“O povo latino-americano quer construir sua própria pátria, não ser o quintal de outros; os países latino-americanos esperam independência, não a Doutrina Monroe”, disse o ministro das Relações Exteriores, Wang Yi. A fala ocorreu na coletiva tradicional de sua pasta durante as Duas Sessões, que é realizada desde 2014. As Duas Sessões são as reuniões do Congresso Nacional do Povo (CNP) da República Popular da China e a Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPC), realizadas anualmente desde 1959, e que determinam o rumo das políticas para o resto do ano.
“A cooperação entre China e América Latina é uma relação Sul-Sul, não tem cálculos geopolíticos”, disse o chanceler no Centro de Mídia, do Grupo de Mídia da China.
A Doutrina Monroe parte de uma declaração do presidente dos EUA em 1823 que pregava a não interferência europeia no continente americano. A partir de então tem sido invocada pelos EUA para justificar sua ingerência e intervenções em países latino-americanos. No primeiro governo Trump, seu Conselheiro de Segurança Nacional John Bolton disse que a Doutrina Monroe estava “viva e bem”, ao anunciar restrições de remessas para Cuba.
Em janeiro, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, publicou um artigo no Wall Street Journal, em tom com a Doutrina Monroe. Nele, afirmou que administrações anteriores ignoraram a América Latina e “buscaram políticas que aceleraram o desenvolvimento econômico da China, muitas vezes às custas de nossos vizinhos”. “As ameaças que o Sr. Trump foi eleito para impedir são ameaças às nações do nosso hemisfério também” disse Rubio na publicação.
Por sua vez, Wang Yi afirmou que “ao lidar com países latino-americanos, a China sempre adere aos princípios de igualdade, benefício mútuo e resultados ganha-ganha, nunca busca esferas de influência e nunca tem como alvo nenhuma parte”.
Este ano o Fórum China-América Latina completa uma década. O chanceler chinês anunciou que a China vai sediar a quarta reunião ministerial do fórum na China no primeiro semestre.
Defesa do Estado da Palestina
Ao ser questionado pelos anúncios de Trump em relação a Gaza, Wang Yi reiterou a postura do governo chinês de que “Gaza pertence ao povo palestino e é parte integrante do território palestino”.
Forçar uma mudança do status de Gaza não trará paz, e “apenas desencadeará mais turbulência”. O chanceler disse que o governo chinês apoia o Plano de Restauração da Paz de Gaza, apresentado por Egito e países árabes.
“Se as grandes potências realmente se importam com o povo de Gaza, elas devem promover um cessar-fogo abrangente e duradouro em Gaza, aumentar a assistência humanitária, aderir ao princípio de ‘palestinos governando a Palestina’ e contribuir para a reconstrução de Gaza”.
Para Wang Yi, o conflito recorrente entre Palestina e Israel se deve ao fato de que a “solução de dois Estados” só foi realizada pela metade. “O Estado de Israel foi estabelecido há muito tempo, enquanto o Estado da Palestina ainda está muito fora do alcance”.
“EUA primeiro”
Esta semana, o Ministério de Relações Exteriores da China enviou uma mensagem aos EUA nas redes sociais ocidentais em resposta à suposta causa que os EUA colocam como motivo para as sanções que implementam contra a China: o fentanil. O governo chinês subiu o tom com os estadunidenses: “Se é guerra que os EUA querem, seja uma guerra tarifária, uma guerra comercial ou qualquer outro tipo de guerra, estamos prontos para lutar até o fim”, expressou a chancelaria.
Na mesma postagem, afirmaram que o fentanil “é uma desculpa esfarrapada para aumentar as tarifas dos EUA sobre as importações chinesas”. Na coletiva desta sexta, Wang Yi falou sobre o assunto, afirmando que o “abuso de fentanil nos Estados Unidos é um problema que os próprios Estados Unidos devem enfrentar e resolver”. Ele explicou que em 2019, a China, a pedido dos EUA, em 2019, se tornou o primeiro país no mundo a listar todas as substâncias semelhantes ao fentanil.
Consultado sobre a linha de Estados Unidos primeiro (“America first”), propagandeada pela nova gestão Trump, Wang Yi a criticou. “Existem mais de 190 países no mundo. Imagine se cada país enfatizasse sua própria prioridade nacional (…) o mundo regrediria à lei da selva, países pequenos e fracos suportariam o peso, e as regras e a ordem internacionais seriam severamente impactadas”.
“Se eles [EUA ]decidirem cooperar, benefícios mútuos e resultados positivos para todos serão alcançados; se eles continuarem a exercer pressão, a China contra-atacará resolutamente”, concluiu Wang Yi.