O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por unanimidade, nesta sexta-feira (21), acabar com a chamada “presunção de boa-fé” no comércio de ouro no Brasil. Agora, a procedência do ouro comercializado não poderá ser atestada simplesmente pela palavra do vendedor. A decisão pode ajudar no combate ao garimpo ilegal.
Por 11 votos a 0, os ministros da Suprema Corte consideraram inconstitucional um trecho da lei federal 12.844/13, que previa este mecanismo. O julgamento apreciou duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI), uma impetrada pela Rede Sustentabilidade, outra por PSB e PV. De acordo com os autores dos pedidos, a falta de fiscalização sobre a origem do metal nobre impulsiona o garimpo ilegal na Amazônia.
Sob relatoria do ministro Gilmar Mendes, desde que o julgamento começou em abril de 2023, a aplicação da lei foi suspensa provisoriamente. Agora, com votos proferidos de forma virtual, o STF tomou a decisão definitiva.
O relator determinou que a União estabeleça uma nova normativa para a fiscalização do comércio de ouro no país, dando atenção especial à verificação da origem do metal adquirido por corretoras autorizadas pelo Banco Central para fazer a venda, as Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs).
Em 2021, o Ministério Público Federal no Pará solicitou a suspensão das atividades de três importantes DTVMs depois que uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais revelou a suspeita de lavagem de 49 toneladas de ouro proveniente de garimpo ilegal na Amazônia entre 2019 e 2020.
Desde que a regra da boa-fé no comércio do ouro foi suspensa, em 2023, houve uma diminuição no montante declarado do minério retirado de garimpo. Foi o que apontou o estudo “Opacidade Dourada: o mecanismo do tráfico de ouro latino-americano”, indicando a suspeita de que lavras legais de garimpo estavam sendo usadas para lavar ouro extraído de forma irregular. O levantamento foi conduzido pela organização de jornalismo investigativo Peru Convoca, em parceria com outros veículos.
Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes estabeleceu que medidas do governo federal deverão impedir a aquisição de ouro proveniente de Terras Indígenas (TI) e de áreas de proteção ambiental.
Os trechos da lei invalidados nesta sexta (21) pelo plenário apresentavam, segundo o voto do relator, “contornos que não se mostram coerentes com o dever de proteção do meio ambiente”. A presunção de boa-fé do vendedor de ouro “simplesmente sabotam a efetividade do controle de uma atividade inerentemente poluidora”, argumentou o ministro Gilmar Mendes.
“Não é difícil verificar que a simplificação do processo de compra de ouro permitiu a expansão do comércio ilegal e fortaleceu as atividades de garimpo ilegal, o desmatamento, a contaminação de rios, a violência nas regiões de garimpo, chegando a atingir os povos indígenas das áreas afetadas”, completou o decano do STF.