O projeto de lei sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e encaminhado ao Congresso Nacional na última semana, com a proposta do Ministério da Fazenda de isenção do imposto de renda para pessoa física para salários até o limite de R$ 5 mil e parcial para quem ganha até R$ 7 mil vai gerar um impacto positivo sobre a renda disponível das famílias.
A avaliação é do Instituto Justiça Fiscal (IJF), associação civil voltada para o aperfeiçoamento do sistema fiscal e em defesa da justiça tributária e da redução das desigualdades. Em nota, a entidade destaca que a medida representará “alívio financeiro para milhões de brasileiros”.
O IJF considera que “será muito bem-vinda a proposta de estabelecer uma tributação adicional para os que recebem mais de R$ 50 mil mensais de modo a completar a incidência final (alíquota efetiva) para até 10%”, o que é um passo inicial importante para um sistema tributário progressivo, embora insuficiente. “A tributação de dividendos remetidos ao exterior é também uma medida positiva e justa”, reconhece.
Impacto na economia
Pela proposta, cerca 10 milhões de contribuintes deixarão de pagar imposto de renda e quem ganha entre R$ 5 mil e R$ 7 mil também terá uma redução. Dos declarantes do Imposto de Renda, mais de 26 milhões de pessoas serão isentos em 2026, caso as medidas sejam aprovadas pelo Congresso.
“A proposta de reforma da tributação da renda apresentada pelo governo representa o início do processo da reconstrução da tributação justa da renda, desconfigurada na chamada reforma tributária silenciosa, de 1995 e anos seguintes, que desonerou os lucros e dividendos distribuídos e compensou a perda de arrecadação com o aumento da incidência sobre as rendas do trabalho e a sobrecarga do consumo”, ressalta o comunicado.
Os R$ 26 bilhões previstos de desoneração das faixas inferiores representarão recursos substanciais para dinamizar a economia, pela ampliação do poder de consumo das famílias, o que implicará em aumento da demanda, com potencial incremento da produção e do comércio a requerer novos investimentos, e, consequentemente, geração de mais emprego e renda. “Beneficiará, portanto, indiretamenteum número ainda maior de brasileiros”.
Tributação mínima das altas rendas
Com a proposta, o governo busca compensar a redução da arrecadação do IRPF com a tributação das altas rendas. A tributação efetiva mínima será de 10% somente para renda anual acima de R$ 1,2 milhão. Entre R$ 600 mil e R$ 1,2 milhão por ano, o percentual será crescente de zero a 10%. A mudança afetará 141,4 mil contribuintes, 0,13% do total de declarantes no país, 0,06% da população brasileira. Esses contribuintes pagam imposto a uma alíquota efetiva média de meros 2,54% e, com esse ajuste, pagarão um pouco mais.
“É evidente que o quadro das desigualdades presentes na sociedade brasileira exige mais. As faixas de incidência em que se concentram os rendimentos do trabalho deveriam ser, todas, corrigidas e os rendimentos recebidos a títulos de lucros e dividendos, oferecidos à tributação na mesma tabela progressiva. Contudo, a atual maioria conservadora do Congresso Nacional fará oposição, inclusive, às atuais propostas de leve tributação dos rendimentos dos mais ricos. Nesse sentido, é forçoso reconhecer o passo fundamental representado pela proposta do governo Lula”.
Distribuição de lucros e “JCP”
A falta de correção da tabela do IRPF sempre representa um aumento da tributação sobre um acréscimo de rendimentos meramente inflacionário, que conceitualmente, sequer pode ser chamado de renda. E os benefícios fiscais de isenção de lucros e dividendos distribuídos e a dedução dos “juros sobre o capital próprio” não encontram paralelo nas experiências internacionais e nem justificativas diante das carências sociais do país, citica o IJF.
O IJF alerta que outras medidas igualmente importantes precisam ser adotadas na reforma da tributação da renda, como revogar os artigos 9º e 10º da Lei nº 9.249 de 1995, que tratam da isenção e dos “JCP” mencionados.
A estimativa é que a atual isenção dos lucros e dividendos distribuídos resulta na não tributação de aproximadamente 70% dos rendimentos das pessoas com maior renda.
Em 2022, essas rendas isentas recebidas por sócios e acionistas das pessoas jurídicas somaram R$ 830 bilhões. Isso contribui para que o imposto de renda no Brasil represente apenas 2,5% do PIB, em contraste com a média de 8,5% dos países da OCDE, compara.
“Aalíquota efetiva média do imposto de renda para os 0,01% dos mais ricos foi de 1,35% em 2022, enquanto para um professor universitário foi de 11,24% e para um advogado público, 14,35%. No mesmo ano, a categoria dos empresários pagou o equivalente a 1,98% de seus rendimentos totais”.
Lucros e dividendos remetidos ao exterior
Para os técnicos, o ponto mais significativo da proposta governamental em termos de mudança de paradigma sobre a tributação do “andar de cima” é o retorno da tributação de lucros remetidos ao exterior.
“Em 2022, R$ 193 bilhões em lucros e dividendos foram enviados ao exterior livres de imposto de renda. Entretanto, tais rendimentos são tributados ao ingressarem no país de residência dos acionistas. Com isso, o Brasil exporta o imposto, ao deixar de arrecadar e transferindo a receita para outras nações. Já no caminho inverso, acionistas brasileiros de empresas estrangeiras deixam nos países de origem dos rendimentos o imposto de renda lá devido”, contrapõe.
O IJF cita Lula ao afirmar que “é chegado o momento de a sociedade brasileira pressionar pela implementação de uma reforma na tributação da renda que efetivamente inclua o rico no imposto de renda”.
Artigo original publicado em Extra Classe.