Assim como os efeitos da crise climática vieram para ficar e tendem a ser cada vez mais severos até que, de fato, a humanidade tenha condições de responder à Casa Comum com conversão ecológica, ações de preservação e recomposição da natureza, as iniciativas de mobilização em socorro às vítimas desses efeitos – os refugiados climáticos – também precisam se dar de forma permanente.
Com esse raciocínio em mente, as organizações e movimentos de matriz social, popular e religiosos que integram a Missão Sementes de Solidariedade anunciam durante a 47ª Romaria da Terra, em Arroio do Meio (RS), a mudança do caráter de suas ações de “emergenciais” para “permanentes”.

Segundo Frei Sérgio Görgen, diretor do Instituto Cultural Padre Josimo (ICPJ), o momento é oportuno para o anúncio, uma vez que a Romaria acontece em um dos territórios atingidos com maior severidade e, ainda, traz em seu tema uma reflexão que vem ao encontro da proposta da Missão Sementes de Solidariedade: “Reconstruir e cuidar da Casa Comum com fé, esperança e solidariedade”.
“A semente como matéria e como símbolo é a base da vida. A solidariedade é a base da convivência humana. Como as mudanças climáticas vieram para ficar, precisaremos ter muita capacidade de resistência e resiliência. A Missão Sementes da Solidariedade precisará ser um processo social e ambiental permanente”, reflete Görgen.

Cresce o alcance das ações
A ação coletiva multi institucional que tem atuado nos territórios atingidos junto aos agricultores de matriz familiar e camponesa, por meio de atividades de solidariedade ativa e organização social, celebra resultados positivos, crescimento do número de aliados e aumento do alinhamento do público beneficiado com as ações propostas.

Outro ponto destacado é o crescente interesse de voluntários que se deslocam de diferentes regiões e até mesmo de outros estados para participar das atividades, firmando disposição de colocar o pé na estrada desde o momento imediato após o recuo das águas e a desobstrução das estradas até as ações mais recentes.
“Através das sementes que compartilhamos com as famílias, estamos compartilhando também palavras de incentivo para que continuem empreendendo a sua missão pessoal de produzir alimentos. São sementes de esperança, de força e de organização para os desafios que se colocam à nossa frente enquanto classe trabalhadora rural camponesa e familiar”, aponta Gerson Borges, do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).
O que era “emergencial” passou a ser “permanente”
Para Jacira Ruiz, secretária geral da Cáritas RS, a resposta ao chamado das organizações que compuseram o primeiro coletivo da Missão Sementes de Solidariedade, ainda em setembro de 2023, já indicava que a ação teria uma jornada além dos objetivos iniciais propostos. “A campanha Missão Sementes de Solidariedade em resposta às enchentes que atingiram severamente o Vale do Taquari em 2023, iniciou como gesto concreto de aproximação e oferta de sementes e mudas para as famílias de pequenos agricultores retomarem a plantação de alimentos.”
No entanto, o que começou como uma campanha com início, meio e fim, com os eventos ainda mais severos de 2024 nos indicou a importância de prosseguir de forma permanente contribuindo para que as comunidades se organizem para lutar por condições de vida favoráveis para enfrentar os problemas climáticos e para que o acesso aos direitos de agricultores atingidos pelos desastres se concretizem.”

Na primeira jornada, em 2023, foram oito organizações envolvidas, em torno de 85 pessoas mobilizadas no trabalho voluntário, com pouco mais de R$ 223 mil arrecadados e 8 toneladas de sementes compartilhadas, entre outros itens. Na ação mais recente, desenvolvida a partir de maio de 2024, o desafio foi maior em todos os sentidos: área de abrangência, número de pessoas atingidas e gravidade.

Mesmo tendo mobilizado 23 organizações, com mais de 200 voluntários e voluntárias contribuindo nos trabalhos, arrecadando mais de R$ 1,3 milhão e viabilizando a distribuição de mais de 85 toneladas de sementes, entre outros itens, ficou a sensação de que era preciso ter sido feito mais. “Desse modo a campanha Missão Sementes de Solidariedade está se tornando um movimento mais permanente, aglutinando pessoas, organizações, pastorais e movimentos sociais”, aponta Jacira.
Quem faz parte da missão
Além da Cáritas, Instituto Cultural Padre Josimo, Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Missão conta ainda com a participação de organizações, movimentos e cooperativas como: Movimento dos Atingidos e das Atingidas por Barragens (MAB), Diocese de Santa Cruz do Sul, Rede de Agroecologia Ecovida, Articulação pela Economia de Francisco e Clara, Gritos dos Excluídos, Instituto Conhecimento Liberta (ICL), Instituto Koinós, Freis Franciscanos (Serviço Justiça Paz e Integridade da Criação), Serviço Franciscano de Solidariedade (Sefras), Sindicato dos Petroleiros (Sindipetro-RS), Canoas Tec, Movimento dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Sem Teto (MTST), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Eletrobras. Também fazem parte da missão as cooperativas Certel, Cooperbio, Origem Camponesa, Coptil e Creluz.

Maurício Queiroz, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), aponta que mais uma vez são os menores, os mais pobres que são os mais atingidos: “Faz tempo que estamos sentindo os efeitos dos maus tratos ao meio ambiente, amplamente alertados por lideranças sociais, cientistas e pelo Papa Francisco na Laudato Si, que nos convoca a cuidarmos da nossa Casa Comum. Eventos extremos têm sido frequentes como temporais, secas e grandes inundações. Embora atinja todos e todas, são os mais pobres que pagam o maior preço, pois vivem na maioria das vezes em locais de risco permanente por não terem alternativas”.
Queiroz chama atenção ainda para que com a opção de seguir em estado de mobilização permanente, as ações de arrecadação de fundos e de doações seguirão abertas. Doações podem ser encaminhadas para o PIX da Cáritas, com a chave: 33654419.0010-07 (CNPJ). Outra possibilidade de colaboração se dá por meio de depósito bancário para a Conta Corrente: 55.450-2 / Agência 1248-3 (Banco do Brasil). Os recursos financeiros seguem sendo diretamente administrados pelo escritório regional da Cáritas no Rio Grande do Sul e sendo objeto de prestações de contas continuadas. Doações de sementes, insumos e outros itens podem ser encaminhadas através das organizações que participam da Missão.
Mobilização decisiva para programa habitacional

As ações da Missão Sementes de Solidariedade contribuíram de forma decisiva para a conquista de um programa habitacional novo, operado pelo governo federal, e que já garantiu a construção de 600 casas para atingidos pelas chuvas de setembro de 2023. O programa Minha Casa Minha Vida – Rural, modalidade Calamidades, foi uma conquista alcançada pelas cooperativas do MPA e da Fetag e teve participação dos mobilizadores da Missão Sementes de Solidariedade.
Quase 6 mil kits de sementes, mudas e ramas distribuídos

Ampliação de alianças garante mais atividades

11 mil cartilhas foram produzidas e compartilhadas

A solidariedade não reconhece limites nem fronteiras

Plantio de árvores foi amplamente incentivado em todas as atividades

Jornal impresso

Esta reportagem faz parte de edição especial impressa do jornal Brasil de Fato RS sobre a Romaria da Terra. Clique aqui para baixar a edição na íntegra.
