Em cerimônia no Palácio do Planalto, nesta quarta-feira (12), o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), assinou a Medida Provisória que cria a linha do consignado “Crédito do Trabalhador”, voltado para trabalhadores do setor privado. Com isso, os celetistas e profissionais liberais poderão usar a Carteira de Trabalho Digital (CTPS Digital) para acessar empréstimos mais baratos, dando como garantia parte do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Por meio do aplicativo da CTPS Digital, o trabalhador terá a opção de requerer proposta de crédito diretamente com instituições financeiras habilitadas pelo governo federal. Para isso, o profissional precisa autorizar o acesso a dados pessoais e trabalhistas, em respeito à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
A partir daí, recebe ofertas em até 24 horas, analisa a melhor opção e faz a contratação no canal de uma das mais de 80 instituições financeiras que já operam junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). As parcelas serão descontadas diretamente na folha de salários, mensalmente pelo eSocial, observado o limite de 35% do salário.
Segundo o governo federal, o país tem hoje 47 milhões de trabalhadores formais que poderão ter acesso ao crédito, incluindo 2,2 milhões de domésticos, 4 milhões de trabalhadores rurais, além de microempreendedores individuais (MEls). As taxas de juros de crédito devem cair de cerca de 103% ao ano para 40% ao ano.
De acordo com dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a estimativa é que, em até quatro anos, cerca de 19 milhões de celetistas optem pela consignação dos salários, o que pode representar mais de R$ 120 bilhões em empréstimos contratados.
Pelo novo sistema, o trabalhador pode usar como garantia até 10% do saldo no FGTS e 100% da multa rescisória em caso de demissão.
Durante o anúncio, Lula celebrou a medida. “É um programa que vai beneficiar mais de 40 milhões de pessoas. É um programa que pode tirar muita gente do sufoco em que está hoje. E é um programa que é um aprendizado para a gente aprender a fazer outros programas”, disse o presidente. “Pouco dinheiro na mão de muitos significa distribuição de renda, distribuição de riqueza e participação do conjunto da sociedade no desenvolvimento do país. Não há nada mais milagroso para uma economia do que o dinheiro circular na mão de todos”, destacou.
O sistema entrará em operação pelos bancos oficiais e privados a partir de 21 de março. Quem já tem o consignado ativo vai poder migrar para a nova linha a partir de 25 de abril, e a portabilidade entre os bancos poderá ser realizada a partir de 6 de junho.
A legislação que trata do consignado já permite que trabalhadores com carteira assinada tenham acesso a esse tipo de empréstimo, descontado do salário. Porém, essa modalidade de crédito requer a assinatura de convênios entre empresas e bancos, o que, na prática, dificulta a adesão de pequenas e médias empresas, e muitas grandes empresas também, ao modelo em larga escala. Além disso, trabalhadores rurais, domésticos e empregados de MEIs, hoje estão excluídos da consignação privada.
Lula defendeu que o consumo seja um balizador para o desenvolvimento econômico. “Eu não conheço ainda no planeta Terra, em nenhum país do mundo, nenhum empresário que resolveu fazer investimento de uma indústria numa cidade ou num estado se não tiver feito uma pesquisa de consumo para o seu produto. Se ele perceber que não tem consumo, ele não vai investir o dinheiro. Então é importante que a gente lembre o papel do consumo”, declarou o presidente, ponderando a necessidade de planejamento para evitar o endividamento.
Lula explicou que a expectativa é que o crédito reduza o superendividamento oferecendo uma linha de crédito mais atraente para migrar dívidas com maior custo. “Não é para a gente convocar o povo a gastar o que não tem. É importante que vocês saibam que o empréstimo é muito bom quando a gente pega o empréstimo para utilizar numa coisa que vai aumentar o nosso patrimônio. A gente não pode ficar habituado a pegar o empréstimo para pagar outro empréstimo, pegar mais um empréstimo para pagar outro empréstimo. A gente não vai melhorar a vida da gente assim. A gente tem que fazer um empréstimo para comprar alguma coisa que melhore a nossa vida”, afirmou Lula.
Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, destacou o aumento em 10% do crédito em 2024, resultado de outras iniciativas do governo federal. Ele celebrou o anúncio do Crédito do Trabalhador e ressaltou que é resultado de uma articulação com o Ministério do Trabalho e com as centrais sindicais.
