O governo dos Estados Unidos revogou no último domingo (30) as licenças para que empresas petroleiras atuem na Venezuela. A espanhola Repsol e a francesa Maurel & A Prom eram as companhias que tinham conseguido as licenças para explorar petróleo venezuelano durante o governo de Joe Biden.
A medida aumenta ainda mais a pressão do governo estadunidense sobre Caracas depois do início das deportações em massa de venezuelanos dos EUA. Para estancar a sangria e evitar o clima de desespero, o governo tem dito que a Venezuela está preparada para lidar com a ausência de petroleiras. A vice-presidente e ministra do Petróleo, Delcy Rodriguez, disse que há um contato permanente com as empresas para que elas sigam no país.
“Temos mantido uma comunicação fluida com as transnacionais de petróleo e gás que operam no país, e que foram notificadas nas últimas horas pelo governo dos EUA sobre a revogação das suas licenças. Estávamos preparados para esta situação e estamos prontos para continuar a cumprir os contratos com estas empresas, no âmbito da Constituição e das leis venezuelanas”, afirmou.
Mesmo com o discurso otimista, o Brasil de Fato apurou que há uma preocupação interna do governo com a produção para os próximos meses e os efeitos que isso terá para a economia. Com a falta de entrada de dólares, a ideia em um primeiro momento é segurar investimentos públicos que não sejam primordiais. Até o momento, já começou um revezamento da distribuição de energia, o que, segundo o governo, não está diretamente relacionado à produção petroleira. O próprio trabalho presencial está passando por um revezamento para evitar que a população se desloque.
Segundo a economista venezuelana, Katiuska Lopez, o primeiro efeito sentido é a desvalorização da moeda local, o bolívar, frente ao dólar. De acordo com ela, a cotação da moeda é feita por agentes econômicos que usam da própria insegurança para especular a moeda, especialmente a cotação paralela ilegal.
“Há fatores que interferem nesse preço do dólar. A começar pelas reservas internacionais e depois o risco-país. Para esses técnicos, que são atores políticos, o que importa é que o país está com um risco econômico muito mais alto para investimento, demanda, oferta e isso sobe o risco-país. Em função disso, o dólar sobe. Nesse momento, cada anúncio é previsível. Isso, em efeito dominó, faz com que a circulação de dinheiro seja afetada porque as pessoas não querem vender os dólares, o que afeta o preço paralelo e, por tabela, o preço oficial”, afirmou.
Mesmo com um bloqueio contra o setor petroleiro venezuelano que já dura 8 anos, a Venezuela se tornou em 2024 o 3º país que mais vende petróleo para os Estados Unidos. Ao todo, o país chegou em outubro de 2024 a uma média de 295 mil barris de petróleo vendidos por dia aos EUA.
A decisão da Casa Branca vem na esteira do anúncio do fim das operações da Chevron na Venezuela. O Departamento do Tesouro dos Estados Unidos anunciou no começo de março que a petroleira estadunidense teria 30 dias para encerrar as suas operações no país. Depois, o prazo foi ampliado até maio.
A medida proíbe que a Chevron exporte petróleo venezuelano, tenha negócios e sociedade com a petroleira estatal PDVSA, pague impostos ou royalties para o governo da Venezuela e realize transações com empresas russas que tenham sede na Venezuela ou com pessoas já sancionadas pelos EUA.
Para Katiuska Lopez, o aumento da pressão sobre a Venezuela era “previsível”, já que Donald Trump prometeu, desde o começo, um avanço contra o governo de Nicolás Maduro. Ela afirma que realmente houve um aprendizado em relação às operações durante a fase mais dura das sanções.
“Era algo previsível porque Trump representava um aumento na temperatura com os EUA. Ele tem uma política muito mais agressiva. Obviamente que Trump tenta evitar a estabilidade econômica e política da Venezuela. Sem esperar muito em troca porque a política deles é de neutralização, mas dentro desse cerco imposto pelos Estados Unidos há um pouco de preparo porque conseguimos recuperar um pouco da economia. Na primeira fase mais dura das sanções houve um aprendizado”, disse ao Brasil de Fato.
A Chevron era responsável por produzir cerca de 220 mil barris de petróleo por dia, enquanto a Repsol produzia 60 mil e a Maurel & Prom entre 20 mil e 25 mil. Trump já havia anunciado que iria “reverter as concessões” feitas pela Casa Branca porque o chefe do Executivo venezuelano, Nicolás Maduro, não está cumprindo o acordo de deportações no ritmo esperado.
A decisão dos EUA também foi tomada sete meses depois de a Assembleia Nacional venezuelana ter aprovado a prorrogação por 15 anos da atuação da empresa mista que possui com a estadunidense, a Petroindependência. A companhia pertence majoritariamente à PDVSA (60%), mas tem participação de 34% da Chevron. De acordo com a lei de hidrocarbonetos da Venezuela, as empresas mistas devem pagar 33% de royalties para a PDVSA e 50% de imposto de renda para o Estado.
A empresa tem participação também em outras três empresas mistas nas quais ela é sócia minoritária da estatal venezuelana PDVSA: Petropiar, Petroboscán e Petroindependiente. As renovações automáticas foram sendo cumpridas até hoje, mas serão interrompidas a partir de agora. Na época, a decisão de permitir esses contratos foi um alívio na política de “máxima pressão” exercida pelos Estados Unidos sobre a economia venezuelana.
O governo Trump substitui a licença 41, emitida em 26 de novembro de 2022 pelo então presidente Joe Biden, que autorizou a atuação da Chevron em território venezuelano depois de cinco anos de bloqueio contra o setor petroleiro da Venezuela. Até aquele momento, a companhia havia ficado dois anos proibida de operar no país caribenho e foi autorizada pelo Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC, na sigla em inglês) a voltar a extrair e comercializar petróleo venezuelano por meio de uma licença que seria renovada a cada seis meses.