores jovens com sua promessa de lutar pela justiça social, taxar os ricos, reduzir os aluguéis crescentes to, combater a alta no preço dos alimentos e tornar o transporte público mais barato.
Behn aponta que a guinada para a direita na política alemã afetou o Partido Verde, que abandonou pautas progressistas e perdeu eleitorado entre os jovens. “Isso abriu espaço porque não havia mais uma representação para as pessoas de esquerda na Alemanha. Eles se fixaram em alguns temas clássicos de esquerda e conseguiram bastante apoio com essa campanha.”
Migração no centro do debate
A política de migração na Alemanha esteve no centro da discussão durante toda a campanha eleitoral. Líder nas pesquisas, Merz anunciou que implementará, em um eventual governo, projeto para restringir a imigração, apoiado pela AfD. As linhas gerais desse projeto foram discutidas no Parlamento alemão, por meio de uma moção que só foi aprovada com a participação da AfD. A aliança entre os conservadores e a extrema direita marcou o rompimento do “cordão sanitário” imposto pelos partidos alemães em relação à legenda de Alice Weidel.
Andreas Behn, diretor da Fundação Rosa Luxemburgo em São Paulo, avalia que o crescimento da AfD puxou o debate eleitoral para a direita ao colocar a pauta anti-imigração no centro da discussão. “Tivemos essa virada para a direita com uma política contra os migrantes, que virou o grande tema das eleições e quem estava puxando isso era a extrema direita. Eles estão fazendo o que fazem em muitos países, pautando o seu tema e os outros partidos mais ao centro correm atrás e estão propondo também com uma política anti-imgiração.”
No último debate eleitoral, realizado no domingo passado, o candidato da CDU – partido de Angela Merkel – afirmou que não trabalhará com a AfD em nenhuma hipótese. Ele disse que considera abrir diálogo com os Verdes e com o próprio SPD para formar uma coalizão sem depender da extrema direita.
Para Andreas Behn, apesar da promessa eleitoral, uma possível aliança entre a CDU e a AfD para formação de um governo representa o principal risco dessas eleições para a Alemanha.
“Está muito perigoso. O que vai acontecer agora na Alemanha, depois das eleições, se a CDU vai ou não se abrir mais para extrema direita. Essa é a grande questão. Agora o Merz está dizendo que não vai fazer uma coalizão com eles. Acredito que isso não vai acontecer, mas não sabemos se ele realmente não conseguir formar governo que se alastra, e isso se arrastar em uma crise que leva às vezes um ano sem formar governo, se ele realmente não vai formar algum tipo de governo com a extrema direita.”
Scholz afirmou que “jamais poderá haver colaboração com a AfD no Parlamento”. E garantiu que seu governo fará tudo o que estiver ao alcance para limitar a imigração irregular, fazendo um apelo em favor dos migrantes que atualmente vivem na Alemanha. “É importante proteger as pessoas na Alemanha que têm histórico de migração. Isso representa quase um terço da população e elas não devem ser discriminadas. Elas pertencem ao nosso país”, afirmou.
Esquiva nas respostas, Weidel afirmou que seu partido é “conservador liberal” e que a denominação extrema direita representa um “insulto”. “Vocês estão insultando milhões de eleitores. Isso não me afeta nem um pouco, eu represento esses eleitores”, defendeu.