“Com o crédito você democratiza a oportunidade. A pessoa que nasce sem riqueza, e nós estamos falando de milhões de brasileiros que não nascem donos de ação, não nascem donos de patrimônio imobiliário, não nascem donos, às vezes, nem de um automóvel, e com o pouco que têm, têm que se virar”, destacou o ministro, que pediu um esforço para ampliar a divulgação das informações sobre o programa.
“Nós vamos pedir encarecidamente para a imprensa, para o trabalhador, tenham muita cautela com esse programa, porque é um programa que vai ser desenvolvido ao longo das semanas e meses próximos, é um programa muito sofisticado. As pessoas podem mudar de emprego, a empresa pode quebrar, a empresa pode entrar em recuperação judicial… É uma situação equivalente a do servidor público ou do aposentado no INSS. Você tem a garantia do pagamento”, afirmou.
O crédito terá portabilidade entre empregos, ou seja, se o trabalhador mudar de emprego, a dívida será transferida para a folha de pagamento do próximo empregador.
Tanto Haddad como Lula convocaram as centrais sindicais presentes a ir “às portas das fábricas” informar os trabalhadores sobre o Crédito do Trabalhador. “Sindicalistas, agora é porta de fábrica e porta de loja para falar do programa para as pessoas poderem diminuir as suas dívidas”, disse Lula.
Lula exalta Haddad e comete gafe envolvendo Gleisi
O presidente da República se dirigiu à imprensa e ao mercado para fazer uma deferência a Haddad. “Eu queria falar isso porque eu tenho a felicidade de ter um companheiro como ministro da fazenda”, declarou Lula. “Eu já tive muitos ministros, muitos companheiros na Fazenda. Mas pode ter certeza, se vocês colaborarem, a gente vai terminar o nosso governo com o Haddad passando para a história como o melhor ministro da Fazenda que esse país já teve”, continuou.

“Eu fico pensando se as pessoas têm noção de que o companheiro Haddad já nos patrocinou como ministro da Fazenda desse país em dois anos. Eu estava listando para trazer aqui. Nesses dois anos, sem contar o programa Acredita, sem contar outros programas, nós já fizemos 24 ações só para tratar de economia. E que todas elas ainda não estão totalmente funcionando, porque mudança na política econômica leva um tempo, leva um tempo os bancos se adequarem, verem como é que vão agir para fazer funcionar, leva um tempo para que as pessoas que vão precisar desse serviço aprendam a utilizar. Mas são 24 coisas extremamente importantes” afirmou o chefe do Executivo, destacando ainda o papel do ministro no governo de transição.
Lula brincou com a suposta falta de carisma do ministro da Fazenda e citou a ex-presidenta Dilma Rousseff. “Eu falo para o Haddad: ‘Você tem que passar um pouco de charme. Eu falava para a Dilma, deixa cair uma lágrima, pelo menos. Você fica emocionada, deixa cair uma lágrima, não segura. Porque chorar não é um gesto de covardia, é um gesto de emoção que nem todo mundo consegue ter. Só as pessoas que têm dignidade, caráter, é que pode chorar’”, disse o presidente.
Outra “brincadeira” feita por Lula envolveu a ministra-chefe da Secretaria das Relações Internacionais (SRI) Gleisi Hoffmann. “Eu quero mudar, restabelecer a relação com vocês [Congresso]. Por isso eu coloquei essa mulher bonita para ser ministra das Relações Institucionais. É que eu não quero mais ter distância entre vocês”, disse Lula aos presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado Federal, Davi Alcolumbre (União-AP), sobre Gleisi.
A ministra alvo da gafe do presidente foi indicada por ele ao cargo cujo objetivo é melhorar a articulação política do Palácio do Planalto com o Legislativo e que era anteriormente ocupado por Alexandre Padilha, conduzido para o Ministério da Saúde, no lugar de Nísia Trindade.
“Eu não quero que alguém ache que a Presidência da República está distante do presidente da Câmara, está distante do presidente do Senado. Não, nós temos que mostrar para a sociedade que nós somos, em lugares diferentes, pessoas com o mesmo compromisso de defender a soberania desse país, o bem-estar do povo brasileiro, e melhorar a vida de todo mundo”, completou o presidente.
*Com informações da Agência Brasil