Durante o debate eleitoral do domingo (23) para o segundo turno das eleições presidenciais no Equador, marcadas para 13 de abril, a candidata do partido de oposição Revolução Cidadã (RC), Luisa González, desafiou seu oponente, o presidente Daniel Noboa, a fazer teste antidoping. A fala foi uma resposta ao questionamento de Noboa sobre a retomada da tabela de limites de posse de drogas , revogada por ele no início de seu governo.
“Não vamos reinstalar a tabela de drogas, mas te convido a pedir a alguém que nos faça um teste antidoping quando sairmos daqui. E digam a ele claramente que o que vamos fazer com nossos jovens é dar a eles uma educação de qualidade, nomear professores permanentemente, recontratá-los e garantir uma educação decente”, disse González.
Partidária do ex-presidente Rafael Correa (2007-2017), González acusou María Moreno, presidente do partido de Noboa, Ação Democrática Nacional (ADN), que administra nove empresas pertencentes ao Grupo Noboa, de estar ligada “ao tráfico de drogas ilícitas”.“Senhores, acessem agora mesmo a página da Procuradoria Geral da República e verão que a presidente da ADN tem um processo por tráfico de drogas e administra as empresas do grupo Noboa”, afirmou.
O país se tornou mais violento
A militarização do país e as políticas repressivas de combate às drogas são a principal marca do governo Noboa. A Constituição de 2008 aprovada no Equador durante o governo de Rafael Correa considera o consumo de drogas como uma questão de saúde pública, e a tabela de limites para o porte de substâncias foi adotada como um instrumento jurídico para a aplicação dessa norma.
A exemplo do que acontece hoje no Brasil, ao definir medidas de posse que diferenciam o usuário do traficante, a medida busca diminuir o número de prisões de usuários dessas substâncias. Após revogar a tabela, porém, Noboa enviou um novo referendo à Corte Constitucional que amplia os poderes das Forças Armadas para combater o narcotráfico. Em nome do combate à organizações ligadas a cartéis internacionais e gangues, o governo Noboa foi acusado de viola regras de direitos humanos ao promover encarceramentos em massa.
Durante a campanha eleitoral, González atribuiu o aumento da violência no país às políticas de segurança agressivas de Noboa, que levaram os militares a assumir o controle das prisões, fecharam as fronteiras e declararam estado de emergência. Mais de 30 políticos, autoridades judiciais e jornalistas foram mortos desde 2023 no Equador, inclusive o presidenciável Fernando Villavicencio (centro), baleado ao sair de um comício em Quito antes do primeiro turno das eleições antecipadas daquele ano, nas quais Noboa foi eleito para um mandato de 18 meses.
A crise de segurança no país marcou o debate eleitoral. Na véspera do primeiro turno, Noboa anunciou o fechamento dos portos e aeroportos do país, sob a justificativa de prevenir “as tentativas de desestabilização por parte de grupos armados”.
Empate técnico
O empresário de 37 anos e atual presidente terminou o primeiro-turno à frente da disputa, mas com uma diferença pequena em relação à sua opositora, a advogada de 47 anos: 16.746 votos. Para o segundo turno, as pesquisas mostram um empate técnico entre os dois.
No primeiro turno de fevereiro, Noboa e Gonzáles tiveram 88,17% dos quase 10,3 milhões de votos válidos, que se distribuíram entre 16 candidatos, algo sem precedentes na história do país. Quase um milhão de votos foram em branco ou nulos, enquanto o índice de abstenção ficou próximo de 18%.
O líder indígena de esquerda Leonidas Iza ficou em terceiro lugar, com 5,25% dos votos, e a ambientalista anti-correísta Andrea González Nader ficou em quarto, com 2,69%. A maior organização de povos originários do país, Conaie, liderada por Iza, e outras organizações de esquerda declararam apoio em Luisa González para o segundo turno.
Proposta progressista
Com base na agenda do Movimento Revolução Cidadã, a proposta de Gonzales para a crise no país é investir em inteligência e financiamento para recuperar a segurança. A estratégia progressista é baseada em cinco pilares: força do Estado, inteligência, tecnologia, investimento social e colaboração internacional.
“Defendemos uma sociedade baseada em direitos humanos, solidariedade e justiça social. Rejeitamos qualquer forma de repressão injustificada ou violação dos direitos individuais e coletivos. Rejeitamos a corrupção e a influência do crime organizado nas autoridades públicas. Defendemos sistemas jurídicos justos e imparciais, em que todos os cidadãos sejam tratados igualmente perante a lei”, declara em seu plano de governo, onde se compromete a “trabalhar em conjunto com organizações políticas e sociais, instituições de segurança e sociedade civil para promover e proteger a paz, a segurança e a ordem”.
Na área de segurança pública, o governo de Rafael Correa (2007-17) , chamado de Revolução Cidadã, foi marcado pelo fortalecimento de instituições públicas como o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos e o investimento no sistema prisional do país.
Política de repressão
Em janeiro de 2024, Noboa decretou estado de exceção no país, determinou que o Equador vive conflito interno e nomeou 22 organizações criminosas que passaram a ser consideradas inimigas do Estado.
A qualificação de conflito armado interno foi bastante questionada internamente, inclusive pelo Tribunal Constitucional do Equador, que em várias ocasiões disse ao governo que ela não se encaixa nos conceitos legais de grupos antagônicos e domínio territorial desses grupo.
Após a ocupação das prisões pelas forças armadas do país, o Comitê Permanente de Defesa dos Direitos Humanos (CDH) aponta que a entrada de médicos do sistema público de saúde para tratar a população carcerária foi impedida, assim como a entrada da Defensoria Pública responsável pelo sistema de prevenção à tortura no sistema carcerário, além de organizações civis e de direitos humanos.
*Com Telesur e AFP