A secretária-executiva do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Fernanda Machiaveli, afirmou nesta quinta-feira (20) que, em 2025, “pela primeira vez” haverá uma “reversão desse ciclo da redução das áreas plantadas de arroz e feijão” graças à ampliação da área plantada. A declaração ocorreu durante a festa da colheita do arroz agroecológico do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em Viamão (RS).
“Está ampliando a área plantada de arroz, ampliou em muito a área plantada de feijão e, com isso, a gente vai ter uma colheita de produtos básicos da nossa alimentação de novo. É a agricultura familiar que volta a ter apoio para produzir alimentos e alimentos agroecológicos, isso é o que dá mais alegria”, disse Machiaveli.
Na primeira quinzena de março, a Conab atualizou as projeções relacionadas à produção de grãos na safra 2024/25, estimada em 328,3 milhões de toneladas, um aumento de 10,3% se comparado ao volume obtido no ciclo anterior, segundo a companhia. Esse aumento também é refletido na área plantada, estimada em 81,6 milhões de hectares.
No entanto, os principais produtos seguem sendo as commodities para exportação. O principal produto cultivado continua sendo a soja com uma projeção de 167,4 milhões de toneladas, 13,3% superior à safra passada. Em seguida vem o milho, cuja estimativa de produção é de 122,8 milhões de toneladas, e aumento da área plantada de 1,9%, chegando a aproximadamente 16,75 milhões de hectares. O órgão também estima um aumento na área plantada de algodão, sobretudo na região do Matopiba, que compreende os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, totalizando cerca de 2 milhões de hectares e uma colheita de 82 milhões de toneladas.
Base da alimentação dos brasileiros, o arroz também cresceu. Segundo a Conab, a produção do grão deve ter uma aumento de área plantada em 6,5%, mas não chega a superar 1,7 milhão de hectares dedicados. A estimativa é que a safra produza em torno de 12,1 milhões de toneladas de arroz. A Conab estima que, desse total, 2 milhões de toneladas sejam destinadas ao mercado externo, e cerca de 1,4 milhão de toneladas para composição de estoque.
Já as projeções relativas ao feijão são menos otimistas. A Conab estima um “ligeiro aumento” na produção de em torno de 1,5% na próxima safra, totalizando 3,29 milhões de toneladas. Sobre as leguminosas, a projeção é de estabilidade no volume de produção.
Para a presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), Yamila Goldfarb, as ações do governo precisam de tempo para dar frutos.
“O governo tem a intenção de aumentar a área plantada, tem investimento para isso, mas, para que tenhamos uma recomposição de fato da área colhida, que atenda a demanda interna, isso precisa de um tempo, não é de um ano para o outro”, ressalta, destacando ainda uma outra dimensão da segurança alimentar: a estabilidade.
“Não adianta a gente aumentar a produção num ano e no ano seguinte, de novo, essa produção, por exemplo, do arroz, voltar a ser toda exportada ao invés de ficar dentro do mercado interno. Então é preciso sempre atentar para esse tipo para essa dimensão dos dados também”, afirma.
“A gente acabou de reduzir o imposto, de tirar o imposto de importação de arroz. Ou seja, não tem aqui o suficiente, ou o que tem tá indo para fora, né?”, acrescentou, em referência à redução de impostos sobre importação anunciada pelo governo no começo do mês de março.
O professor aposentado de economia agrícola do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e cofundador do Instituto Fome Zero, Walter Belik, avalia que o ligeiro aumento na área cultivada de arroz e feijão não indica uma tendência.
“No caso do arroz, estamos nos recuperando da frustração de safra de 2023 e 2024 com as enchentes no Sul. A produção de arroz vai para 12 milhões de toneladas, patamar de 2017, mas já tivemos um pico em 2011, com 13,6 milhões de toneladas. No caso do feijão, oscila muito. Esse também teve um pico em 2010/2011, com 3,7 milhões de toneladas, e depois caiu para menos de 3 milhões, agora voltamos ao patamar de 3,2 milhões”, avalia o professor.
Recuperação no RS
Esta é a primeira colheita do arroz agroecológico do MST após as enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul em maio do ano passado, e a 22ª safra do grão nos assentamentos gaúchos.
