Se a goleada histórica da Argentina sobre o maior rival – nós – na terça-feira (25) é sinal de que a seleção vai muito bem, obrigado, fora do campo os torcedores do país também não deixam a desejar, se engajando em lutas sociais. O capítulo mais recente desta atuação política das torcidas de futebol é se unirem aos aposentados que protestam semanalmente há 35 anos.
Torcedores de todos os times do país devem se juntar mais uma vez aos protestos desta quarta (26) em frente ao Congresso do país, contra a perda de poder aquisitivo dos idosos, acentuada no governo de extrema direita de Javier Milei. Sua administração, inclusive, ameaça criminalizar as torcidas organizadas – e dirigentes de clubes que os ajudaram -, em tentativa de calar oposicionistas.
O apoio aos aposentados começou após imagens de um torcedor do tradicional clube Chacarita, de 75 anos, apanhando da polícia durante protesto, viralizar. Em seguida, na quarta, 12 de março, torcedores do River Plate, Boca Juniors, Chacarita, Tigre, Independiente, Racing, San Lorenzo, Vélez, Deportivo Merlo y Ferro, entre outros clubes, se juntaram aos atos.
“Eles se mobilizaram para a rua para proteger os aposentados. Então a ideia era fazer um cordão de isolamento ao redor dos idosos para que a polícia não pudesse bater neles”, relata a pesquisadora Mariane Pisani, antropóloga e vice-Coordenadora do INCT Estudos do Futebol Brasileiro.“Esse chamado vem por parte de uma coordenação nacional de torcedores e a coordenação nacional de futebol para que se ocupem as ruas em defesa dos aposentados”. Para Pisani, este levante político das torcidas “foi algo pontual”, mas que “por conta da força da repressão policial nas manifestações em que estiveram presentes tais torcidas e torcedores individuais, talvez se torne algo corriqueiro, os torcedores apoiarem as causas populares, mais amplas”.
O apoio aos aposentados vindo de boleiros não é novo. Em 1992, o ídolo Diego Maradona disse: “Estou com os aposentados até a morte. Temos que ser muito covardes para não defender os aposentados”.
A antropóloga diz que as torcidas, ou hinchadas “têm uma organização voltada para pensar o espaço do futebol como um lugar de não reprodução de violências, [sejam elas] violências estatais, violência de gênero, violências com pessoas LGBT. Elas estão voltadas para promover o espaço do futebol como um espaço de segurança para todos, um espaço para não promover o capitalismo desenfreado”.
“Eu acho que tem uma chave de compreensão que é importante a gente ter: esses movimentos [de protestar] na rua foram organizados ou foram planejados por grupos de torcedores antifascistas, que já têm no seu horizonte a luta por um futebol mais inclusivo, menos violento”, pontua a antropóloga.
“Quando eles percebem que essa parcela da população, os aposentados, os idosos, também sofrem com a violência estatal, eles sentem que não podem ficar de braços cruzados observando aquilo acontecer. E aí eles vão para a rua juntos.”