Foi entre cantos e outras manifestações culturais que centenas de indígenas se reuniram com diferentes autoridades nesta terça-feira (8) no plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), para reforçar o coro em prol das demandas do segmento e celebrar a importância do Acampamento Terra Livre (ATL), que desde domingo (6) realiza sua 21a edição na capital federal. Em uma sessão marcada pela pluralidade de vozes e cores, ganharam relevo os já conhecidos apelos pelas demarcações de territórios tradicionais, além das cobranças por um freio nos casos de violência que atingem os povos originários, alvo histórico de conflitos de terra.

A programação foi conduzida por lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) em associação com as deputadas Célia Xakriabá (Psol-MG) e Juliana Cardoso (PT-SP). “A violência impera nos territórios. Temos fatos ocorrendo neste exato momento no território Pataxó de Barra Velha [na Bahia] e em outras áreas que estão sob ataque. E nós sabemos quem são os mandantes. Essa violência se estende por todo o território nacional. Esta mesma Casa hoje está se articulando e mobilizando proposituras de PECs e PLs que afrontam os direitos fundamentais dos povos indígenas. Neste 21° ATL, nós temos feito a luta e a resistência e quero reafirmar pra todas as lideranças indígenas, pro Executivo, pro Legislativo e pro Judiciário que nós vamos seguir resistindo”, disse Dinaman Tuxá, da Apib.

A sessão foi ilustrada com fotos exibidas num telão de lideranças assassinadas na luta política pelos direitos indígenas. Entre os nomes lembrados, figuraram os rostos de Galdino Pataxó, Paulino Guajajara, Nega Pataxó, Vitor Braz e Nhandesy Estela. “Quando a gente fala sobre celebrar os 20 anos da Apib, a gente nunca pode esquecer quem fez parte dessa construção para ela chegar aonde está hoje. São inclusive essas lideranças que, infelizmente, tombaram no meio do caminho, que morreram realmente na luta. Todas essas lideranças que passaram no telão trazem essa trajetória de luta, que é a defesa do seu território, a defesa da vida do seu povo, a defesa da floresta. Então, são a nossa inspiração”, disse Marciely Ayap Tupari, que veio de Rondônia para se engajar no ATL.

A temática da violência contra os povos tradicionais foi lembrada pela ministra dos Direitos Humanos e Cidadania, Macaé Evaristo, segundo a qual a pasta tem acompanhado o tema “com muita preocupação”. “É preciso enfrentar essa situação de impunidade sistêmica que está na base dos atentados e assassinatos dirigidos às lideranças indígenas de várias etnias. A reivindicação do ATL para o Ministério dos Direitos Humanos no que diz respeito aos assassinatos de indígenas e à revisão do programa de proteção [de defensores de direitos humanos] está sendo encaminhada por meio da participação da própria Apib nesse processo de revisão por meio do conselho deliberativo do programa e a Apib tem contribuído muito nos debates sobre o aperfeiçoamento da política.”
‘ATL, a maior assembleia dos povos indígenas’
A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, hoje licenciada da coordenação-executiva da Apib, exaltou a amplitude adquirida pelo ATL ao longo do tempo. “Essa grande mobilização já se tornou a maior assembleia dos povos indígenas do Brasil, mas também a maior mobilização indígena do mundo. Dessa grande mobilização se originaram a ‘bancada do cocar’ [no Congresso] e também o Ministério dos Povos Indígenas”, enalteceu.

Atual presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joênia Wapichana destacou a importância de o segmento somar forças entre si e com diferentes outros atores políticos e sociais para garantir maior consistência à luta política pelos direitos indígenas. “Não é fácil ser parlamentar, mas também não é fácil ser indígena, por isso que a união é de extrema importância.”
Propostas
A sessão em homenagem ao ATL também foi palco de anúncio de novos projetos de lei de interesse indígena. A deputada Célia Xakriabá apresentou quatro propostas de sua autoria. A primeira delas é o Projeto de Lei (PL) 1527/25, batizado de Lei Contra a Violência Obstétrica a Mulheres Indígenas. “Sabemos que várias mulheres e várias crianças morrem no caminho de ida [ao hospital] e de volta, inclusive por negligência médica, e que não permitem o acompanhamento das nossas parteiras”, queixou-se a psolista, ao destacar o fundamento da proposta.

Foi protocolado também o PL 1528/2025, que, segundo a deputada, constitui uma espécie de “seguro climático” ao prever a inclusão de agricultores familiares indígenas, quilombolas, ribeirinhos, extrativistas e pescadores artesanais entre os beneficiários do Garantia-Safra, programa que assiste camponeses em situações de estiagem ou prejuízos causados por enchentes.
A terceira proposta é o PL 1529/2025, que cria incentivos à comercialização de produtos indígenas. Por fim, Célia Xakriabá apresentou o PL 1530/2025, que trata de incentivos fiscais à agroecologia por meio da criação do Fundo de Apoio à Produção Agrossilvipastoril, Extrativista e Artesanal realizada por Povos Indígenas, Quilombolas e Comunidades Tradicionais (Funap – Tradicionais).