Há exatamente 140 anos, era abolida a escravidão no Ceará, a primeira província do Brasil a libertar os escravos em 25 de março de 1884. Importante conquista que foi arrancada das lutas e revoltas negras contra o regime escravista. A aliança com setores do movimento abolicionista foi fundamental para a combinação de formas de luta e atuação negra para a libertação do trabalho escravo. Destacamos como centrais, em nossa leitura, os fatores econômicos e históricos desse período para criar as condições para a abolição. Lembremos dos interesses internos, das pressões externas e das demandas econômicas da Inglaterra. A história é viva e somos parte dela. A terra não é tão da luz assim!
O papel histórico de Francisco José do Nascimento é demonstrativo da rebeldia e do ódio de classe direcionado à classe dos senhores escravagistas. Seu exemplo pedagógico do “não” revolucionário, do movimento da recusa às solicitações da classe dominante, a mesma que acumulou riqueza pela exploração e humilhação do povo negro. O Dragão do Mar, há 140 anos, continua revoltado com a intensa exploração e racialização do trabalho do povo negro. Com os horrores da violência policial e racial que navega livremente entre ruas, becos e vielas da terra, que ainda oculta os horrores da violência racial.
O 25 de março não é uma conclusão do regime escravista e nem muito menos um acordo das elites, ele é produto de um contexto histórico com contradições e possibilidades. As análises comemorativas vistas durante todo o dia flertam e revivem o simbolismo da chamada benevolência do estado colonial ou até mesmo da ação individual de alguns bons senhores. Todas as leituras são reforço para as teses racistas que tratam do pacifismo negro no Ceará. O mar revolto dos nossos dias já está sinalizando que a terra não é tão da luz, o palácio é 13 de maio.
Refletir o 25 de março partindo da realidade concreta da vida comunidade negra do Ceará é parte do caminho coletivo que alguns poucos continuam e não abrem mão da história, da sua materialidade e da sua revolta dialética. É necessário para os próximos à retomada ancestral da rebeldia de ontem, do “não” revolucionário. A luta pela libertação segue aberta, claro que em outras condições históricas, mas seguem em curso. A negra gente do Ceará continua desde os verdes mares a denunciar a violência policial, o genocídio nas periferias da Grande Fortaleza e região metropolitana, do encarceramento em massa da juventude negra. A terra, que não é tanto da luz, segue com diversas comunidades quilombolas sem demarcação e titulação. Essas são as razões pelas quais somos parte do movimento de continuidade. A luta pela liberdade é uma luta constante, afirma Angela Davis.
*Francisco Nonato do Nascimento Filho é militante do Movimento Negro Unificado no Ceará. Pesquisa temas relacionados a educação do campo, povos e comunidades tradicionais e racismo e capitalismo.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
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