A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta terça-feira (25) o julgamento da acusação oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras sete pessoas pela tentativa frustrada de golpe de Estado em 2022 e 2023.
Ao final do primeiro dia de trabalhos, a Turma não entrou no mérito das acusações. Os ministros apenas julgaram as chamadas “preliminares”, que são questionamentos das defesas a respeito do processo, como possíveis irregularidades. O julgamento será retomado nesta quarta-feira (26).
Pela manhã, foi vencida a etapa das sustentações orais da acusação do procurador-geral da República, Paulo Gonet, e dos advogados de defesa. Em seguida, o ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, passou a análise das preliminares.
A primeira preliminar levantada pela defesa foi do impedimento, suspeição e ausência de parcialidade dos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin. Sobre esse aspecto, Moraes destacou a decisão do Plenário do STF que rejeitou o argumento da defesa. Novamente, o ministro votou pela rejeição da interpelação e foi seguido de forma unânime pelos demais magistrados.
“Os juízes são imparciais, a menos que se prove o contrário”, disse a decana da turma, ministra Cármen Lúcia. “É fácil criar qualquer tipo de impedimento para afastar um juiz no colegiado, pela referência feita a ele em algum documento, basta incluir e se afasta”, disse a ministra.
Outra preliminar levantada pela defesa foi quanto à competência do STF. “Essa matéria já foi pacificada em 1.494 ações, em que o STF reafirmou sua competência para todos os crimes relacionados ao dia 8 de janeiro de 2023”, disse o ministro.
“Aproveito aqui para desfazer uma narrativa de que o STF estaria condenando velhinhas com a bíblia na mão, que estariam passeando num domingo ensolarado no Supremo Tribunal Federal, no Congresso Nacional e no Palácio do Planalto”, disse o ministro, em referência às condenações de pessoas que participaram da quebradeira na praça dos Três Poderes.
Moraes citou uma série de denúncias, recebidas no âmbito da Primeira Turma, que reafirmam a competência do STF e não da primeira instância, como defenderam os advogados de defesa, que pediram ainda que o caso fosse remetido ao Plenário da Corte. Sobre esse aspecto, o relator esclareceu que a remissão do processo para a apreciação dos 11 magistrados se aplica a presidentes em exercício, e não a ex-presidentes. Apenas o ministro Luiz Fux divergiu e defendeu que o tema fosse levado ao Plenário. Os demais ministros se posicionaram pela rejeição da questão de ordem apresentada pela defesa.
O último argumento da defesa a respeito do processo legal foi em relação às nulidades, ou seja, erros processuais que podem implicar na anulação do julgamento. Entre os apontamentos feitos pela defesa, a ausência de amplo acesso às provas, ilegalidade de decisões que ensejaram a instauração do inquérito e a suposta existência de provas ilegais.
“Eu estou seguro que todas as provas mencionadas na acusação pelo Ministério Público foram disponibilizadas à defesa”, disse o ministro, que ainda mostrou um levantamento dos acessos feitos pelos advogados de defesa. “A PGR não foi atrás de provas para confundir a defesa. Foi a partir de provas colhidas pela Polícia Federal”, destacou Moraes, afastando ainda a argumentação da defesa de que a PF teria feito uma “pesca probatória”, ou seja, que a autoridade policial teria escolhido deliberadamente as provas que constam nos autos. “Não se pode confundir uma detalhada investigação com pesca probatória. Na verdade houve um desencadeamento das investigações”, afirmou.
“No curso de uma determinada investigação, a polícia encontra outros crimes, o que ela faz? Descarta os crimes? Não, se abre uma outra investigação específica”, explicou o ministro, que rejeitou todos os apontamentos de nulidades no processo, sendo acompanhado por todos os demais ministros.
“Em relação a todos os fatos elencados pelo ministro Alexandre, não vejo nenhuma nulidade”, defendeu Flávio Dino, defendendo implicitamente o prosseguimento da ação penal ao dizer que “haverá o momento certo” para analisar o conjunto de elementos probatórios, que poderão ser questionados pela defesa.
Finalmente, a defesa de Jair Bolsonaro pediu que fosse declarada a nulidade da delação premiada do ex-ajudante de ordens, Mauro Cid, argumentando uma possível pressão sobre o delator por parte da Polícia Federal e do ministro relator. Sobre esse aspecto, Moraes lembrou que todas as declarações feitas pelo delator contaram com o acompanhamento dos advogados, e negou que qualquer autoridade tenha exercido algum tipo de pressão sobre Cid. Dessa forma, o magistrado rejeitou essa última preliminar, sendo seguido pelos demais ministros do colegiado.
Durante seu voto, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que as milícias digitais estavam atuando no momento da sessão, fazendo recortes e criando narrativas falsas sobre o processo em análise. “Eles não entenderam que se até agora não conseguiram intimidar o Poder Judiciário, não vão conseguir”, declarou.
O ex-presidente Jair Bolsonaro acompanhou toda a sessão desta terça, sentado entre seus advogados, na primeira fileira de público do Plenário da Primeira Turma. Em nenhum momento expressou qualquer reação diante das afirmações dos ministros. Segundo seu assessor, Fábio Wajngarten, Bolsonaro só vai se pronunciar após o fim do julgamento.

Após a análise das preliminares, o presidente do colegiado, ministro Cristiano Zanin, suspendeu a sessão, que será retomada nesta quarta-feira (26), com a análise do mérito da acusação.
Ao final da sessão, Celso Vilardi, advogado de Jair Bolsonaro, afirmou que o STF “inovou” a jurisprudência. “Os ministros julgaram as preliminares. Decisão do Supremo nós sempre temos que respeitar e cumprir. O que posso dizer é que não me arrependo de ter sustentado as teses preliminares, em especial a questão dos documentos que não tivemos acesso e também a questão da delação, que na minha visão, o Supremo de certa forma, hoje, inovou a jurisprudência.”