Nos últimos 12 milênios, a humanidade se relacionou horizontalmente com a natureza para obter suas fontes de existência e reprodução social, possibilitando, de modo geral, o equilíbrio entre a extração e a regeneração dos ecossistemas.
Com o advento da Revolução Industrial e a ascensão do modo capitalista de produção, principalmente a partir do século XVIII, a produção de mercadorias, o consumo e o lucro foram transformados no motor desse sistema, determinando a exploração da vida humana (força de trabalho) e da natureza.
A exploração dos seres humanos resultou em alienação, guerras, miséria e fome. Em relação à exploração e destruição da natureza (derrubada e queima das florestas; uso intensivo de adubos químicos e agrotóxicos; poluição causada por meios de transporte, indústrias e fábricas), houve a emissão de grandes quantidades de Gases de Efeito Estufa (GEE).
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O excesso de GEE tem provocado o aquecimento do planeta Terra, resultando em alterações na temperatura média e no clima. Essa condição tem causado o derretimento das geleiras (nos polos Norte e Sul), o aquecimento, a elevação e a acidificação dos oceanos, secas prolongadas, temperaturas elevadas por longos períodos, frio extremo, chuvas intensas, enchentes, deslizamentos, entre outros desastres. Essa nova realidade se expressa na crise ambiental e climática, sinalizando um possível colapso socioambiental.
A humanidade, especialmente os mais pobres, em todos os continentes, junto com a natureza, está sofrendo com esses impactos. Nos vales dos rios Pardo e Taquari, no Rio Grande do Sul, após as enchentes de 2023/2024, milhares de famílias foram afetadas, resultando na perda de familiares, animais, produção, casas e galpões.
Nos territórios acompanhados pela Missão Sementes de Solidariedade, observa-se, entre diversos fatores, a situação dos refugiados climáticos: famílias que perderam seu território de vida e reprodução social devido às inundações e deslizamentos.
Emanuel, um dos atingidos, recorda: “Perdemos animais, produção e, o mais sagrado, nosso território de vida! O rio que antes era amigo agora não é mais confiável; ele tomou parte da nossa terra e da nossa vida… Agora, não temos mais onde morar e produzir alimentos”.
Nas atividades da Missão, foram encontrados muitos “Emanuéis”, desterritorializados, refugiados climáticos. Entre os relatos, frases como “perdemos nossa casa; perdemos nossos animais; perdemos nossa terra; perdemos nosso território; não temos mais onde morar” foram constantes. No entanto, uma fala esteve sempre presente:
“Perdemos tudo isso, mas não perdemos a fé e a esperança”.
Como a semente que brota, a vontade coletiva e organizada é de se reerguer, cuidando da vida, das pessoas e do planeta.
* Gerson Borges é mestre em Desenvolvimento Territorial na América Latina e Caribe e doutorando em Geografia
** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
Jornal impresso
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Esta reportagem faz parte de edição especial impressa do jornal Brasil de Fato RS sobre a Romaria da Terra. Clique aqui para baixar a edição na íntegra.
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