A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por unanimidade, condenou o Estado brasileiro por omissão e falhas na investigação do caso de Almir Muniz, agricultor que foi executado e desaparecido em 2002, na cidade de Itambé (PE), na divisa com a Paraíba. A sentença, divulgada nessa terça-feira (11), é histórica e reconhece a impunidade que prevaleceu por mais de duas décadas, além de determinar uma série de reparações à família de Almir e à comunidade.
Almir Muniz era um trabalhador rural e defensor dos direitos pela terra. Ele denunciou, em 2001, durante uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembleia Legislativa da Paraíba, a existência de uma milícia formada por policiais envolvidos em crimes contra agricultores na região. Um ano após a denúncia, ele foi executado e seu corpo nunca foi encontrado.
Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), apenas em 2024, foram registrados 78 assassinatos em conflitos no campo, muitos deles envolvendo pistoleiros, milícias e até agentes do Estado.
A Justiça brasileira arquivou o caso em 2009, sem punir os responsáveis, o que levou a família de Almir e organizações de direitos humanos, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a buscar justiça no sistema internacional. Após anos de batalha legal, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) concluiu que o Brasil falhou em proteger o agricultor, investigar o crime de forma adequada e garantir justiça à família.
Reparações determinadas pela Corte
A sentença da CIDH determina que o Brasil cumpra uma série de medidas reparatórias, incluindo:
- Retomar as buscas pelo corpo de Almir Muniz: a família e a comunidade têm o direito de saber a verdade e de realizar um enterro digno.
- Oferecer reparações à família: isso inclui indenizações financeiras e apoio psicológico para lidar com o trauma causado pelo desaparecimento.
- Fazer um pedido público de desculpas: o Estado deve reconhecer publicamente sua responsabilidade no caso.
- Criar uma lei específica sobre desaparecimento forçado: a ausência de uma legislação robusta no Brasil tem permitido a impunidade em casos semelhantes.
- Reformular o programa de proteção a defensores de direitos humanos: a falta de proteção adequada para pessoas como Almir, que denunciam crimes e abusos, é um problema grave que precisa ser enfrentado.
- Pagar indenização à família de Almir Muniz: como forma de reparação pelos danos morais e materiais causados
Assista aqui ao julgamento do caso do desaparecimento forçado do defensor de direitos humanos Almir Muniz.
Impunidade e violência no campo
O caso de Almir Muniz não é isolado. Ele reflete um padrão de violência e impunidade que afeta trabalhadores rurais e defensores de direitos humanos no Brasil, especialmente em regiões de conflito agrário. João Muniz, primo de Almir e agente pastoral da CPT, aponta que a condenação do Brasil pela CIDH é um alerta sobre a necessidade de combater a impunidade e garantir justiça para vítimas de violência no campo.
“A condenação do Estado brasileiro pela Corte Interamericana é importante para nós porque Almir desapareceu há mais de 23 anos, e seu corpo nunca foi encontrado. Quem fez isso foi um agente do Estado, e não se fez justiça. Agora, o Estado é condenado a reparar os danos causados à família, à comunidade e à luta pela terra. Essa decisão vai fazer com que se crie uma lei que reconheça o desaparecimento forçado. Isso é muito importante para evitar que casos como esse se repitam. Viva a luta de Almir Muniz.”

A condenação do Brasil pela CIDH ocorre em um momento em que o país enfrenta críticas internacionais sobre o aumento da violência no campo e a falta de proteção a defensores de direitos humanos. Organizações como a Anistia Internacional e a Organização das Nações Unidas (ONU) têm alertado para a necessidade de o governo brasileiro adotar medidas concretas para garantir a segurança de ativistas e líderes comunitários.
Impacto internacional e pressão por mudanças
O Tribunal reconheceu o impacto devastador do desaparecimento forçado sobre os familiares da vítima, que enfrentaram ausência de respostas, sofrimento psicológico e dificuldades socioeconômicas.
Para os juízes da denúncia apresentada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), Dignitatis e Justiça Global, o desaparecimento forçado de Silva ocorreu “em um contexto no qual milícias e grupos armados atuavam no estado da Paraíba, contando com a participação de policiais e militares, que praticavam atos de violência contra os trabalhadores rurais” da região.
Em comunicado à imprensa, a Corte IDH destaca que, antes de desaparecer, Silva denunciou ter sido ameaçado mais de uma vez, principalmente por um policial civil, que o trabalhador rural identificava como “o principal responsável pela violência contra os trabalhadores da região”.
A sentença também pressiona o Congresso Nacional a aprovar uma lei específica sobre desaparecimento forçado, algo que já foi recomendado por organismos internacionais há anos. Além disso, o caso reforça a urgência de reformular o programa de proteção a defensores de direitos humanos, que atualmente é considerado insuficiente por especialistas.
::Corte Interamericana condena Brasil por omissão em caso de execução de agricultor na Paraíba
Em fevereiro de 2025, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Estado brasileiro por falhas na investigação e na apuração do assassinato de Manoel Luiz da Silva, agricultor executado a tiros em 19 de maio de 1997, em São Miguel de Taipu, na Paraíba. A decisão, divulgada nessa terça-feira (11), responsabiliza o Brasil pela impunidade do caso, que também permaneceu sem solução por mais de duas décadas.
Leia a sentença da Corte Interamericana sobre o caso de desaparecimento do agricultor Almir Muniz aqui.