Levar 10 minutos ou menos para chegar a pé em feiras que vendem frutas e legumes é uma possibilidade restrita a menos de um quarto da população de Porto Alegre. Existe uma associação entre a renda dos moradores e o nível de acessibilidade a esse tipo de comércio: residentes das localidades mais ricas podem chegar às feiras em menos tempo, usando qualquer modo de transporte, do que aqueles das áreas mais pobres. Regiões com maioria de habitantes brancos têm acessibilidade significativamente melhor às feiras a pé, de bicicleta e de ônibus.
Essas são as conclusões de estudiosos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) em um artigo sobre as desigualdades sociais e étnico-raciais na acessibilidade física aos mercados de produtores rurais em Porto Alegre. O material foi publicado no periódico científico Ciência & Saúde Coletiva.
De acordo com a pesquisa, as feiras livres são espaços importantes para a venda de frutas, verduras e legumes, considerados um dos aspectos-chave para cidades saudáveis. Para descrever a acessibilidade a esses espaços na capital gaúcha, os pesquisadores associaram dados geográficos com a renda e a raça/cor de pele dos indivíduos. A distribuição das feiras pela cidade é mais equilibrada do que outros estabelecimentos de alimentos, embora a acessibilidade física seja desigual entre os diferentes modos de transporte.
A Prefeitura de Porto Alegre supervisiona a organização de feiras de produtores rurais desde a década de 1950, com a promulgação do Decreto Municipal nº 474, que também atribuiu locais específicos para as feiras. Esses locais, de acordo com a pesquisa, foram determinados com base em critérios como densidade demográfica do bairro e proximidade de centros atacadistas. Legislações subsequentes foram implementadas ao longo dos anos para regular vários aspectos das feiras, mas essas medidas não alteraram significativamente sua quantidade ou localização.
Localização e acessibilidade
A pesquisa demonstra que, das 44 feiras existentes na cidade (compreendendo 6 feiras de produtores, 6 feiras de produtores agroecológicos e 32 do tipo feira modelo), 59% deles estão situados na zona central ou ao longo de avenidas principais de Porto Alegre. Essa porcentagem é a menor entre todas as categorias de estabelecimentos de alimentos da cidade, ou seja: outros tipos de comércio em que se compra comida são encontrados, na maior parte, na região central. Além disso, o nível de concentração de feiras também é o mais baixo em comparação a outros tipos de pontos de venda de alimentos.
Para os pesquisadores, isso reflete o fato de que a localização das feiras não é guiada apenas por princípios de mercado, como acontece com empresas típicas. Em vez disso, seu posicionamento é influenciado por políticas públicas de abastecimento que visam aproximar os produtores dos consumidores em toda a cidade.
No entanto, aproximadamente um quarto das feiras está concentrado na área central da cidade. Em Porto Alegre, cujo centro econômico está situada a oeste do centro geométrico, parece haver um desequilíbrio na distribuição das feiras.

Apesar dessas disparidades, a bicicleta surge como uma alternativa que facilita viagens curtas às feiras para mais da metade da população. No entanto, os pesquisadores salientam que no contexto brasileiro, o uso de bicicletas continua altamente limitado, constituindo apenas cerca de 1% das viagens em cidades com mais de um milhão de habitantes em 2018.
Quanto ao meio de transporte usado pela população para acessar as feiras ecológicas, 21,1% da população consegue chegar a uma feira de agricultores a pé em 10 minutos, 26,7% de ônibus e 58% de bicicleta, enquanto 88,8% podem fazê-lo de carro. Por outro lado, 26,5% da população total da cidade reside em áreas a mais de 30 minutos a pé da feira mais próxima, com 14,3% exigindo mais de 30 minutos de bicicleta, 13,8% de ônibus e apenas 0,4% de carro.
Artigo original publicado em Sul21.