“É uma safra especial, porque é a primeira colheita depois da enchente, da tragédia ambiental, tem aqui a caracterização da esperança das famílias que remontaram parte da terra fértil que também foi embora, mas tem também a participação do governo do presidente Lula. Desde a semente que os assentados perderam na enchente, nós conseguimos comprar via Programa de Aquisição de Alimentos, 70% da semente utilizada nesta safra, foi via o PAA, programa que a Conab operacionaliza do governo federal”, destacou o presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto, durante a atividade.
“Foi uma um evento climático extremo que acometeu esse estado, e a gente pôde agora, por conta do governo Lula, apoiar os assentados e assentadas que precisavam de um reforço para retomar sua profissão e ver que, com o trabalho, a luta e a força deles, a gente conseguiu chegar agora com essa colheita maravilhosa e a natureza abençoando, trazendo aí muita fartura”, destacou Machiaveli, informando ainda que o MDA e a Conab forneceram cerca de 2,5 milhões de sementes e fez um aporte de R$ 350 milhões no ano passado para a reconstrução das estradas, casas, e cultivos.
A colheita do arroz orgânico do MST deve render um total de 14 mil toneladas do grão. A produção envolve o trabalho de 290 famílias assentadas em sete municípios do Rio Grande do Sul. Segundo Pretto, a maior colheita da histórica dos assentamentos gaúchos.
“Com todo o estrago feito nas lavouras, na terra, principalmente terra fértil que foi embora, foi possível fazer essa recomposição pelas técnicas utilizadas para fazer germinar e produzir o arroz orgânico. São 14 mil toneladas de arroz, que significam a maior safra da história”, destacou.
Esse arroz, seguiu Pretto, “vai chegar nos hospitais, nas escolas, nas creches, nos abrigos, nos asilos, vai para a rede socioassistencial, vai ser com comprado pelo PAA, vai ser entregue nas cozinhas solidárias, ou seja, é uma relação muito importante. O apoio dado para produzir e também agora o apoio dado na comercialização. A Conab, via o PAA, vai comprar boa parte desse arroz, não só para a rede essencial do Rio Grande do Sul, mas também do Brasil.”
Pretto informou ainda que foram investidos R$ 4 milhões para a compra de sementes, sobretudo de arroz e feijão. “O Brasil vai se alimentar desse arroz bom de uma forma agroecológica, num prato na mesa de quem mais precisa”, declarou.

Esclarecimentos
O Brasil de Fato questionou o MDA sobre os dados que corroboram com as declarações da secretária-executiva. Em resposta, a assessoria de imprensa se limitou a dizer que as afirmações foram embasadas em dados fornecidos pela Conab.
Por sua vez, a Conab informou que o arroz e feijão ganharam em área cultivada desde o início do atual governo. “Quando comparamos o 3º levantamento da safra 2022/23, do governo Bolsonaro, com o 3º da safra 2024/25, o feijão acrescentou 4,1% de área cultivada, saindo de 2,79 milhões de hectares para 2,91 milhões de hectares. A produtividade também se destacou, crescendo 16% – de 2,89 milhões de toneladas para 3,36 milhões”, disse.
A companhia ainda informa que os números se repetem no caso do arroz, que aumentou em “20,6%, indo de 1,46 milhão de hectares para 1,77 milhão de hectares, com a produtividade saltando 16,2%, saindo de 10,38 milhões de toneladas para 12,06 milhões”.
A Conab informou ainda que os dados, projeções e estimativas “têm como base estudos de séries temporais, análises agroclimáticas e pesquisas de campo feitas pelos técnicos da Conab em viagens mensais por todos os estados produtores do país”. Sobre a retomada do PAA, a companhia informa que o primeiro chamamento começou com R$ 250 milhões e o segundo, que teve inscrições prorrogadas até 31 de março, já inicia com um montante de R$ 900 milhões apenas para a Conab.
“O contrato de opção de venda de arroz, que garante ao produtor o pagamento por um preço 20% acima do mínimo, por exemplo, ao mesmo tempo em que reforça os estoques do governo federal para equilibrar os preços em tempos de escassez do produto, incentiva os produtores a seguir plantando arroz e não migrar para a monocultura”.
A reportagem também questionou sobre a estrutura disponível para o armazenamento de alimentos e criação de estoques. A Conab informou que 27 dos 91 armazéns da companhia foram fechados na gestão anterior “e os 64 restantes não tiveram a manutenção executada de forma corriqueira”. De acordo com a nota enviada, foi assinado um acordo com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a reforma de dez armazéns, ampliando a capacidade estática de 900 mil toneladas para 1,2 milhão, o que representará um aumento de 33%.