Nesta terça-feira (1), os indígenas Munduruku completam uma semana de bloqueio no cruzamento entre as rodovias BR-163 e BR-230, no município de Itaituba (PA). A manifestação pede a derrubada da lei 14.701/23, que estabelece o marco temporal e determina que os povos originários só têm direito às terras que ocupavam em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.
Em carta publicada na segunda-feira (31), os manifestantes reforçam a reivindicação de diálogo direto com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, proponente da comissão de conciliação que produziu um anteprojeto de lei substitutivo ao marco temporal, e cobram urgência na resposta.
“Se não houver resposta positiva em até 24 horas após o recebimento deste documento, intensificaremos a mobilização e manteremos a paralisação total da rodovia”, informa o documento.
“O Ministro Gilmar Mendes e outros integrantes do STF detém poder para definir o rumo de decisões que afetam nossas vidas, mas preferem seguir trilhas que atentam contra direitos que nos cabem muito antes da formação do Estado brasileiro”, afirmam os manifestantes.
Na rodovia, os indígenas se revezam para manter as vias fechadas durante o dia, impedindo a passagem de caminhões. No período noturno, o trânsito é liberado. Ambulâncias e veículos transportando pessoas doentes têm passagem garantida a todo momento.
A barreira é realizada em um ponto estratégico. A rodovia BR-163 conecta os estados do Mato Grosso e Pará e é uma das principais vias de escoamento da soja. Os grãos plantados nos latifúndios matogrossenses são transportados até os portos de Miritituba, distrito de Itaituba, onde são escoados em barcaças para o mercado externo. Por dia, cerca de 1,8 mil caminhões fazem esse trajeto.

A BR-230, conhecida como Transamazônica, é uma das maiores do país, com 4.260 km, e também é um importante corredor logístico para o agronegócio, setor interessado na manutenção da tese do marco temporal.
Os indígenas denunciam agressões por parte de alguns caminhoneiros. De acordo com lideranças do movimento, os motoristas arremessaram pedras e dispararam armas de fogo contra os manifestantes.
Atualização da proposta não é suficiente
Os protestos dos Munduruku foram organizados em resposta à retomada das audiências da comissão de conciliação sobre a lei que afeta os territórios dos povos originários. A primeira sessão desta segunda fase de audiências foi realizada na última quinta-feira (27).
Na ocasião, Gilmar Mendes atualizou a proposta do anteprojeto e retirou a permissão de mineração em Terras Indígenas (TIs). No entanto, outros artigos da minuta, como a indenização de fazendeiros pelo valor da terra nua, entraves no processo demarcatório e uso da Polícia Militar (PM) para despejar retomadas, seguem em discussão.
Os indígenas ressaltam que a atualização não é suficiente, e a proposta continua atendendo aos interesses dos setores ruralistas em detrimento dos direitos dos povos originários. “Tentam ainda nos enganar ao retirar a mineração da pauta, mas mantêm múltiplos ataques à nossa existência, o que não aceitaremos”, informa a carta do movimento.
A comissão de conciliação é composta, majoritariamente, por representantes do setor ruralista. Na primeira etapa dos debates, realizada em 2024, o movimento indígena, se retirou por considerar o espaço ilegítimo.
O Brasil de Fato entrou em contato com o STF, mas não recebeu retorno até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto.