O Brasil pode dar um passo importante na modernização do tratamento de queimaduras graves pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Ministério da Saúde abriu uma consulta pública para avaliar a incorporação do transplante de membrana amniótica como curativo biológico no tratamento de pacientes queimados. O prazo para participação popular vai até o dia 2 de abril.
A membrana amniótica é um material descartado após partos por cesariana e tem propriedades regenerativas, reduzindo dores, infecções e acelerando a cicatrização de queimaduras. O Brasil é um dos poucos países da América Latina que ainda não utiliza essa técnica, já adotada com sucesso em países como Argentina, Chile e Uruguai.

A consulta pública foi aberta pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), órgão responsável por avaliar novas tecnologias para o sistema de saúde pública. Em dezembro de 2024, a Conitec emitiu parecer favorável ao procedimento, encaminhando a decisão para a consulta popular. Qualquer pessoa pode contribuir acessando o site Participa+Brasil e preenchendo os campos específicos para opiniões e sugestões.
Redução de custos e impacto na saúde pública
Especialistas apontam que a adoção da membrana amniótica no SUS traria um grande impacto na qualidade do atendimento e na economia dos recursos públicos. O Brasil trata cerca de 100 mil pacientes com queimaduras graves por ano, e os curativos sintéticos atualmente utilizados custam cerca de R$ 50 por centímetro quadrado. Já a membrana amniótica teria um custo estimado de apenas R$ 0,10 por centímetro quadrado, reduzindo drasticamente as despesas hospitalares.
“Esse material, que hoje é descartado após cesarianas, pode revolucionar o tratamento de queimaduras, acelerando a recuperação e reduzindo o tempo de internação. Mas há interesses da indústria farmacêutica que dificultam essa regulamentação”, alerta Marcos Fuhr, presidente da Fundação Ecarta e um dos principais mobilizadores do movimento pelo uso da membrana amniótica no país.
Membrana amniótica já foi utilizada em tragédias

O uso da membrana amniótica como curativo biológico não é novidade. Durante a tragédia da Boate Kiss, em 2013, quando centenas de vítimas sofreram queimaduras graves, a técnica foi usada de forma emergencial com membranas doadas por países vizinhos, como Uruguai, Argentina e Chile. O resultado foi positivo, reforçando a eficácia do método.
Além disso, atualmente, há apenas quatro bancos de tecidos no país, que conseguem suprir menos de 10% das necessidades de curativos para lesões graves. O material utilizado nesses casos vem exclusivamente da doação de tecidos humanos provenientes de óbito cardiorrespiratório ou morte encefálica. Com a regulamentação da membrana amniótica, o Brasil poderia atender a 100% da demanda de curativos para queimaduras graves.
Enquanto o centímetro quadrado do curativo sintético fornecido hoje pela indústria farmacêutica custa R$ 50, o de membrana amniótica custaria apenas R$ 0,10. Como os pacientes queimados precisam de dezenas de centímetros de curativos diariamente, os custos para o SUS são altíssimos. As unidades de tratamento de queimados estão entre as mais onerosas dos hospitais, devido à complexidade do tratamento.
“Há interesses da indústria farmacêutica em impedir o uso da membrana amniótica. Essa regulamentação fará muito bem para a saúde de milhares de pacientes e para a redução de custos no SUS”, completa Fuhr. Em diferentes correspondências à Conitec, a Fundação Ecarta, em nome do movimento pelo uso da membrana amniótica, enviou fartos subsídios técnicos que comprovam a eficácia desses procedimentos em inúmeros países.
A população tem até o dia 2 de abril para participar da consulta e ajudar a mudar o cenário do tratamento de queimaduras no SUS. A decisão final será baseada na avaliação da Conitec e nas contribuições enviadas pela sociedade.
