Na manhã desta quinta-feira (13), cerca de mil mulheres do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocuparam uma área da empresa Suzano Papel e Celulose na cidade de Aracruz, no Espírito Santo.
A ação visa denunciar o impacto ambiental causado pela monocultura de eucalipto da maior produtora de celulose do mundo e é parte da já tradicional jornada de luta que as mulheres do movimento fazem no mês de março. Neste ano o lema é “Agronegócio é violência e crime ambiental, a luta das mulheres é contra o Capital”.
As militantes afirmam não ter previsão para se retirar da ocupação e demandam que a Suzano, em conjunto com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), cumpra um acordo firmado em 2011, na qual se comprometeu a destinar 22 áreas sob sua posse para a reforma agrária.

O sol tinha acabado de raiar quando as camponesas bloquearam, com fogo em pneus, parte da rodovia ES-445 e abriram a faixa com a frase “Eucalipto não faz floresta, não enche o prato”. Vestindo bonés do MST e panos de chita, as mulheres entraram no terreno, que fica a 11 quilômetros da planta fabril.
Por volta das 6h, agentes de segurança privada da empresa Souza Lima chegaram na área. Até o momento, não houve abordagem da Polícia Militar.
“O Espírito Santo vive um momento muito difícil de expansão do monocultivo de eucalipto que existe aqui desde a década de 1960”, contextualiza uma porta-voz do MST no Espírito Santo, se referindo à instalação da Aracruz Celulose, a Fibria e, agora, a Suzano.
“Esta empresa tem sido o motivo da retirada, de forma violenta, dos companheiros quilombolas que estão nos municípios de Pedro Canário e Conceição da Barra”, conta a representante. “E nessa região estão os parentes indígenas, logo ao lado começam as aldeias Tupiniquim e Guarani. E temos nós, os pequenos agricultores e os sem-terra, que há 40 anos lutamos pela sobrevivência”, diz.
“Esta empresa é quem tem envenenado nossas terras, mudado o curso dos rios, contaminado nossas águas e matado o nosso povo. Portanto, a nossa luta é muito importante”, pontua.

Embate histórico
A disputa entre a maior produtora mundial de celulose e o movimento popular é antiga. Entre fevereiro e abril de 2023, o MST ocupou três áreas da Suzano no extremo sul baiano e outro no Espírito Santo, também no município de Aracruz.
As ocupações na Bahia duraram oito dias com 1.500 trabalhadores rurais e, no estado capixaba, 12 dias com 200 camponeses. Todas foram desfeitas após decisão judicial pela reintegração de posse, mas mediante a criação de um grupo de trabalho com representantes do movimento, da empresa e do Ministério do Desenvolvimento Agrário para solucionar o conflito.
De lá para cá, no entanto, não houve nenhuma família assentada em qualquer dos 2,7 milhões de hectares usados pela Suzano no país. No cálculo do movimento, seria possível assentar 100 mil famílias neste montante de terra. É essa a quantidade que, ligada ao MST, vive atualmente em acampamentos pelo país.
O compromisso que o MST pressiona que se cumpra foi firmado há 14 anos, como resultado de denúncias sobre os danos causados pela monocultura de eucalipto na região. Estes, segundo o movimento, só aumentaram neste período.
O Brasil de Fato pediu um posicionamento da Suzano, mas não teve resposta até o fechamento da matéria. O texto será atualizado caso haja retorno.
Deserto verde
Entre o norte do Espírito Santo e o extremo sul da Bahia, grande parte das terras agricultáveis estão há cerca de 30 anos sob domínio de grandes papeleiras. Quase todas incorporadas, a partir de 2018, pela Suzano. Em 2024, a receita líquida da empresa chegou a R$ 47,4 bilhões.
A produção de eucalipto em larga escala é feita com uso de agrotóxicos – inclusive por pulverização aérea – e, de acordo com o MST, está causando uma crise hídrica nos municípios da região.
“À medida que nossos mananciais de água são mercantilizados, envenenados com uso de agrotóxico, que nossas florestas estão sendo destruídas para a expansão da monocultura, este modelo do agronegócio violenta diretamente o conjunto da sociedade”, afirma a direção nacional do MST.
“Qual é o modelo de agricultura que a sociedade quer? Qual é a alimentação que a sociedade quer? O que a sociedade quer para os nossos recursos e bens naturais? Um meio ambiente protegido é o que garante a existência dessa geração e de outras. O agronegócio só vê o meio ambiente como lucro. A nossa água, as nossas terras, as nossas árvores, as nossas florestas. Precisamos convocar a sociedade para esse debate e para esse enfrentamento”, defende.
No manifesto da jornada, as mulheres sem-terra apresentam suas ações como “uma forma de enfrentamento coletivo contra os mandos e desmandos do agro-hidro-mínero-negócio” e de exigem “que esse modelo seja responsabilizado por seus crimes contra a humanidade e contra o meio ambiente”. Defendem, ainda, a “reforma agrária popular” como “alternativa viável a esse modelo destruidor”.